Publicidade
O ano de 2023 foi tão movimentado quanto 2022 em termos de troca de comando nas companhias abertas. Do começo de janeiro até a penúltima semana de dezembro, o IM Business contou ao menos 28 empresas brasileiras com ações na Bolsa que anunciaram novos CEOs. A lista contém companhias de diferentes tamanhos e setores, incluindo alguns casos emblemáticos de conflitos societários e de recuperação judicial. Algumas mudanças resultam de planos de sucessão bem amarrados, mas outras foram consideradas precoces e abruptas, surpreendendo investidores.
“Foi no ano de 2023 que o ciclo de alta de juros do Banco Central teve mais impacto negativo sobre as empresas”, afirma Flávio Conde, analista da Levante Ideias de Investimentos, relacionando a dança das cadeiras no alto comando das companhias com um cenário macroeconômico ainda conturbado. A taxa Selic subiu para 13,75% em agosto de 2022 e permaneceu nesse patamar até junho último, afetando, sobretudo, as dívidas das companhias. “Muitas empresas também tiveram receitas crescendo pouco e pressão de custos”.
Conde também vê as mudanças como resposta à demanda dos investidores por melhores resultados. “É uma evolução. Antigamente, as empresas ouviam muito menos o mercado e não estavam tão preocupadas com o resultado final. Hoje, elas mudam de CEO em resposta aos investidores, sejam controladores ou individuais”.
A pressão por melhores resultados, por exemplo, é vista como razão para a saída de Octavio de Lazari Junior da presidência do Bradesco, onde, tradicionalmente, os CEOs permanecem no cargo até se aposentar. “Historicamente, o Bradesco é muito conservador nas mudanças. Então, fazer uma alteração de CEO sem ter uma ‘obrigação’, mostra o quanto os controladores estão insatisfeitos”, afirmou o sócio de uma gestora ao IM Business quando a troca foi anunciada.
O Bradesco está com dificuldades para alcançar o desempenho de seu principal concorrente privado, o Itaú, e o do Banco do Brasil. No terceiro trimestre de 2023, o retorno sobre patrimônio líquido (ROE) da instituição financeira ficou em 11,3%. Ainda que tenha apresentado melhora, a rentabilidade ainda está bem distante dos 21,1% do Itaú e de 21,3% do BB.
O sucessor de Lazari, Marcelo de Araújo Noronha, era vice-presidente responsável pela área de varejo do Bradesco. Profissional com 38 anos de experiência no setor financeiro, está há 20 anos no banco e foi uma recomendação do comitê de nomeação e sucessão da instituição.
Continua depois da publicidade
Após a saída de Lazari Junior da presidência, outros executivos do banco também deixaram seus cargos. O Bradesco se prepara para apresentar um plano de reestruturação no próximo mês de fevereiro.
Na Alpargatas, o conselho de administração escolheu Liel Miranda, da Mondelez Brasil, para ocupar a posição de presidente da companhia. Ele substituirá Luiz Fernando Edmond, que ocupava ocupava o cargo interinamente desde que Roberto Funari anunciou sua saída em abril, também em meio à pressão do mercado por resultados melhores.
Na avaliação de analistas do Citi, a Alpargatas não só precisa reduzir seu portfólio de produtos complexo, mas também revisar estruturalmente seu planejamento de vendas e operações, entre outras ações. Para o Bradesco BBI, com a chegada de Miranda e outras mudanças no quadro de executivos, 2024 deve ser um ano chave para a “inversão de marcha operacional” da companhia.
Continua depois da publicidade
Empresas em RJ também mudaram de comando
Na Light, o conselho de administração decidiu substituir Octavio Pereira Lopes pelo até então diretor de regulação e relações institucionais da empresa, Alexandre Nogueira, que também tem no currículo uma experiência de 22 anos na Energisa. Ele deveria assumir o comando da Light no próximo dia 31 de dezembro. Porém, reunião extraordinária do conselho, realizada no dia 28, decidiu que Nogueira assumirá a presidência do board. Assim, Carlos Vinícius de Sá Roriz será o novo CEO.
Foi na gestão de Octavio Pereira Lopes que a Light entrou com pedido de recuperação judicial por meio da holding. Os problemas financeiros, porém, estão na distribuidora de energia, que, pela lei brasileira, não poderia recorrer a um processo de recuperação judicial. A decisão é questionada na Justiça por debenturistas. Em meio ao imbróglio, o empresário Nelson Tanure ampliou sua posição na companhia, tornando-se o maior acionista da Light e, dessa forma, o principal interlocutor junto aos credores.
A recuperação judicial também motivou uma troca de comando na Americanas, que começou 2023 com Sergio Rial na cadeira de CEO. Por 20 anos, o assento foi ocupado por Miguel Gutierrez. A permanência de Rial, por sua vez, durou menos de duas semanas. O executivo escancarou o rombo bilionário nas contas da varejista e logo deixou o cargo. Em fevereiro, o conselho de administração da Americanas elegeu Leonardo Coelho Pereira, um especialista em reestruturação financeira, ao cargo de CEO. E foi sob sua gestão que a companhia conseguiu aprovar um plano de recuperação judicial junto aos seus credores.
