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Muita gente acredita que estamos entrando em uma nova era, marcada por uma permanente baixa inflação nos países desenvolvidos. Há poucos meses, a BusinessWeek, famosa revista americana, trouxe na capa o título “Is inflation dead?”.
Estudos tentam provar que a impressão desenfreada de dinheiro da última década pelos bancos centrais não causou a inflação, mas, como já disse em um artigo anterior, eu acho essa premissa errada.
Em primeiro lugar, o conceito de inflação é justamente esse: inflar a base monetária, ou seja, imprimir dinheiro. Uma alta nos preços é consequência da inflação. Segundo, a inflação pode aparecer em diferentes lugares, não somente e necessariamente na prateleira do supermercado.
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Até o momento, o que vimos foi uma alta absurda nos preços das ações, com as bolsas de valores batendo recordes atrás de recordes. Também vimos altas homéricas no mercado de bonds, assim como no imobiliário e no de artes, por exemplo. O que está subindo, por enquanto, é o preço dos ativos – não dos produtos ou dos serviços que compõem as cestas medidas pelos índices estatísticos oficiais.
E por que não estamos vendo uma alta nos preços dos itens de supermercado nos EUA? Podemos citar o efeito Amazon, que consegue manter preços baixos por mais tempo, e a importação de produtos oriundos de países menos desenvolvidos, cujos custos de produção são menores. Mas há ainda uma terceira causa que passa despercebida pela maioria das pessoas: as baixas taxas de juros, além de fazer com que as pessoas poupem mais, também incentivam os maus investimentos.
Investimentos em empresas que não dão lucro, nem têm a menor chance, perspectiva ou pretensão de dar lucro, vêm ajudando a reduzir a inflação. O exemplo mais notório dentre os vários existentes, para mim, é a Uber.
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A companhia dá prejuízo atrás de prejuízo, mas sua receita cresce anualmente. Eu mesmo sou usuário e pago menos pelo serviço da Uber do que pagaria por um táxi. A diferença é paga pelo investidor, que subsidia a mim e vários outros usuários.
Empresas “investidas” por gigantes do setor de private equity ou venture capital, como o SoftBank, recebem aportes milionários, às vezes bilionários, para vender R$ 1 por R$ 0,50. É óbvio que elas venderão mais, crescerão suas receitas e ficarão famosas – mas é óbvio também que não existirá lucro num futuro próximo, tampouco longínquo.
Aliás, essas “empresas do tipo pirâmide” estão competindo com negócios de verdade e fazendo a vida deles mais difícil – afinal, elas têm dinheiro de sobra para subsidiar os usuários.
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Nesse cenário, a disputa passa a ser travada entre empresas dispostas a dar cada vez mais incentivos para atrair clientes, algo que descrevem como CAC, Custo de Aquisição de Clientes, para justificar gastos desproporcionais com promoções, descontos e presentes.
Como as taxas de juros estão muito baixas e, em alguns casos, até negativas, os investidores jogam dinheiro nos fundos de private equity/venture capital que, em seguida, “investem” em negócios que estão crescendo (sem lucro).
A falta do lucro é até uma grande vantagem para elas. Se dessem lucro, seriam avaliadas por um múltiplo qualquer – não dando lucro, elas são avaliadas por algum índice criativo, como eyeballs, usuários, ou algo assim, fazendo com que os aportes não pareçam tão absurdos.
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Derradeiramente essa onda de taxa de juros negativa deve chegar ao fim, trazendo o estouro da bolha dos fundos de private equity e venture capital. Com a falta de dinheiro no setor, as empresas investidas, que não dão lucro, sofrerão as consequências, já que sem aumentos constantes e sucessivos de capital, elas não conseguem se manter.
O prenúncio do que pode acontecer já pode ser visto com o fracasso do IPO da WeWork e a remarcação do valuation de diversas investidas do Vale do Silício, que provocou nesse ano a evaporação de US$100 bilhões em valor de mercado.
Assim como a capa da BusinessWeek de 1979, “The Death Of Equities”, marcou o período de maior bull market na bolsa de valores americana, acho que a capa desse ano pode marcar o período da volta da inflação, com consequências desastrosas para o mercado das bolhas.