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O período entre a segunda metade do século 15 e o final do século 17 foi marcado por turbulências políticas sem precedentes no continente europeu, ao menos até agora.
A época, que ficou conhecida como “Revolução dos Preços“, marca a descoberta das Américas e a expansão do Império Espanhol.
Com a conquista de territórios no novo continente, os espanhóis esbaldaram-se na prata encontrada por aqui, expandindo sua própria oferta de moeda.
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A moeda da época, o Real de 8, consistia em uma enorme moeda de prata, que passou a ser considerada a moeda mais influente do período. O apelido dado à moeda, o “dólar espanhol”, também seria escolhido por caipiras na América do Norte para inspirar sua própria moeda após a independência do Reino Unido…
Durante estes cerca de 150 anos, os preços cresceram incríveis 600%, o que, por sua vez, levou ao aumento do preço das terras e à pobreza de milhões de camponeses, escorchados com os custos elevados. O resultado, como o nome dado ao período já diz, foi uma série de revoluções pelo continente.
Camponeses insatisfeitos e em situação de pobreza, em meio a um período de abundância de “riqueza” por parte da elite, ajudaram a derrubar governos e a pressionar por mudanças.
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O outrora poderoso império espanhol ruiu, dando lugar a novas potências, como os Países Baixos, um território minúsculo (conhecido pela sua maior província, a Holanda), que inventou o capitalismo moderno como forma de escapar das dificuldades geográficas.
E se toda história já parece confusa o suficiente, lembre-se que uma inflação de 600% ao longo de um século e meio equivale a cerca de 1,5% ao ano.
Neste momento, em meio a uma crise energética, países europeus se deparam com índices de inflação na casa dos 7,9% (Alemanha) ou mesmo 10,1% (Reino Unido).
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Os preços, em especial de energia, continuam a escorchar a população e fomentar crises políticas e instabilidades.
No Reino Unido, o Partido Conservador ainda decide sua sucessão após a remoção de Boris Johnson. Na Alemanha, o novo primeiro-ministro busca assegurar a oferta de gás ao país, sem muito sucesso.
Exemplos surrealistas também pipocam por toda a Europa.
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Na França, Emmanuel Macron, reeleito neste ano, estatizou a companhia EDF, responsável por controlar as usinas nucleares do país. A empresa, que já era 86% de propriedade do governo, está enfrentando prejuízos bilionários na tentativa de segurar os preços de energia, tal qual uma conhecida petroleira sul-americana em um passado remoto.
Apenas no primeiro semestre dESTE ano, a “Electricite de France” (EDF), registrou um prejuízo de US$ 5,3 bilhões. No ano, a projeção é de que o prejuízo chegue a US$ 29 bilhões.
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Este fato em julho, porém, não foi isolado.
Pouco mais de um mês depois, a França assumiu ainda pressões sobre grupos varejistas, como o Carrefour, que topou congelar os preços dos 120 produtos mais vendidos nas suas lojas até novembro de 2022.
Na Áustria, a expectativa também é que alguns bilhões de euros sejam gastos para salvar o setor elétrico. Apenas a companhia que abastece a capital deve receber US$ 6 bilhões em socorro.
A alta de custos de energia na Europa já atinge 600%. E, até o momento, a maior parte desse prejuízo não foi repassado aos consumidores, tendo em vista os contratos vigentes.
Na Alemanha, outra gigante de energia, a Uniper, também entrega prejuízos. No primeiro semestre, foram ao menos US$ 17 bilhões.
Já no Reino Unido, as contas de luz residenciais podem chegar a custar, na média, US$ 5 mil anuais, ou seja, cerca de R$ 25 mil por ano em contas de luz.
Na soma, é possível que os prejuízos ao setor elétrico europeu cheguem a cerca de US$ 239 bilhões. Ou 1,6% do PIB da região.
Prejuízo em igual magnitude também deve ser visto no próprio crescimento do continente.
No segundo trimestre, a Alemanha entrou um crescimento próximo a zero.
A crise, porém, não se limita apenas ao setor energético.
A Europa possui um elevado grau de endividamento, na casa dos 95,6% do PIB. É um número abaixo dos EUA (130%), mas sem sinais de queda, em especial pelo enfraquecimento do euro.
Como a história não cansa de mostrar, a Europa ainda possui um poder de irradiar ideias e tendências, ainda que no século da globalização este poder tenha caído.
Uma onda de instabilidade no continente pode acabar por se espalhar para outras regiões. E, ao que tudo indica, isso não está lá muito longe de ocorrer.
A Europa é, mais do que nunca, o Velho Continente. Sua população possui uma média de idade de 43,9 anos, contra 38,8 anos dos EUA, 38,4 anos dos chineses e 33,5 anos dos brasileiros.
Uma média mais alta de idade implica menor crescimento, algo já visto nas pressões por liberalizar a imigração de mão de obra.
No caso europeu, é ainda mais grave.
A Europa de hoje conta com 9% da população mundial, 20% da economia e 50% dos gastos sociais do planeta.
Em suma, um continente berço das mais variadas filosofias políticas da humanidade, que hoje encontra-se estagnado em crescimento e em meio a uma alta, desta vez, sem precedentes de preços.
O resultado é um barril de pólvora, que terá de ser desarmado pela democracia europeia – ou esta pode, per si, acabar desarmada.