O espetacular IPO da Coinbase é mais um sinal de que o mercado financeiro tradicional precisa se reinventar – ou irá sumir

Mercado começa a abrir os olhos para as transformações das estruturas cripto trazem e que colocam em xeque várias estruturas do mercado financeiro tradicional

Gustavo Cunha

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Muitos de vocês devem ter acompanhado a listagem no mercado americano de uma das principais exchanges de cripto, a Coinbase, nesta semana.

Por qualquer ângulo que consigo ver, essa listagem é uma marca espetacular dentro do mercado financeiro tradicional.

Pelo preço da oferta (US$ 381), a Coinbase foi uma das maiores aberturas de capital já feitas na Nasdaq, sendo maior que a da British Petroleum e em um valor muito próximo à listagem do Facebook em 2012.

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Com um valor de mercado de aproximadamente US$ 100 bilhões, ao preço de lançamento, também não fica muito longe de instituições tradicionais como o Citibank, que vale aproximadamente US$ 150 bilhões.

Seu criador, Brian Armstrong, se consolidou entre os mais ricos do mundo com uma fortuna estimada de US$ 16 bilhões.

Do ponto de vista local, o sucesso dessa listagem abre espaço para operações similares serem feitas por aqui.

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Já é pública a intenção do Mercado Bitcoin de seguir o mesmo caminho. Alguém se surpreenderia se o valor de mercado dessa exchange brasileira fosse maior que o de vários bancos tradicionais? Logo em breve saberemos.

Podia passar o artigo todo falando sobre os fatos importantes dessa listagem, mas o que quero tratar neste texto é de algo mais amplo.

O fato de que o mercado finalmente começa a abrir os olhos para as transformações que essas estruturas cripto estão trazendo, colocando rapidamente em xeque várias estruturas e corporações do mercado financeiro tradicional.

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Então vamos lá. Coloco abaixo as três razoes pelas quais acredito que esse movimento, que começou com a criação do Bitcoin há 12 anos, transformará de vez os alicerces do mercado financeiro.

1- Migração de ativos financeiros tradicionais para o mercado de negociação cripto

Há poucos anos, quando abríamos cadastro nas grandes exchanges cripto, era para comprar tokens, majoritariamente Bitcoin e Ethereum.

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Hoje, essas exchanges oferecem uma enorme gama de produtos, inúmeros tokens com casos de uso muito diversos, além de aplicações deles para ganhar juros, derivativos e vários sintéticos de produtos do mercado financeiro tradicional.

Um bom exemplo disso foi a listagem na corretora Binance e FTX de um certificado da ação da Coinbase. Isso mesmo. Dentro dessas corretoras você pode negociar no mesmo dia de lançamento um certificado que representa a ação da Coinbase na Nasdaq.

Essa ponte entre ações listadas em Bolsa e as exchanges cripto existe há pouco tempo e tem como base estruturas montadas na Alemanha, onde uma empresa do mercado tradicional compra as ações, as bloqueia em uma conta e emite um certificado que é negociado nas corretoras cripto.

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Não é exatamente uma tokenização de ativos pois esses certificados só podem ser negociados nos ambientes fechados dessas exchanges, mas cumpre o objetivo de oferecer exposição de risco a ações tradicionais nas exchanges cripto.

Para ficar mais claro como isso é disruptivo para o mercado financeiro, vou dar um exemplo.

Antes desses certificados, um cliente dessas exchanges que tivesse Bitcoin custodiado lá e que, em um determinado momento, quisesse vender os Bitcoins e investir em ações (Amazon, Tesla, Microsoft, Citibank, GE ou qualquer outra), teria que vender os Bitcoins nessa corretora, mandar o dinheiro para um banco ou corretora tradicional e lá comprar as ações.

Quando quisesse reverter isso, teria de fazer o caminho contrário. Essa intersecção entre o mercado tradicional e o mercado cripto é uma zona de muito ruído, devido à migração de um mercado regulado para outro que não está dentro da mesma regulação.

Com a criação desses certificados nas exchanges cripto, isso não é mais necessário. O cliente faz a venda de Bitcoin e compra os certificados de ações lá dentro da exchange mesmo.

Depois de o dinheiro ter feito a migração do mercado tradicional para o mercado cripto, não haveria razão para a volta.

Ainda existem alguns ativos que não são representados no mundo cripto, como títulos públicos americanos ou alemães e fundos imobiliários, mas quanto tempo deve demorar para isso acontecer? E quando tudo estiver representado (“tokenizado”) nas exchanges cripto, o que acontecerá com os bancos e corretoras tradicionais?

2- Velocidade

Um muito fator diferente entre as exchanges cripto e o mercado tradicional está na velocidade de inovação. Não vou entrar aqui nas razões para isso, que vão desde sistemas legados até regulamentação e cultura da empresa, entre outros fatores.

Meu ponto é que a velocidade com que essas empresas estão andando é anos-luz maior do que a das empresas tradicionais. Lembro-me das discussões sobre o lançamento de ETFs de renda fixa e COEs no Brasil, que levaram anos.

E a discussão atual sobre fundos para investidores não-qualificados, que podem aplicar somente 20% do seu patrimônio no exterior? Em pleno 2021!

A velocidade das exchanges cripto se mostra mais identificada com o mundo atual e as gerações mais novas, que pedem algo mais dinâmico, rápido, personalizado, algo que essas corretoras também trazem.

3- DEFI – Decentralized Finance

Se você já acha esse movimento das exchanges disruptivo, a pá de cal para a arquitetura atual do mercado financeiro tradicional poderá vir desse segmento cripto.

Dentro de DEFI, há iniciativas com governança distribuída e comandada por softwares que replicam de maneira muito mais eficiente e transparente, com praticamente todas as funções e estruturas do mercado financeiro tradicional.

Por meio delas, é possível colocar um ativo em colateral e tomar empréstimos de qualquer lugar do mundo, de forma rápida e automática. A Maker e sua stablecoin DAI são o grande exemplo. Mas não é só isso.

A Uniswap vem com um modelo de negócio que atinge diretamente as exchanges centralizadas como a própria Coinbase, a Binance ou, no caso brasileiro, o Mercado Bitcoin e BitcoinTrade, entre outras. Ela já tem um volume de negociação que em muitos dias ultrapassa essas grandes exchanges.

É como estarmos vendo o movimento do Uber acontecendo no início de 2016 no Brasil e já haver uma iniciativa que coloca o seu modelo de negócio em xeque.

Estamos falando da fronteira, mas que já está aí e sendo testada. Se as exchanges estão trazendo todos os ativos e pessoas para o mundo cripto, DEFI os levará para estruturas ainda mais inovadoras e distribuídas, em que a divisão entre cliente e dono fica muito tênue.

Por fim, vale fazer a ressalva de que todo esse mercado, apesar de já ser enorme, tem riscos e ainda está em formação. A regulamentação está tentando se ajustar a esse novo mundo. Mas como em tudo que é inovação trazida por novas tecnologias, acaba correndo atrás e demorando.

Sempre gosto, e enfatizo, que a dupla educação e experimentação é a melhor forma de sucesso. Se quer um conselho, entre de cabeça para entender melhor vários dos aspectos que comentei acima. É o que faço desde 2017 e não canso de me surpreender.

Vamos continuar a conversa?

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Gustavo Cunha

Autor do livro A tokenização do Dinheiro, fundador da Fintrender.com, profissional com mais de 20 anos de atuação no mercado financeiro tradicional, tendo sido diretor do Rabobank no Brasil e mais de oito anos de atuação em inovação (majoritariamente cripto e blockchain)