Tech Visa facilita entrada de profissionais brasileiros em Portugal; conheça

Visto lançado em janeiro pode ser a oportunidade certa para profissionais brasileiros da área de tecnologia

Giovanna Sutto

Porto, em Portugal, uma das cidades que abrigam os profissionais de tecnologia.
Porto, em Portugal, uma das cidades que abrigam os profissionais de tecnologia.

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SÃO PAULO – Portugal é um destino em evidência para brasileiros. Segundo dados Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal (SEF), em 2018, a nacionalidade brasileira se manteve como a principal estrangeira residente no país com 105.423 cidadãos, representando mais de um quinto do total (valor mais elevado desde 2012). Um aumento de 23,4% em relação a 2017.  

A atividade profissional foi um dos principais motivos na concessão de novas autorizações de residência em 2018, com 17.771 pessoas chegando ao país para trabalhar, segundo dados do SEF. Perde apenas para a categoria de reagrupamento familiar, com 26.660. 

Para facilitar o processo de quem quer trabalhar por lá, o país lançou em janeiro deste ano o Tech Visa, uma modalidade de visto focada em profissionais de tecnologia. É uma forma menos burocrática, mais rápida e mais barata para ingressar e trabalhar no país.

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“O Tech Visa é direcionado para empresas tecnológicas e inovadoras inseridas no mercado global que querem atrair profissionais qualificados para Portugal. Nos últimos anos o país ganhou título de ‘hub de tecnologia’ e está passando por um momento de recuperação econômica. Por isso, está apostando muito no setor, além de estar recebendo uma série de investimentos”, afirmou Leonardo Freitas, especialista em imigração e sócio-fundador da Hayman-Woodward, em entrevista ao InfoMoney. 

Quem pode participar?  

O objetivo do visto é atrair os chamados profissionais qualificados. Entre as profissões que podem ser candidatos estão engenheiro de software, cientista de dados, programador, designer, arquiteto de infraestrutura, entre outros relacionados com o setor de tecnologia. A possibilidade não é exclusiva para brasileiros, mas os profissionais daqui têm preferência, segundo Freitas, pela similaridade da cultura e quantidade de profissionais da área.   

“O visto faz parte de um programa nacional de empreendedorismo de Portugal, que incentiva o desenvolvimento de tecnologia. Por isso, para ser elegível ao visto, o profissional precisa ser procurado por empresas que tenham aderido a esse programa junto ao Ministério da Economia local”, explica Freitas.  

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Mas é possível também que a própria pessoa se candidate enviando seu currículo para a empresa. Clique aqui para saber quais empresas integram a lista de aprovadas.

Como funciona  

Antes do Tech Visa, os estrangeiros conseguiam viver em Portugal com o visto de Estudante (D4 ou D5), o de Trabalhador (D1 ou D3) válido para qualquer profissão, desde que apresentado contrato de trabalho, o de Investidor, o de Aposentado (D7), além do Golden Visa (ARI), destinado aqueles que investirem em imóvel de 500 mil euros ou criar uma empresa com 10 empregados.  

Esses continuam existindo, mas o novo programa vai agilizar o processo de concessão de visto e autorização de moradia – mesmo com o envolvimento de todas as autoridades do processo, como o SEF e o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP).  

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Para que a chegada de profissionais estrangeiros seja possível, as empresas que farão as contratações devem seguir pelo menos dois dos seguintes requisitos: possuir mais de 15% de trabalhadores altamente qualificados, ter um crescimento médio anual do volume de negócios superior a 20%, ter sido criada há pelo menos dois anos em setores da alta ou média alta tecnologia, ter angariado investimento de capital de risco, ter projetos de investimento ou candidaturas aprovados nos últimos três anos dentro das regras previstas no Portugal 2020, programa de desenvolvimento regional da UE, Quadro Financeiro Plurianual da UE ou do Sifide (Sistema de Incentivos fiscais à I&D Empresarial).

Ainda, as empresas selecionadas devem ter avaliação positiva à candidatura com base nos três critérios de avaliação previstos pelo programa do visto: potencial de mercado, grau de inovação tecnológica e orientação para mercados externos. O cadastro das empresas já aprovadas dura 2 anos, sendo necessário fazer a renovação. 

O processo  

Tabata Gonçalves de Carvalho está morando na cidade do Porto, em Portugal, há 7 meses por meio do Tech Visa. “Eu fui contatada através do LinkedIn. A empresa me sondou e perguntou se eu tinha interesse em trabalhar e mudar para Portugal”, explica em entrevista ao InfoMoney.

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Ela é engenheira de software sênior e trabalha na Fartfetch, um e-commerce de luxo. Mas ela foi contratada pela Altran, uma recrutadora especializada em profissionais de tecnologia, que tem como um de seus clientes a empresa online de moda.

