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Para boa parte dos brasileiros, saúde é um dos temas que causam mais preocupação. Levantamento recente feito pelo Datafolha, e publicado pelo jornal “Folha de S.Paulo”, mostra que 87% dos jovens de 15 a 29 anos classificam a saúde como muito importante enquanto os demais 13% a consideram importante.
Um tema tão importante como esse não ficaria de fora da discussão da série “Brasil, 2023”, da Rio Bravo Investimentos. E para falar a respeito nossos convidados do quinto episódio da temporada deste ano foram: a médica Roberta Grabert, MBA em gestão de saúde e liderança associada do movimento Livres; e o sanitarista Gonzalo Vecina, que, para além dos cargos que já ocupou na gestão pública e privada, é docente da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
Na sua primeira intervenção, Grabert quis deixar claro que, embora participe de um movimento que sustenta a bandeira liberal, preza pela defesa de um sistema universal de saúde. “Quando falamos em liberalismo, nós estamos falando de 2022, e não estamos falando de 1900 ou de 1870. Hoje em dia, num país como o nosso, com uma desigualdade do nível que nós temos, não pensarmos nas pautas sociais. Isso faz parte do bem-estar. Quando prezamos a liberdade, aquela que é mais bonita estimar é a liberdade do outro”. Nesse sentido, a convidada do videocast da Rio Bravo questiona: “como é que eu posso querer ser livre, se eu tenho um conterrâneo meu, um vizinho passando fome?” Grabert completa destacando que advogar a causa das pautas sociais não faz dela socialista ou comunista. “Eu sou um ser humano que reconhece no outro ser humano alguém igual a mim”.
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Provocado por Roberta Grabert para se manifestar, Gonzalo Vecina não hesita em se posicionar: “Acho que a questão da crise social, e a necessidade de um Estado presente que busque construir igualdade, é fundamental. Eu não adjetivaria essa questão, dizendo se é liberal, se é socialista ou se é comunista. Mas, se tiver que dizer, sou comunista! Mas não acho que isso mude muita coisa”. Se esta não é a ordem do dia, qual é a agenda mais importante neste ponto? O professor da Faculdade de Saúde Pública responde: “se o mundo serve para alguma coisa, é para que nós vivamos bem nele. E para que isso aconteça, teremos de ter uma sociedade com um governo que seja patrocinador dessa igualdade”. Vecina destaca que as tarefas desse governo são prover saúde, educação, emprego, segurança, enfim, esse Estado de bem-estar social que entregue uma condição de igualdade para todos”.
Desigualdade e o exemplo da gravidez na adolescência
A referência no parágrafo acima não é a única que os convidados fazem à questão da desigualdade. Em verdade, Grabert e Vecina ressaltam a importância desse tópico para enfrentar o debate em torno do acesso à saúde, por exemplo. De acordo com a liderança do Livres: “Nós vivemos uma realidade invertida. Até dentro do SUS existe desigualdade. O SUS de São Paulo não é igual o do Piauí”. Na avaliação de Grabert, “ainda não chegamos ao ápice das políticas públicas bem executadas, bem como a ausência de protocolos e a sobrecarga de alguns serviços”.
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Ao refletir a respeito deste fenômeno, Gonzalo Vecina sublinha: “é preciso entender que saúde não é só saúde. Um dos problemas da Brasilândia (bairro de São Paulo) é a gravidez na adolescência. Como é que faz para combater esse fenômeno? Não bastam ações relacionadas à educação sexual”. Aqui, Vecina traz sua própria experiência para o debate: “Por que minha filha não engravidou quando era adolescente? Porque ela tinha agenda, ou seja, atividades relacionadas à educação física, atividades culturais, outro idioma para aprender. A filha do pobre não tem esse tipo de alternativa”. O sanitarista acrescenta: “A periferia é um deserto. O que sobra para os jovens fazerem? Não muita coisa. Então, se não tiver educação, cultura, esporte e lazer, eu não diminuo a gravidez na adolescência”.
O tema da gravidez na adolescência volta ao debate quando Roberta Grabert cita, com indignação, a ausência de políticas públicas adequadas para o enfrentamento dessa questão. “Além do que o professor disse, existe uma política pública de péssima qualidade. O que a ciência diz? Que devemos abordar a causa forte de um fenômeno assim. Em vez disso, gasta-se milhões com uma política de abstinência”. O sanitarista Gonzalo Vecina não esconde sua indignação ao ouvir essas palavras.
A importância da atenção primária
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Em outro momento do videocast, Vecina explica por que a atenção primária merece atenção destacada quando o assunto é saúde pública. “Com a carga de doenças que nós temos hoje, não tem como enfrentar aquelas que são crônico-degenerativas sem atenção primária. É impossível”.
O professor da Faculdade de Saúde Pública, então, enumera as doenças que demandam esse tipo de abordagem. “Trinta e cinco por cento da mortalidade brasileira têm a ver com as doenças cardiovasculares. Qual é o componente mais importante dessa carga de doenças como diabetes ou hipertensão? Não é com remédio. Na verdade, ou a pessoa muda o seu hábito de vida, ou não há como combatê-las”.
O papel do médico de atenção primária é ser cúmplice desse sujeito paciente, devendo, assim, desenhar um plano terapêutico único, não há como essas mudanças acontecerem. “Não tem como enfrentar essa carga de doenças sem o compromisso do paciente, que é o sujeito da própria saúde”, explica Vecina, que complementa: “e não há como fazer isso sem a atenção primária”.
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Aqui, Roberta Grabert faz questão de mencionar, neste caso em específico, a atuação de um profissional decisivo para o êxito da proposta da atenção primária: “Nós acabamos falando muito de médico, mas o agente comunitário da saúde vai à casa das pessoas”. Para Grabert, uma vez capacitado, o agente ajuda não apenas a saúde, mas em muitas outras coisas. “Nós temos uma estrutura muito bonita, filosoficamente montada, que só falta ser colocada para funcionar adequadamente”.
Vecina rebate: “precisamos melhorar. Nós estamos cobrindo com a Estratégia Saúde da Família 60% da população brasileira. Precisamos chegar aos 90%. É uma tarefa dos municípios, mas o governo federal tem uma capacidade de indução muito grande, pois 25% da estratégia dependem de seus recursos”.
Orçamento
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Ao final do painel, Roberta Grabert e Gonzalo Vecina sinalizam qual é o elemento principal para a saúde brasileira no ano que vem. Vecina não tem dúvida: “Financiamento. Precisa colocar dinheiro na equação.” E o sanitarista justifica: “O Brasil gasta 4,3% do PIB em saúde pública. A média dos países europeus, 8%. Em comparação com os nossos vizinhos, em 2018, nós gastamos 1.600 dólares per capita/ano, a Argentina 2.000 dólares e o Chile 1.500. Nós precisamos de gastar melhor, sem dúvida, mas precisamos de mais recursos”.
Roberta Grabert vai na mesma direção, destacando a importância das políticas públicas. “Todo dinheiro que entrar nós temos de investir nessa linha de ação”.
Não resta dúvida: a saúde é um tema central para a vida dos brasileiros. E a conversa com a especialista Roberta Grabert e o sanitarista Gonzalo Vecina mostra quão fundamental é tratar desse tema a partir de um olhar mais qualificado, sem buscar soluções fáceis para problemas complexos. Em vez disso, é fundamental elevar o nível do debate, com propostas consistentes para o longo prazo.
A íntegra do quinto episódio do videocast da Rio Bravo pode ser acessada a partir do link a seguir.