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Nesta semana, conversei com um investidor americano que é proprietário de um clube em uma liga de ponta da Europa. Ele nos contatou para explicarmos o mercado brasileiro, pois estão desenvolvendo um projeto de expansão por meio da construção de um Multiclub Ownership (MCO).
Na verdade, essa conversa foi o retorno de uma série de trocas de informações, estudos, análises e comparativos. A decisão, neste momento, foi de ficar de fora do Brasil. Os motivos foram muito claros e, por vezes, irrefutáveis:
– Não existe um mercado de negociação de clubes estruturado. Se há quem defenda que situações assim são oportunidades de se fazerem bons negócios (“Quem chega antes bebe água limpa”), há também quem defenda a ideia de que entrar num mercado ainda sem referência é como descer a Serra de Ubatuba (descubram o que é isso) numa Ferrari há 200 km/h e com neblina.
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– O mercado está caro. O fato de termos muitas associações endividadas obriga os novos donos a aportarem volumes relevantes de recursos simplesmente para pagarem dívidas sem nenhum retorno para o negócio, e ainda com pouca segurança de que estão todas mapeadas.
Alguns clubes pedem valores completamente irreais, pois consideram um perfil de valuation sem sentido, incluindo ativos operacionais por vezes antigos e ultrapassados, ou centros de treinamentos que são estruturas sem as quais não há atividade operacional. Ou seja, avaliações pouco realistas.
Com o valor de investimento para comprar um clube no Brasil é possível comprar dois na Europa, em mercados regulados e com previsibilidade.
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– A falta de um sistema organizado, com liga, é apontada como outro aspecto que diminui o interesse. A ideia de que haverá uma liga um dia é tentadora, mas quando o processo é discutido entre dois grupos separados (cujo único tema conhecido é a divisão de direitos de transmissão de algo que nem existe) isso distancia o interessado.
Obviamente este é um investidor num universo de centenas. Não dá para encarar esta avaliação como verdade absoluta. Haverá quem enxerga na confusão e no caos a tal oportunidade de “beber água limpa”. Nesse sentido, nossa conversa evoluiu para alguns temas que os mantiveram no jogo.
Por exemplo, qual o modelo de negócio esperado? Porque um clube pode ser mais ou menos caro a depender da expectativa criada em torno dele.
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É melhor um clube que seja tenha torcida e algum mercado a explorar ou um clube de pequeno porte e boa estrutura? Qual o papel desse clube numa estrutura de MCO? Como lidar com clubes que podem buscar receitas na relação com os torcedores, mas tem que lidar com torcidas organizadas que ainda vivem na idade média e apenas atrapalham?
Este é um assunto que ainda é pouco falado, mas imagine que todos os 20 clubes da Série A sejam SAFs, com donos e investimentos. Ainda assim quatro SAFs serão rebaixadas. E daí? Falharam as SAFs ou falharam as expectativas? Por isso, ter um modelo de negócios adequado é o primeiro passo que um investidor precisa dar antes de bater o mercado brasileiro em busca de clubes.
Um modelo de negócios local que se encaixe em seu modelo de negócio global. E daí eles voltaram algumas casas para entender seu modelo global e reavaliar a busca por um clube brasileiro que atendesse suas demandas.
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Mas não fica nisso. Quem toca um projeto desses? O Brasil tem muitos profissionais qualificados academicamente, mas pouca gente que junte a capacidade técnica com a experiência setorial. Pois trabalhar no mundo do futebol exige alguns conhecimentos que hoje não existem, por serem dominados por abnegados amadores, que executam funções sem o preparo necessário e em estruturas inchadas.
Vamos pegar como exemplo uma entrevista desta semana do presidente do Santos, Andres Rueda, ao podcast Hoje Sim, de Cleber Machado. Ele comenta a demora em encontrar um diretor de futebol assim:
“Quais são as funções e o que faz um executivo de futebol? Isso não está claro para ninguém. A melhor definição que tive sobre isso, e não vou dizer quem me disse, é que o diretor de futebol se tornou o ‘empresário frustrado’. O que faz um diretor de futebol? Ah, ele monta a logística. Mas poxa, todos os clubes já têm uma área responsável pela logística, que cuida dos voos, hotel e esse tipo de coisa”.
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Por que o presidente de um dos maiores clubes do país não sabe o papel do executivo de futebol? Porque, no Brasil, é uma raridade encontrarmos profissionais qualificados e praticando a função de diretor esportivo, tão comum nos clubes europeus.
Geralmente transformam-se no que Rueda comentou: um especialista em logística.
O diretor esportivo é o chefe operacional de um clube que, no imaginário de muita gente, é “quem contrata atletas e treinadores”. Então, criamos uma série de funções para abarcar profissionais de todos os tipos: coordenador, gerente, diretor, executivo e vice-presidente de futebol. Tudo para que, no final, o abnegado resolva.
Já escrevi sobre isso e não vou me alongar sobre o tema. Mas a própria falta de uma cultura organizacional, com papeis e responsabilidades e pessoas preparadas para executá-los, é outro motivo da desconfiança de investidores no futebol brasileiro. Leva-se mais tempo desenhando a estrutura e buscando profissionais adaptados.
Todos os mercados têm suas características e é fundamental para quem vem de fora se apoiar em profissionais que saibam navegar em águas nem sempre calmas. No desenho de MCO que estamos montando, sabemos exatamente quais funções precisarão ser ocupadas por profissionais locais, mesmo que o modelo de negócios, as regras de governança, a estrutura de compliance e o modelo de remuneração seja nosso e global.
Quando um investidor vem ao futebol brasileiro, encontra campo fértil para remodelar tudo, ao mesmo tempo que encontra dificuldade em selecionar profissionais que se adequem aos modelos mais modernos de gestão.
Não há dúvidas que o futebol brasileiro vai se estruturar. Haverá uma liga, teremos organizações mais profissionais, menos intervenções (vide o STJD suspendendo uma partida por questões envolvendo a presença de público no estádio! Como explicar algo assim para um investidor que está acostumado à previsibilidade?) e, paulatinamente, ganharemos mais destaque no cenário internacional.
Mas, como venho dizendo há algum tempo, as melhorias precisam começar a aparecer.