Segundo Tabata, a profissão engenheiro de software está em alta no mundo todo. Ela mesmo recebeu uma outra proposta do Canadá, mas em conjunto com a esposa, decidiu ir para Portugal. “A Altran procura muitos brasileiros. Eu mesma indiquei cinco amigos. Conheço outros engenheiros que trabalham na Alemanha e Irlanda. A demanda é grande”, diz.

As entrevistas são feitas via Skype. Carvalho conta que a primeira foi mais pessoal: a empresa pediu para contar um pouco da experiência de vida, experiência na área de atuação, hobbies, entre outras coisas. Depois houve mais duas entrevistas técnicas sobre o trabalho e a parte operacional, incluindo códigos de programação e todo o background que ela conseguiu em anos trabalhando na área.

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“Geralmente quando o profissional chega aqui, trabalha em empresas que atendem a Europa toda, por isso o idioma padrão é o inglês. Assim, todas as entrevistas que fiz tiveram uma parte em inglês”, conta.

Ela lembra que os profissionais seniores são preferencialmente selecionados. “Onde trabalho você não encontra um engenheiro de software com menos de 7 anos de experiência”, conta.

Aprovada em novembro após as entrevistas, ela embarcou para Portugal no começo de março. Nesse período ela precisou dar entrada no Consulado Português em São Paulo, sua cidade natal, com uma série de documentos.

É obrigatório levar diploma de bacharel, RG, CPF, comprovante de residência no Brasil, atestado de antecedentes criminais, e o contrato da empresa ou um documento que comprove que o profissional tem trabalho no país europeu – que é entregue pela própria empresa. Não é necessário comprovante de moradia em Portugal.

Se o candidato for aprovado nesta fase, ele tira um visto temporário de moradia, chamado título de residência, que dura três meses. Com esse documento em mãos a pessoa entra em Portugal já com uma data agendada no SEF para fazer uma entrevista final e pegar o Tech Visa. Nesse meio tempo, já começa a trabalhar normalmente.

“Tirei o título de residência e depois de três meses fiz uma nova entrevista, que a própria empresa que te contratou define a data. Durante esse papo no SEF, é preciso entregar todos os documentos de novo, além de provar que eu tinha onde morar e que mantive o contrato de trabalho. Também não pode ter dívidas”, explica Carvalho.

Sendo aprovado nessa etapa, o candidato consegue oficialmente o Tech Visa, que dura um ano. Passado esse tempo, é preciso renová-lo, e o próximo dura dois anos. Depois, deve renová-lo novamente por mais dois anos. Passados esses cinco anos é possível dar entrada na cidadania portuguesa, segundo explicou a engenheira.

“As renovações são bem menos burocráticas que a primeira vez que o profissional faz a entrevista. Fica mais fácil. Além disso, se a pessoa está realmente trabalhando em Portugal nesses três meses iniciais e alugou um apartamento dificilmente o Tech Visa é negado”, diz. Assim, em junho ela estava com o Tech Visa em mãos.

Ela explica que a empresa que a contratou ofereceu três semanas de graça em um hotel, assim que ela chegou em março – atitude comum dos empregadores para levar os profissionais até lá. Depois disso ela alugou um apartamento, no qual mora até hoje.

Custos  

“A pessoa pode negociar a passagem e um tempo de moradia para se ajustar, mas isso é definido diretamente com o empregador. Cada caso é um caso. Não há restrições em relação aos cônjuges e família, que também podem morar em Portugal, mas não há trabalho garantido, e geralmente a empresa não cobre os custos de passagens. O cônjuge ou familiar tira um visto de dependente para conseguir morar lá também”, explica Freitas.

Tabata afirma que a Altran arcou com custo de passagens somente para ela e os gastos com a passagem da esposa – que deve chegar em outubro ao país – fica por conta da dupla. Em linha com o que o especialista afirmou.

“Mas tudo o que eles pagam para o profissional fica no contrato que dura em média dois a três anos. Se por algum motivo a pessoa reincidir o contrato nesse período deve reembolsar o valor da expatriação”, afirma.

Além disso, no Consulado Português no Brasil é preciso desembolsar R$ 64 de taxa para dar entrada no visto – esse valor geralmente é pago pela empresa que está contratando o profissional. Ao chegar em Portugal na entrevista com o SEF, uma outra taxa de 50 euros para a confecção do Tech Visa é cobrada, mas essa sem reembolso.

Assim, hoje ela arca com o custo do aluguel que gira em torno de 600 euros por mês. Na prática, o profissional que for contratado precisa se preparar para os custos diários da vida no país Europeu, como supermercado, luz, água, etc.

