Diminuição da fragmentação partidária: copo meio cheio ou meio vazio?

Tendência de queda da fragmentação partidária pode trazer boa notícia. O problema está na qualidade da redução

Thiago Vidal

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Plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Agência Câmara)
Plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Agência Câmara)

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É comum, e até conveniente, focar as eleições municipais nas grandes capitais. No entanto, estas são a exceção, não a regra. Basta dizer que cerca de 70% das cidades brasileiras têm entre 2.000 e 20.000 habitantes, apenas; que quase metade dos 5.569 municípios dependem de transferências dos demais entes federativos; e que somente 45 cidades conseguem cobrir suas despesas com receitas próprias.

Isso não significa que o grau de atenção dedicada às grandes cidades seja totalmente injustificado. Afinal, geralmente, as principais lideranças políticas nacionais costumam se formar nas capitais. Ocorre que uma visão mais ampla do quadro eleitoral nos permite ter uma melhor compreensão não só do que pensa o brasileiro, mas, também, das principais tendências para as eleições gerais seguintes. E as eleições para vereadores costumam servir como um indicador do que provavelmente ocorrerá na próxima eleição para deputados federais.

Um bom exemplo dessa dinâmica é a redução da fragmentação partidária no Brasil. De acordo com a Prospectiva Public Affairs LAT.AM, a Câmara dos Deputados registra atualmente o menor Número Efetivo de Partidos (NEP) desde 2002. Embora essa diminuição tenha se intensificado em 2022, quando o NEP caiu de 16,5 para 9,2, já havia sinais dessa tendência na eleição municipal de 2020. Naquele ano, a fragmentação partidária em âmbito nacional, considerando todas as Câmaras de Vereadores, reduziu-se pela primeira vez desde pelo menos o ano 2000.

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A julgar pelos dados parciais de domingo (6/10), o Número Efetivo de Partidos em âmbito municipal caiu consideravelmente, passando de 14,5, há quatro anos, para 12. Se essa tendência continuar, a fragmentação partidária federal poderá se aproximar dos níveis observados no final dos anos 1990. Trata-se de uma excelente notícia para um país que, nas últimas décadas, acostumou-se a lidar com a pulverização excessiva de legendas. Melhor ainda quando se considera que, em tese, um quadro partidário mais enxuto torna o processo de construção de políticas públicas mais racional.

O problema está na qualidade dessa redução. A partir dos resultados conhecidos até agora — lembrando que a apuração final dos legislativos municipais costuma levar alguns dias —, a nova elite partidária brasileira será composta, à esquerda, pelo PT e PSB, e à direita e ao centro, por MDB, PP, PSD, PL, União Brasil e Republicanos. Em resumo, os partidos do “centrão” não só se consolidam como importante força política, mas também devem eleger bancadas federais ainda mais expressivas nas próximas eleições gerais.

Da reconfiguração partidária, emergem pelo menos dois cenários. No primeiro, a possível hegemonia dos partidos de centro-direita e direita poderia atenuar ou até reverter a deterioração do processo orçamentário que o Brasil enfrenta há quase uma década. A premissa é a de que maior coesão entre as forças legislativas e partidárias garantiria um controle mais efetivo sobre a qualidade do processo decisório como um todo.

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O segundo cenário, por outro lado, sugere que o avanço do “centrão” não apenas não alteraria o controle sobre o orçamento, como poderia até agravar esse quadro. Nesse caso, o pressuposto é o de que o descontrole orçamentário dos últimos anos — como o fato de que 25% dos gastos discricionários foram destinados a emendas parlamentares — coexistiu com o fortalecimento do “centrão” a partir de 2010 e foi potencializado por esse fenômeno.

Ainda é cedo para estabelecer hipóteses definitivas. Ressalto que levará tempo até que se tenha uma real compreensão do que efetivamente está ocorrendo nas 5.569 Câmaras de Vereadores. A deterioração orçamentária, entretanto, não resulta apenas da fragmentação do espectro partidário; ela reflete a intensa batalha distributiva que tem dominado o debate público nacional.

Enquanto não houver sinais de uma solução estrutural para a questão fiscal em todos os níveis federativos, o orçamento continuará sendo alvo de disputa entre servidores públicos, empresas e, particularmente, os estados e municípios. Nesse contexto, o segundo cenário se mostra o mais provável – uma notícia desanimadora para aqueles que ainda tentam enxergar o copo meio cheio.

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Thiago Vidal

Diretor de Análise Política da Prospectiva Public Affairs Lat.Am. É cientista político e mestre em políticas públicas pela Universidade de Brasília (UnB), e especialista (MBA) em relações governamentais pela Fundação Getulio Vargas (FGV)