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Caiu no senso comum a percepção de que a Reforma Tributária é urgente e necessária. E esse sentimento é hoje partilhado até mesmo por quem não tem uma boa compreensão do sistema tributário brasileiro.
Mas o que, de fato, há de errado com os tributos no Brasil?
O problema mais óbvio é a carga tributária elevada: a carga tributária brasileira alcançou o surreal percentual de 32,43% do PIB (Produto Interno Bruto) no ano de 2017, segundo o último relatório divulgado em novembro de 2018 pela Secretaria da Receita Federal, intitulado “Carga Tributária no Brasil 2017”.
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Ou seja, de todas as riquezas produzidas pelo Brasil em um ano inteiro de trabalho (2017, no caso), praticamente 1/3 (um terço) foi transferido pela Sociedade para o Estado a título de tributos.
É muito.
Costuma-se comparar do Brasil com os países ricos do mundo, que integram a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), para se dizer que a carga tributária em nosso país não é tão elevada assim. Vejamos este gráfico, feito a partir de informações extraídas do mesmo relatório da Receita Federal anteriormente citado, com dados do ano de 2016:
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Vê-se, nesse quadro, que a média de carga tributária sobre o PIB nos países da OCDE é de 34%, quase a mesma do Brasil, que é de 32%. O problema óbvio disso é que o Brasil não é um país rico, sendo que seus indicadores sociais são piores do que todas as nações que constam nesse quadro.
Dentre esses 33 países listados, que contém o Brasil e outros 32 países da OCDE, o nosso país é o que tem o pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), indicador social medido pela ONU (Organização das Nações Unidas). Em 2016, como consta em relatórios publicados pela ONU, o Brasil ocupou a posição 79, sendo que o país mais próximo dessa péssima colocação que consta nesse quadro é a Turquia, na posição 64.
A classe falante (jornalistas, políticos, intelectuais e artistas) acredita, por influência dos acadêmicos, que tributar os brasileiros como a Dinamarca, por exemplo, com quase 46% sobre o PIB, seria capaz de transformar o Brasil em um país nórdico – ideia que os mais ajuizados acreditam ser furada.
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Primeiro, porque o Brasil gasta muito mal o dinheiro público; segundo, porque nossa burocracia historicamente se apropria de grande parte dos tributos arrecadados, na forma de salários estratosféricos, aposentadorias privilegiadas e outros benefícios injustificáveis; e terceiro, porque a carga tributária elevada é elemento que faz com que o nosso país não seja competitivo com outros países com menor tributação, o que lhe impede de ser um dia uma… Dinamarca!
É desafiador acreditar que a carga tributária elevada seja causa de desenvolvimento de um país. Faz mais sentido acreditar que países com alto nível de desenvolvimento alcançaram condições econômicas de suportar elevadas cargas tributárias, sem que isso sufocasse o crescimento de suas economias.
De qualquer modo, até mesmo os países da OCDE sofrem os efeitos sempre destrutivos da carga tributária elevada. Vejamos o quadro adiante, publicado pela Forbes, demonstrando a parcela da economia informal (shadow economy) sobre o PIB a partir de uma amostra de 12 países que integram a OCDE:
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Grécia, Itália e Espanha têm problemas graves de economia informal, com índices próximos do índice do Brasil – de 16,9% sobre o PIB em 2017, percentual medido pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) em parceria com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre). Como vimos nos quadros da Receita Federal do ano de 2016, na Grécia a carga tributária é de 38,6%, na Itália é de 42,9% e na Espanha é de 33,5%; no Brasil, como vimos, era de 32,29%. Informalidade e carga tributária elevada, portanto, são problemas comuns a esses países.
Como demonstram estudos do Banco Mundial, a carga tributária é uma das forças principais, apesar de não ser a única, que levam ao aumento da economia informal. Outras dessas forças são a regulação estatal (legislação trabalhista e restrições a importações), a baixa qualidade dos serviços públicos e da infraestrutura do país e a situação de recessão econômica.
No Brasil temos tudo isso junto e misturado: carga tributária elevada, forte regulação da economia, baixa qualidade de serviços públicos e da infraestrutura e recessão econômica. Em nosso país, portanto, a tendência permanente é de aumento da economia informal, que será agravada com eventual aumento da carga tributária – o que devemos buscar evitar.
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A tributação nada mais faz do que tirar dinheiro de quem sabe fazer justo e bom uso dele (investidores, poupadores, empreendedores, empregadores em geral e trabalhadores), para entregá-lo a máquinas de incinerar dinheiro (políticos, burocratas e empresários amigos do Governo). Dinheiro circulando na Sociedade segundo decisões dos agentes privados gera mais riquezas e bons empregos do que dinheiro alocado na Sociedade pelo Estado, que não segue a força das trocas livres, mas, sim, o racional “político”, que em regra não produz bons resultados.