Mas segundo Carvalho, o custo de vida não é tão caro. “Eu ganho bem menos do que ganhava no Brasil, mas não gasto tanto quanto gastava em São Paulo. Moro a 900 metros da praia, perto do trabalho, meu maior gasto realmente é com o aluguel”, explica.

Mas ela conta que pretende investir em um imóvel. “A compra de casas aqui é facilitada. Considerando que o salário de TI é mais alto que a média, em pouco mais de um ano pagando todas as contas e declarando os impostos, é mais fácil conseguir um financiamento. Assim, ao invés de pagar 600 euros por mês com o aluguel, é possível pagar cerca de 200 a 300 euros por mês em um empréstimo de uma casa que é sua. A taxa de juros é de 1% ao ano aqui”, afirma.

Remuneração de Portugal é baixa  

Empresas em Portugal pagam menos que a média oferecida em outros programas que atraem profissionais qualificados, de acordo com Freitas. 

Freitas compara, nos EUA, o visto EB2-NIW com o Tech Visa. O país americano, porém, “incentiva profissionais de engenharia, ciência, tecnologia e matemática, sem obrigação de um empregador ‘chamante’ – e pagam mais”, diz.

Holanda e Alemanha também oferecem sistemas semelhantes, bem como Japão, China e Canadá, embora exijam a fluência no inglês. E segundo o especialista em imigração, em todos esses casos os salários são mais atrativos do que em Portugal – que normalmente é escolhido por quem quer viver em uma cultura mais parecida com a de casa – inclusive pelo idioma. 

Tabata conta que a proposta que recebeu para ir trabalhar no Canadá era muito melhor em termos financeiros. “Eu iria ganhar 7 mil dólares canadenses por mês, sendo que a média de aluguel por lá é de 1 mil dólares canadenses – muito mais vantajoso, do que os 2.100 euros que ganho aqui. Mas conversei com a minha esposa e até pelo clima optamos por Portugal”, explica.

Além disso, a tributação é pesada. “Eu ganho pouco e o imposto é alto. O imposto é de 30% para rendas acima de 1.500 euros. Assim, eu tiro cerca de 1.500 euros líquido por mês. Enquanto no Brasil, eu ganhava cerca de R$ 15 mil e pagava 6% de imposto porque era PJ”, explica.

Mesmo com esse impasse, Carvalho não pensa em volta para o Brasil. “Não me arrependo – o que eu perdi em termos de salário, ganhei em qualidade de vida. Além disso, aqui é um bom país para empreender. Minha esposa vai deixar o emprego como arquiteta para tentar algo aqui. Assim, o salário é mais baixo, mas existe a chance de termos duas rendas”.

Vantagens  

Freitas explica que toda vez que um profissional busca um caminho de internacionalização da carreira abre horizontes. “A mobilidade global é o presente. Profissional não está preso na fronteira, pode trabalhar em qualquer país.  O problema no Brasil é que estatística e culturalmente somos uma cultura insular – ficamos isolados dos países vizinhos e da Europa – não fazemos muito intercâmbio de ideias e de problemas técnicos”, explica.

O especialista em imigração acredita que atrelar o salário a moedas como o dólar, euro ou a libra é “um ponto positivo”. Mas faz um alerta: “apesar de existir vagas na área de tecnologia, pelo tamanho do país o numero de vagas tende a ser menor do que nos EUA, por exemplo. Quem tem interesse no Tech Visa deve rapidamente se envolver no programa de recrutamento de empresas para tentar o visto – essas vagas tendem a ser escassas”, afirma.

A profissional que mora por lá conta que o ritmo de trabalho é bem melhor. “A realidade é muito diferente. O que fazemos em um mês em São Paulo, aqui se faz em cinco. Mas é tudo mais organizado, menos caótico. Eu trabalhava mais de oito horas, por vezes, quase 11h por dia. Na última semana antes de sair, eu madruguei quatro noites em São Paulo para entregar os projetos. E essa é a vida de qualquer programador por lá. Mas aqui em Portugal eu entro e saio no meu horário e minha vida está bem melhor”, afirma.    

Durante esse processo de transição, a engenheira conta que emagreceu sete quilos porque se organiza melhor e tem tempo para cuidar da saúde. “Não passo noites comendo pizza e tomando café para fechar projetos”, lembra.

Mas ela dá algumas dicas. “Não venha com medo, se decidir embarcar nessa oportunidade. Aqui é mais organizado, mais qualidade de vida, compensa muito. Trabalho menos, e me adaptei fácil, além de ser mais fácil conseguir a cidadania daqui uns anos”, afirma.

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Giovanna Sutto

Jornalista com mais de 6 anos de experiência na cobertura de finanças pessoais, meios de pagamentos, economia e carreira. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.