Uma vida de privilégios, luxo e conforto sem paralelos – e profundamente infeliz. Para mim, a triste história da princesa Margaret é uma das partes mais interessantes da série de televisão The Crown, do Netflix.
Margaret, vivida nesta terceira temporada pela fantástica atriz Helena Bonham Carter, é a irmã mais nova da rainha Elizabeth II e frequentemente rouba a cena – na série e na vida real.
Antes que você se pergunte o porquê de estarmos falando sobre TV nesta coluna no Infomoney, peço que confie em mim.
A caçula do rei George VI foi alguém que nunca teve que se preocupar com questões mundanas como boletos. O alívio de passar pela existência sem se preocupar com as contas da casa (ou do palácio) é algo extraordinário para a vida dos reles mortais.
São as roupas, os castelos, as viagens. Os contatos, os convites – como o que ela recebe de forma blasé do presidente americano Lyndon B. Johnson para um jantar oficial na Casa Branca. É fácil imaginar que qualquer um daria tudo por uma vida como aquela.
No entanto, o que a série mostra é o retrato de uma pessoa deprimida, que vive uma existência sem sentido. Ela tinha tudo que o dinheiro poderia comprar – menos o que mais desejava: ser a rainha.
Sua tragédia foi ter sido a filha número 2. Seu único e real desejo era aquele que ela nunca pode realizar.
Pobre menina rica, você pode estar pensando.
Mas o buraco vai mais embaixo. Ao assistir à série, lembrei do filme Aladdin (vale tanto o original, da Disney, de 1992, quanto o remake lançado neste ano, em formato de live action).
Aladdin, o pobre ladrão de bom coração, tem a sua vida transformada no dia em que liberta o gênio de sua lâmpada mágica. Ele tem direito a três desejos e pode pedir basicamente o que desejar – exceto mais desejos.
Sua reação? “Por que apenas três?”, ele pergunta ao gênio.
Para quem não tinha direito a desejo nenhum, sua perspectiva muda rapidamente. E está aí o paradoxo de Margaret: não importa o que você tenha, sempre vai querer mais.
É da nossa natureza esta incapacidade de ficarmos saciados – e eu acredito que esta característica é a raiz da maior parte da nossa infelicidade.
Na psicologia econômica, existe o termo “adaptação hedônica”. A ideia é que conseguimos nos adaptar a tudo que a vida nos traz. Seja algo bom ou ruim, nós nos acostumamos.
O que antes era um luxo em pouco tempo vira uma necessidade. Chamo isso de inflação de estilo de vida: quanto mais ganhamos, mais gastamos.
Um estudo clássico realizado em 1978 nas universidades americanas de Northwestern e Massachusetts foi investigar os níveis de felicidade de pessoas que haviam sofrido um acidente e ficado paraplégicas e de ganhadores de loteria.
Logo após o acidente, os paraplégicos estavam todos compreensivelmente deprimidos, enquanto os novos milionários estavam previsivelmente eufóricos.
No entanto, os pesquisadores voltaram depois de um ano e descobriram que os níveis de felicidade dos entrevistados tinham voltado aos mesmos patamares anteriores ao evento que havia mudado suas vidas, fosse o acidente ou o anúncio da loteria.
Ou seja: nosso padrão de vida pode mudar, mas ele não vai trazer mais felicidade. Ele simplesmente se torna o nosso padrão.
O padrão da princesa Margaret sempre foi elevado. Mas este fato nunca foi suficiente, ao longo da história da humanidade, para garantir uma vida feliz.
Eu acredito que a felicidade está mais ligada ao senso de propósito e sentido – algo que faltou naquela existência tão privilegiada.
Hoje vivemos a um clique de distância de qualquer desejo que possamos ter. Não temos uma lâmpada mágica, mas temos frete grátis e parcelamento sem juros.
O efeito, porém, é o mesmo: se formos buscar a felicidade do lado de fora, vamos passar a vida sem encontrá-la.