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A distância entre duas pessoas é a maior demonstração de amor que existe. É claro que o amor pode resultar em aproximação, e que bom quando o faz. Mas amar estando próximo é fácil. Difícil é dar liberdade quando queremos possuir, controlar, dominar. Essa liberdade só o amor pode dar.
Nunca vou esquecer quando tinha 23 anos e tive que me despedir de minha mãe no aeroporto antes de me mudar para outro país. Ali estavam uma mulher e seu filho, no saguão de um aeroporto do Brasil. Ainda que esse filho tivesse saído de seu ventre e fosse em todos os sentidos uma extensão da sua própria vida, essa mãe, mesmo que em prantos e sabendo que por muitos anos não o veria, abraçou-lhe, beijou-lhe e desejou uma feliz viagem. Por amor, ela deu-lhe o mundo, sem cobrar qualquer retorno.
Lembro também de um casal de amigos, conhecido por ser uma dupla muito feliz. Depois de uma década de relacionamento passaram a ter problemas. Os problemas de forma alguma eram culpa desse casal, mas sim obstáculos normais da profissão e da vida. Aos poucos, a rotina do casal empobreceu e não foram mais capazes de manter a harmonia. Um deles tomou a frente e propôs o término. Embora a dor do casal tenha sido profunda e sentida pela família e amigos, hoje, ambos felizes, reconhecem a importância do distanciamento. Aquele que propôs o término ainda diz “aquilo foi a coisa mais difícil que já tive que fazer na vida”. E só o fez por amor a si e ao outro.
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Semana passada um grande amigo meu perdeu sua mãe. Ele não tem outro familiar próximo, e sabe que ficou “sozinho” no mundo. Mesmo assim, nos últimos minutos de sua mãe ele ainda suspirou no seu ouvido: “Pode ir dona Elisa, vá encontrar seu marido lá em cima. Eu ficarei bem”.
E assim, separações e distanciamentos acontecem todos os dias.
Normalmente as vemos como “derrotas”. Mas essa é uma visão muito limitada.
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A distância e a separação tem um papel que supera qualquer noção de bem ou mal. A separação é o motor da evolução humana e até do universo.
Você deve conhecer a teoria do Big Bang (não o seriado!). Há bilhões de anos, antes da existência do universo, tudo que conhecemos, você, eu, a grama, o shopping, os planetas, enfim, todos os átomos se concentravam em um ponto denso, unidos pela gravidade. Esse ponto, um grande acúmulo de energia, em determinado momento explodiu, e os átomos ali presentes iniciaram movimentos para fora daquele ponto. Toda essa matéria em movimento são os próprios planetas e astros, são você, em movimento até hoje.
Embora em movimento para fora do ponto original, toda essa matéria se movimenta atraindo-se, formando planetas, órbitas, galáxias. Isso acontece porque o universo, ainda que em movimento, é composto por aquela mesma lei de atração que mantinha o ponto original unido: a gravidade.
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Veja que em nossa origem estávamos unidos. E uma explosão inicial nos colocou em movimento de separação.
E, depois de bilhões de anos desse movimento de expansão do universo, eis que surgiu a vida na terra. Surgiram seres que se organizam em famílias, que se unem em cidades, que fazem guerra, que se apaixonam, que brigam. Seres dotados de instintos de união, ainda que com momentos de separação e distanciamento.
Esse impulso pela união é, de certa forma, um instinto de retornar ao que um dia fomos: um só. Pois, no fundo, sabemos que de fato somos um só, separados pelo movimento do universo. E, se para a física a lei da gravidade explica a atração entre corpos, para a vida o amor explica a atração entre seres humanos.
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O amor é a lei que nos permite reconhecer nossa origem: o fato de que realmente somos um só, separados temporariamente. Minha mãe ao me dar adeus no aeroporto não via isso como uma separação, mas como uma união. Uma união de seu filho com o mundo, com o todo. Ela sabia, talvez até instintivamente, todos os obstáculos, lições e escolhas que eu teria que passar para evoluir como homem.
Em relações românticas, a separação raramente é vista dessa forma. Ao invés de compreensão, surgem as brigas, tapas, divisões. Que machucam profundamente e causam muitas lágrimas, sobretudo a quem se sensibiliza não em um nível superficial de perdas materiais, mas em um nível profundo de perda de uma pessoa querida, amada.
A única forma de passar pelas separações naturais da vida com bem-estar é compreendê-las como elas realmente são. E essas separações, que são frequentes e incluem o crescimento dos filhos, mudanças de cidade, de emprego e um dia a morte, são na verdade movimentos de união com o todo. São movimentos da nossa evolução.
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Quando compreendemos isso ficamos mais leves, e assim podemos nos surpreender com nossa união e reunião com o todo a qualquer momento. Como filhos que amadurecem em outro país e retornam, como casais que se entendem depois de evoluírem por um tempo sozinhos. Ou como eu e minha querida mãe, que depois de muitos anos separados, moramos no mesmo bairro e tomamos café na casa dela umas 3 vezes por semana, juntos.
O amor é como a gravidade. Ambos sabem que, apesar de haver atração entre corpos, haverá também momentos de distanciamento e separação. A gravidade e o amor não reagem à distância fazendo guerra, pois sabem que a união com o todo é um fato, e o reencontro é uma questão de tempo.