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Há algumas semanas, comentei num artigo sobre a Panini, tradicional editora italiana responsável pela publicação de álbuns de figurinhas e cards com jogadores de futebol, febre em períodos de Copa do Mundo, mas que tem um mercado considerável o tempo todo.
Figurinhas e álbuns são parte de um segmento que movimenta muito dinheiro no mundo, o de Colecionáveis.
De moedas a selos, passando por tampinhas de garrafa e chegando a artigos que pertenceram a artistas e famosos, o mundo dos colecionáveis é imenso.
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Há quem colecione arte, carros. Não importa o bolso, muita gente gosta de manter em seu poder pequenas joias que trazem recordações, o que faz todo sentido no mundo do esporte.
Para se ter uma ideia do tamanho desse mercado, o site collectable.com estimou em US$ 5,4 bilhões a movimentação de negociações de colecionáveis nos EUA em 2019, e o eBay estima em 13% o volume de negociações envolvendo itens de colecionador apenas no esporte.
Junto à Panini, uma das empresas que melhor explora esse mercado é a Topps Co, que produz e negocia cards de esporte nos EUA.
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Esses cards são adquiridos e os torcedores buscam assinaturas dos atletas, que, com o tempo, passam a valer milhares de dólares.
O negócio de colecionáveis físicos da Topps movimentou US$ 314 milhões em 2020, com outros US$ 31 milhões em vendas digitais. A expectativa para 2022 é de atingir US$ 454 milhões nas vendas físicas e US$ 51 milhões nas vendas digitais.
Por isso, e com o crescente entusiasmo com essa indústria, a empresa deve abrir capital por meio de uma SPAC, e está avaliada inicialmente em US$ 1,6 bilhão.
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O mercado envolvendo esportes é tão grande que, recentemente, um par de tênis Air Jordan assinado pelo próprio Michael Jordan foi vendido por uma colecionadora por US$ 275 mil.
Na esteira do sucesso do documentário “The Last Dance”, um card autografado por Jordan foi negociado em maio de 2020 por US$ 100 mil, e depois revendido em janeiro de 2021 por US$ 738 mil, segundo matéria do jornal New York Times.
E claro que esses colecionáveis começam a invadir o mundo digital.
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Não basta o papel assinado em casa: com o crescimento da digitalização de tudo, as figurinhas, cards e qualquer coisa envolvendo o tema está indo para dentro do mundo digital através dos NFTs (Non-Fungible Tokens).
Sendo bem simplista, trata-se de registrar uma imagem via criptografia, dando-lhe autenticidade e assim permitindo sua negociação. Apenas para o mundo virtual (para quem quiser entender melhor o funcionamento dos NFTs, recomendo esta matéria do site “The Conversation”).
Non-Fungible significa “não replicável”, ou seja, único. Uma nota de R$ 100,00 é replicável, pois qualquer nota de R$ 100,00 é igual, independentemente do número de série. A Mona Lisa de Da Vinci não é replicável, ainda que existam cópias. Mas todos sabem que são cópias.
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Os NFTs são registros virtuais de obras, de forma que por meio de um código eles se tornam únicos. Todos podem copiá-lo, mas só existe um original.
A ideia, portanto, é criar um registro digital e transformá-lo em algo único, colecionável e valioso.
No mundo físico, os casos da Panini e da Topps, com suas figurinhas, álbuns e cards, são sucessos claros e rapidamente compreensíveis.
Além de ter o álbum completo da Copa de 2014, de preferência com assinaturas de atletas que disputaram a competição, o que o torna mais valioso, outros itens comuns de coleções são camisas de clubes e seleções, além de bolas e ingressos. Se tiverem o autógrafo, melhor.
Agora, quando vamos ao mundo virtual, a questão muda um pouco. Um dos maiores valores de uma coleção física é justamente a raridade e a possibilidade de ela ser vista apenas se o dono permitir, seja numa visita à sua casa, seja no museu. Se um NFT pode ser copiado, pode ser visto, replicado pela internet, quem se importaria em ser dono dele? Voltaremos a isso depois.
