‘Maternidade não é problema se houver foco’: como a 1ª CEO da Gafisa concilia gestão e gravidez?

Sheyla Resende defende que a mulher não deve adiar plano de ser mãe, caso queira, porque a satisfação pessoal dá fôlego à carreira

Martha Alves

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2023 trouxe boas surpresas à Sheyla Resende, 38. A executiva foi promovida ao cargo de CEO da Gafisa (GFSA3), em janeiro deste ano, tornando-se a primeira mulher na posição mais elevada da companhia em seus 70 anos de atuação no ramo da construção civil e do desenvolvimento imobiliário no Brasil.

No campo pessoal, Resende também pôde ser mãe pela segunda vez: está grávida de uma menina — ela já é mãe de um menino de 1 ano e quatro meses. A tarefa de equilibrar-se entre as decisões corporativas e a criação dos filhos vem sendo encarada por ela como mais um desafio.

Ao contrário de muitas mulheres, a executiva diz que nunca cogitou adiar o sonho de ser mãe em função da carreira e sempre teve clareza de que queria ter dois filhos. Para ela, conciliar a maternidade e a vida profissional está mais relacionado com a otimização do tempo dentro e fora da empresa. “Eu falo muito para as pessoas que elas precisam de foco para que tenham entregas satisfatórias no trabalho e possam priorizar o tempo livre com qualidade”, diz.

Ela foi alçada à posição de CEO justamente quando já estava grávida da segunda filha, situação que ainda é uma exceção no ambiente corporativo como um todo.

“Eu sempre falo para as mulheres não fazerem da maternidade uma dificuldade na vida delas. É uma fase que você se organiza, as coisas vão dar certo.”

Na Gafisa, o percentual de mulheres na liderança (45%) ainda está abaixo do de homens (55%), mas a busca pela equidade de gênero na chefia, segundo a executiva, vem sendo estruturada sem excluir as mulheres grávidas (ponto fundamental na inclusão e no aperfeiçoamento de lideranças femininas): elas podem, por exemplo, participar de processos seletivos. E na volta da licença-maternidade têm a chance de serem promovidas de cargo.

Falando em licença-maternidade, em breve, a executiva terá de se afastar do comando da construtora para dedicar-se integralmente à filha. E como será esse período? Sem estresse, diz. A certeza de que tudo seguirá nos trilhos sem ela ganha amparo na gestão descentralizada que executa.

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“Temos um comitê de gestão que trabalha em conjunto, e as decisões estratégicas são tomadas por nós quatro [ela e mais três executivos]. Todos sabem o que está acontecendo. Quando chegar a hora de sair de licença tudo vai continuar acontecendo independentemente da minha presença física na empresa”, afirma.

Sheyla Resende, CEO da Gafisa
Sheyla Resende, CEO da Gafisa

Oportunidade

A maternidade, narra a CEO ao InfoMoney, é uma oportunidade. Olhando para a própria trajetória, Sheyla sinaliza que o fato de não ter adiado o desejo de ser mãe pela segunda vez funcionou como um trampolim.

“Estar realizada hoje na minha vida social e pessoal é o que me dá fôlego para uma vida profissional também de sucesso. Você não pode ter a sua realização da vida só no profissional, porque o pessoal impacta diretamente. Eu entendo que, com equilíbrio, é possível ter sucesso em ambos os lados.”

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Os números do 1º trimestre deste ano, já sob o comando de Sheyla, sinalizam bons ventos à Gafisa, que vem se consolidando nos empreendimentos de alto padrão.

Os dados mostram que as vendas brutas da Gafisa atingiram R$ 301,5 milhões, alta de 22% em comparação com o 1º trimestre de 2022. No acumulado de 12 meses, as vendas brutas somaram R$ 1,2 bilhão, representando um crescimento de 41% em comparação ao mesmo período do ano anterior.

As vendas líquidas alacançaram R$ 288,3 milhões no 1º trimestre deste ano, aumento de 24% em relação ao mesmo período de 2021. Os empreendimentos de médio-alto e alto padrão corresponderam a 84% das vendas líquidas e 75% no acumulado de 12 meses.

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Vida cigana

O trabalho de CEO exige adaptabilidade. Sheyla diz que essa capacidade é adquirida com o tempo a partir dos desafios. Mas ela também enfatiza que a vida anterior à do escritório também a ajudou.

A executiva cita, por exemplo, que teve uma infância agitada por causa do trabalho do pai, que atuou como engenheiro de estradas. A cada novo projeto de infraestrutura, a família de Sheyla se mudava de cidade e experimentava o contato com novos amigos, sabores, sotaques e jeitos de encarar o mundo.

“Morei em mais de 20 cidades na minha infância. Meu pai terminava uma estrada, e a gente se mudava por causa de um novo projeto. Ter passado por muita mudança fez com que eu aprendesse a me adaptar muito rápido e contribuiu para toda a minha carreira profissional”, diz.

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A executiva também se formou em engenharia, mas só que a especialidade escolhida foi diferente da de seu pai: ela partiu para a construção civil. Na Gafisa já são 14 anos, dos quais quatro no quadro diretivo da companhia. A entrada na construtora ocorreu por meio do programa de trainee logo após concluir a universidade, em Juiz de Fora (MG).

Sheyla não vê desvantagem em ter construído sua carreira em uma única empresa, a exemplo do pai que trabalhou durante 35 anos em uma companhia. Ela acredita que isso permitiu cumprir diferentes funções que trouxeram um olhar ampliado para as diferentes áreas do negócio que comanda. Ela passou pelos cargos de engenheira, coordenadora e gestora de obras, diretora de recursos humanos, gestão e tecnologia, administrativa e comunicação, além da vice-presidência até chegar à posição atual.

“Eu tive a possibilidade de atuar em todas as áreas. Participei de todo o processo de aquisição e integração entre empresas desde de 2019. O que me fez assumir essa posição [de CEO] foi sem sombra de dúvidas a clareza da responsabilidade e segurança sobre o caminho que a empresa precisa tomar”.

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Sheyla quer que a sua posição na Gafisa sirva de exemplo para muitas mulheres e outras empresas, mas ela sabe que ainda vai demorar muito para ver que a presença feminina no topo deixe de chamar a atenção.

“Esse mundo ideal vai demorar muito. Nós, [mulheres], ainda temos muitas barreiras para superar. Eu tenho clareza de que o que tenho aqui na Gafisa é uma exceção e trago isso para as pessoas com as quais eu converso.”

Questionada sobre se existe uma receita para uma mulher construir uma carreira de sucesso e chegar ao cargo de CEO, ela não hesita em dizer que é um somatório de atributos que valem para qualquer posição. “Você precisa ter foco, dedicação naquilo que faz, segurança e entrega. Fazer uma avaliação dos seus resultados é superimportante, ter uma análise crítica daquilo que está entregando e saber como pode melhorar e se desenvolver”, finaliza.

Raio-X

Sheyla Resende, 38, é a primeira mulher CEO da Gafisa. Formada em engenharia civil na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), começou na empresa como trainee. Nos últimos quatro anos, ocupou as diretorias de recursos humanos, gestão e tecnologia, administrativa e comunicação, vice-presidência até chegar à posição atual, de CEO.

Martha Alves

Jornalista e Mestre em Comunicação. Foi repórter nos jornais Folha de S. Paulo e Agora São Paulo e acumula experiência em comunicação corporativa