Como se não faltassem argumentos para afirmar que a carga tributária brasileira de mais de 32% do PIB seja objetivamente elevada, e que ela contribui para sufocar a iniciativa privada no país, temos que a maior economia do mundo, a dos Estados Unidos, cobra de seus cidadãos 26% do PIB. Se queremos exportar produtos brasileiros para os Estados Unidos ou até mesmo competir com empresas americanas pelo mundo, não faz sentido mantermos aqui a tributação tão mais elevada como temos hoje, não é mesmo?
Mas esse cenário fica pior ainda quando comparamos a carga tributária brasileira com nossos vizinhos, aqui na América Latina. Eis mais um quadro tirado do mesmo relatório da Receita Federal de 2016 a que nos referimos anteriormente:
Rumo a Cuba, o Brasil ocupa, por enquanto, o segundo lugar em carga tributária na América Latina, estando praticamente ao lado de Barbados – o que nos indica a necessidade de colocarmos nossas “barbas de molho”.
O México, de olho no mercado americano, tem carga tributária de 17,2% do PIB, muito menor do que a americana, de 26%. O Chile, que também faz parte da OCDE, tem 20,4% de carga tributária. E o Brasil, com seus 32%, quase empata com a “sempre em crise” Argentina, com seus 31%.
Ou seja, vamos muito mal, em termos competitivos. E tão mal que demos chance para o surgimento de uma nova ameaça de onde nunca esperamos isso: o Paraguai.
No Índice de Liberdade Econômica de 2019 divulgado pela Heritage Foundation (que mede o cumprimento espontâneo da legislação, o tamanho do Estado, o grau de regulação da economia e a abertura do mercado numa amostra de 180 países), o Paraguai aparece na posição 89, enquanto o Brasil amarga a posição 150 – entre a Micronésia e o Níger, vejam só.
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Eis que o Paraguai arranca, em termos de PIB, apenas 17,5% do couro dos seus cidadãos. Além de menos tributos, nosso vizinho fornece energia mais barata para seus empreendedores e menores encargos trabalhistas, o que está levando cada vez mais indústrias importantes do Brasil para lá, para que a produção seja, mais tarde, vendida mais barata para o … Brasil!
Obviamente a carga tributária elevada do Brasil é um freio brutal para o desenvolvimento do país, massacrando a população em geral. É um redutor significativo do investimento nacional e estrangeiro, razão de fuga de capitais brasileiros para o exterior e causa de agravamento da pobreza não somente de empresários, mas também da população mais carente, que também paga pesados tributos, e que ainda sofre com o desemprego causado por esse cenário econômico ruim, agravado pela tributação.
Infelizmente, esse quadro não será alterado tão cedo, porque, mesmo depenando a Sociedade com 32% do PIB a título de tributos, o Brasil ainda toma, anualmente, por volta de 10% do PIB em juros decorrentes de empréstimos na forma de títulos públicos, para que o Estado consiga pagar as suas despesas.
Esse será o tema do próximo texto, onde explicaremos o porquê da Reforma Tributária a ser aprovada (se for aprovada) não poder estar voltada para a redução da carga tributária brasileira. Pelo contrário, provavelmente aumentará a carga tributária (para reduzir o déficit nas contas públicas e o endividamento do Estado brasileiro), e, na melhor das hipóteses, terá foco mais intenso na simplificação das obrigações legais tributárias.
Alexandre Pacheco é Professor, Palestrante e Consultor de Direito Empresarial e Tributário.
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Referências
BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Carga Tributária no Brasil 2017. Disponível em <http://receita.economia.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/carga-tributaria-2017.pdf> Acesso em 25/07/2019.
FORBES. The Countries With The Largest Shadow Economies [Infographic]. Niall McCarthy. Disponível em <https://www.forbes.com/sites/niallmccarthy/2017/02/09/where-the-worlds-shadow-economies-are-firmly-established-infographic/#1edf8239742c>. Acesso em 26/07/2019.
INSTITUTO BRASILEIRO DE ÉTICA CONCORRENCIAL (ETCO). Economia subterrânea sobe pelo quarto ano seguido e atinge R$ 1,173 trilhão em 2018, segundo ETCO e FGV/Ibre. Disponível em <https://www.etco.org.br/destaque/economia-subterranea-sobe-pelo-quarto-ano-seguido-e-atinge-r-1173-trilhao-em-2018-segundo-etco-e-fgv-ibre/>. Acesso em 28/07/2019.
THE HERITAGE FOUNDATION. Highlights os the 2019 Index of Economic Freedom. Disponível em <https://www.heritage.org/index/pdf/2019/book/highlights.pdf>. Acesso em 28/07/2019.
UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME. Human Development Indices and Indicators – 2018 Statistical Update. Disponível em <http://hdr.undp.org/sites/default/files/2018_summary_human_development_statistical_update_en.pdf>. Acesso em 28/07/2019.
WORLD BANK. Shadow Economy in 162 Countries – World Bank Documents & Reports. Disponível em <http://documents.worldbank.org/curated/pt/311991468037132740/pdf/WPS5356.pdf>. Acesso em 26/07/2019.