O caso de maior sucesso de NFT no mundo dos esportes é o NBA Top Shot. A liga americana de basquete criou, em conjunto com a empresa Dapper Labs, um negócio de venda de cards virtuais de cenas de lances das partidas.
Eles funcionam como uma coleção de cards físicos: você vai no site, compra um “pacote” e nele vem uma quantidade de lances. Os lances passam a ser seus, mesmo que qualquer um possa vê-los nos diversos canais de distribuição disponíveis. É a sensação de ser dono.
Daí vem a parte interessante do produto: há um marketplace no qual é possível negociar os lances. Ou seja, uma plataforma de compra e venda em que, a depender da raridade e do atleta envolvido, a imagem é valorizada no tempo. Conceito básico de oferta e demanda.
Segundo o site NBA Top Shot, já foram vendidos mais de 7,6 milhões de lances. E há monitoramentos de negociações no mercado secundário que indicam que as negociações passaram de US$ 869 mil em dezembro de 2020 para US$ 224 milhões em fevereiro de 2021, em mais de 80 mil negociações.
Faz sentido isso tudo? Comprar um produto que você pode ver no YouTube, por exemplo?
Faz, se o mundo estiver num momento de muita liquidez, com os governos injetando trilhões nas economias para reduzir impactos da pandemia, onde as taxas de juros estão próximas de zero.
No final, há pessoas que se interessam pela brincadeira, mas há muitas que não veem o negócio primário, mas sim o derivado, que é negociar os lances com lucro.
E isso só é possível por dois motivos: i) o mercado internacional está com muito dinheiro, e as pessoas que tem alguma reserva estão buscando ganhos que aplicações em fundos de investimentos tradicionais não oferecem e; ii) a NBA ganha ao operar seu marketplace, se transformando numa espécie de “bolsa de valores” dos Top Shots.
Trata-se de um negócio altamente especulativo e que alguma normalização da economia pós-pandemia tende a colocar no lugar.
Mas também há um movimento dentro da própria indústria que deve ocasionar estourar a bolha no médio prazo: há uma enorme oferta de NFTs no mercado. Todo mundo resolveu criar e vender NFTs, de olho na negociação e valorização dos “ativos”.
Logo, quando o excesso de oferta encontrar a escassez de demanda, com a pulverização e redução da liquidez, os preços vão cair e a brincadeira deixará de ser um negócio, passando a ser apenas uma diversão de colecionador.
E no Brasil?
O mercado de colecionáveis no Brasil é pequeno, e está mais associado ao mundo geek que ao esporte. Em geral, há colecções de camisas, bolas, ingressos, álbuns, mas não há grandes mercados de negociação.
Não há dados relevantes sobre isso, mas basta ver que, nos EUA, uma pesquisa recente da Morning Consult indica que 33% dos adultos americanos colecionam algum tipo de produto esportivo físico e 10% colecionam NFTs.
Para a indústria no Brasil, este é um tema que deveria estar nas conversas de geração de receitas, mas é complicado explorar. Ainda mais tratando-se de um torcedor/fã/consumidor/cliente que já tem renda média abaixo de R$ 1.500,00 e sofre com efeitos da pandemia.
Mas é algo para ficar no radar, para um futuro que não se sabe quando chegará.
Caminhos interessantes para o futuro
Esquecendo o hype em torno dos NFTs, o modelo de negócio de colecionáveis virtuais tende, no médio e longo prazo, a crescer nos meios virtuais.
Pensando no mundo físico, será preciso encontrar meios de fazer trocas, possibilitar relações mais simples e, de alguma forma, obter “carimbos” virtuais de atletas envolvidos, como “autógrafos virtuais” ou vídeos associados. Isso traz valor às coleções guardadas nos smartphones.
E esse mercado precisa necessariamente gerar a escassez. Por exemplo, cada vídeo negociado no NBA Top Shot deveria ser automaticamente retirado de outras plataformas e se tornar efetivamente único. Assim como outras artes. Escassez gera valor.
O esporte é uma indústria que permite inúmeras oportunidades de negócios. É preciso estar atento e pronto para se beneficiar de todas elas.