Assessoria de investimentos rumo aos 50 mil?

Expansão da carreira permite sonhar com este número de profissionais nos próximos cinco anos

Francisco Amarante

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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É cada vez mais comum depararmos com artigos e pessoas que tratam a assessoria de investimentos como se fosse uma atividade recente, criada na primeira metade do Século XXI, com o surgimento das plataformas digitais.

Muitos ficam surpresos quando comento que o antigo agente autônomo de investimentos foi regulado pela primeira vez em 1967, pelo Banco Central do Brasil. Vale lembrar que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), atual regulador e fiscalizador do setor, só foi criada em 1976.

Fica fácil de entender essa “confusão” que alguns fazem quando analisamos o histórico e a evolução da profissão nas últimas décadas e, em especial nesses últimos 10 anos, em que a profissão de fato se consolidou e ganhou notoriedade e relevância junto ao regulador, ao mercado e aos investidores.

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Segundo dados da ANCORD, entidade responsável pela certificação do profissional, 80% dos atuais 25.345 assessores credenciados e registrados na CVM possuem entre 18 e 45 anos de idade, ou seja, a maioria deles começou a trabalhar a partir dos anos 2.000 – e muito provavelmente a data de registro de grande parte deles possui menos de 5 anos.

Ao pesquisarmos os dados cadastrais dos assessores de investimentos fica mais evidente essa constatação, que por vezes fazem as pessoas terem a impressão de ser uma profissão recente.

Se quebrarmos os profissionais que apresentam o “status” funcionamento normal, em janelas de 10 anos, encontramos a seguinte evolução média de novos assessores.

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Período Média/Ano
2001 – 2010 144
2011 – 2020 835
2014 – 2023 2.190
Últimos 10 anos 2.313

Fonte: CVM (maio de 2024)

Obs.: O portal de dados da CVM possui dados a partir de 2001

Ao analisarmos o quadro acima, não nos restam dúvidas de que a repaginação do profissional com o advento das plataformas digitais, a partir da primeira década dos anos 2.000, foi crucial para chegarmos no estágio atual. Mais! pensarmos em 50 mil profissionais para os próximos 5 anos não é nenhuma “loucura”.

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Porém, é importante frisar que nem tudo são flores e céu de brigadeiro nesse mercado e que, para de fato essas previsões se concretizarem, muito precisa ser feito no processo de amadurecimento do mercado.

E por que afirmo isso? Porque se usarmos as mesmas janelas de 10 anos para analisar o número de assessores que desistiram da profissão, pelas mais variadas razões, e que se encontram com o “status” cancelado na CVM, encontramos esse resultado:

Período Média/Ano
2001 – 2010 92
2011 – 2020 94
2014 – 2023 1014
Últimos 10 anos 1020

Fonte: CVM (maio de 2024)

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Obs.: O portal de dados da CVM possui dados a partir de 2001

Ou seja, muito embora o número de profissionais em operação normal venha crescendo de maneira explosiva nos últimos anos, o número de profissionais que desistem da atividade beira mais de 30% no mesmo período, sendo que desses 85% o cancelamento é pedido pelo profissional.

Na média, a solicitação do cancelamento do registro na CVM é de 2 anos após entrar na atividade e esse dado, sim, nos preocupa e merece um pouco de atenção – se de fato temos a pretensão de sermos 50.000 em atividade nos próximos anos.

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Por que será que muitos desistem da assessoria num espaço de tempo tão curto, como temos verificado nos últimos anos?

Muitas podem ser as razões e citarei algumas delas, sem desmerecer outras que porventura não foram contempladas aqui:

Não podemos esquecer que o mercado passou por um período de dinheiro farto para os escritórios e que nesse momento, como contrapartida para se atingir os gatilhos contratuais, muitos saíram abrindo diversas filiais e atraindo profissionais bancários com pagamento de luvas – nunca visto nesse mercado –, mas que, na prática, não resultaram em conversão de novas contas ou aumento substancial do AUC (Asset Under Custody).

Passou a ser comum, também, a atração de jovens promessas, para a atuação em SDR (Sales Development Representative), com um salário fixo garantido por um período, mas que nem sempre prosperaram ou atingiram as expectativas, alimentando o “turn-over”.

Isso tudo acabou resultando em uma queda mensal de novos assessores (398) em 2023, quando comparado a 2022 (436), ao mesmo tempo que aumentou o número de cancelamentos no mesmo período de 122 para 170.

E quais são os cuidados que os times de expansão devem ter para evitar esse “turn-over” alto, que no final gera prejuízo, desgaste e frustação para todos, além de afetar o investidor?

Independente da estratégia de crescimento que o escritório tenha, seja ele orgânico ou não, com abertura de filiais ou não, com atração de profissionais experientes ou jovens promissores, entendo que o conceito dos 3 K’s seja válido para todas elas, pela simples razão de que a atividade de assessoria de investimentos é 100% meritocrática e muito próxima ao perfil empreendedor.

O conceito dos 3 K’s

Capital intelectual: o mercado financeiro se sofisticou nas últimas décadas de uma maneira tão expressiva que para atuar nele em determinadas funções é necessário que você seja certificado e faça programas de educação continuada. Isso por si só já exige da pessoa o mínimo de interesse em leitura e dedicação aos estudos.

Se levarmos em consideração que, para entendermos os mais diversos instrumentos financeiros e como alocar os recursos dos investidores nos cenários econômicos projetados, há necessidade de bastante conhecimento, fica claro a incompatibilidade da atividade com quem não se atualiza diariamente.

E para concluir a importância do capital intelectual, o ato de prospectar um cliente não é tão trivial e, portanto, você precisa ter a habilidade e a capacidade para conversar e entender, mesmo que superficialmente diversos temas e assuntos – não necessariamente voltados ao mercado financeiro.

Capital financeiro: esse é um ponto sensível que, por vezes, não é lembrado no ato de atrair um novo assessor ou se é, talvez, não com a transparência devida, mas sim com as promessas e projeções de ganhos futuros, que podem não se concretizar e causar frustação.

Mesmo que você negocie luvas ou uma remuneração fixa por um período, lembre-se que não há almoço grátis e que tanto as luvas recebidas ou o salário garantido têm um retorno esperado por parte do escritório. A conta chegará mais cedo ou mais tarde.

Prospectar clientes custa dinheiro. Então, ao decidir se tornar um assessor de investimentos tenha isso em mente. Qual o tamanho da sua reserva financeira e, por quanto tempo, ela deverá durar para que o seu projeto na assessoria mature e se retroalimente?

Capital social: por último, mas não menos importante, verifique o capital social do candidato. A atividade de assessoria no seu “core” é captar e prospectar clientes com o intuito de oferecer produtos e/ou serviços do(s) intermediário(s) ao(s) qual(is) está vinculado. Portanto, uma pessoa introvertida, que não gosta da vida social, que não gosta de falar ao telefone e que acredita que o básico “family and friends” é o suficiente para obter o sucesso, na maioria das vezes, poderá estar fadada ao fracasso.

Francisco Amarante é superintendente da ABAI (Associação Brasileira dos Assessores de Investimentos)

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Francisco Amarante

Superintendente da ABAI (Associação Brasileira dos Assessores de Investimentos)