Continua depois da publicidade
O caso Americanas adicionou complexidade ao cenário já conturbado das varejistas brasileiras que, alavancadas, sentiram em cheio o momento de juros altos e endividamento das famílias. Foi nesse contexto que Renato Franklin assumiu o comando da Via que, alguns meses depois, voltou a se chamar Casas Bahia. Franklin assumiu o lugar de Renato Fulcherberger com a missão de conduzir um duro ajuste na companhia, que incluiu fechamento de lojas, redução de despesas com pessoal e readequação de estoques para liberar recursos para o caixa.
Renato Franklin era CEO da Movida e, ao deixar o cargo, o comando da locadora de veículos do grupo Simpar passou para Gustavo Moscatelli, até então CFO da empresa.
Passagem relâmpago
O ano de 2023 também marcou a substituição de outros CEOs que ficaram pouquíssimo tempo no cargo. Na Gafisa, Henrique Blecher foi diretor-presidente por apenas quatro meses: de setembro do ano passado, com a compra da incorporadora Bait, da qual era sócio, até janeiro último, quando foi substituído por Sheyla Resende, primeira mulher a assumir o comando da companhia. A troca coincidiu com a conclusão do plano de integração de aquisições da Gafisa e, segundo a empresa, ocorreu em comum acordo.
Continua depois da publicidade
Elton Carluci também teve um curto mandato como CEO da Qualicorp: chegou ao cargo em janeiro e, em 31 de julho, foi substituído por Mauricio Lopes, executivo com passagens pela Rede D’Or e SulAmérica. Foi uma decisão que surpreendeu parte do mercado, porém planejada: o conselho da Qualicorp queria um nome técnico com boa interlocução no setor de saúde suplementar. Segundo a companhia, ao anunciar a troca de comando, a substituição está alinhada com uma mudança transformacional de foco.
Ruptura com o passado?
Executivos em posições mais longevas também deixaram o cargo em 2023. Foi o caso de Marcelo Magalhães, CEO da PetroReconcavo por 16 anos e que deixa o cargo e no próximo dia 1º de fevereiro. Também de Harry Shmelzer Júnior, 16 anos no cargo de CEO da WEG, e que será substituído por Alberto Kuba, atual diretor-superintendente da divisão de motores elétricos industriais.
A Pague Menos, por sua vez, rompeu com a tradição de ter membros da família fundadora da companhia no cargo de CEO e anunciou Jonas Marques como diretor-presidente. O executivo do mercado vai assumir a cadeira a partir de 4 de janeiro. Pela primeira vez em 42 anos, a empresa não será comandada por um membro da família Queirós.
Outras mudanças de comando anunciadas em 2023
- Cosan: Nelson Gomes assume o cargo de CEO partir de 1º de janeiro. A mudança foi anunciada no último mês de novembro. Gomes era CEO da Compass, subsidiária da Cosan, e vai substituir Luis Henrique Guimarães.
- Porto: Paulo Kakinoff, ex-CEO da Gol, será presidente da companhia de seguros a partir do próximo dia 2 de janeiro. Ele já integrava o conselho de administração da Porto desde 2020 e substituirá Roberto Santos no cargo de diretor-presidente.
- Dasa: Dasa: Lício Cintra, ex-executivo da Hapvida, assume o cargo de CEO a partir de 1º de fevereiro de 2024. A princípio ele contará com o apoio do atual diretor-presidente, Pedro de Godoy Bueno, que passará a se dedicar exclusivamente ao conselho de administração da companhia a partir de 2025.
- Mater Dei: José Henrique Salvador será o novo diretor-presidente a partir do próximo mês de abril. Ele é filho do atual CEO, Henrique Salvador, e sua condução ao cargo marca a terceira geração da família no comando da empresa.
- JHSF: O CEO Thiago Alonso de Oliveira deixará o cargo em fevereiro para assumir a presidência da JHSF UK e concentrar atuação na expansão da empresa em mercados internacionais. Em seu lugar, assume Augusto Martins, atual CEO da JHSF Capital, gestora do grupo.
- BB Seguridade: Ulisses Christian Silva Assis renunciou ao cargo de CEO para “buscar novos desafios profissionais na iniciativa privada”. André Borba Assumpção Huai foi indicado pelo governo federal, acionista controlador da seguradora, para completar o mandato de Assis até 2025. Rafael Sperendio, diretor de finanças e relações com investidores, vai acumular a função de CEO interinamente até Huai assumir a posição.
- Marcopolo: André Armaganijan assumiu o comando da fabricante de ônibus em abril deste ano. Ex-diretor de operações internacionais, substituiu James Bellini, filho do fundador da companhia. Bellini passou para a ocupar a presidência do conselho de administração da companhia.
- Guararapes: André Michel Farber deixou a presidência da Dafiti para assumir o cargo de CEO da dona da Riachuelo em maio deste ano. Ele substituiu Oswaldo Aparecido Nunes, que estava há 50 anos na varejista de moda e há cinco como diretor-presidente.
- Multiplan: José Isaac Peres passou o bastão para o seu filho, Eduardo Peres, após 50 anos à frente da administradora de shopping centers, em um momento de alta ocupação no setor.
- Ambipar: Tércio Borlenghi Júnior retornou ao cargo de CEO em junho deste ano. A volta do acionista controlador ao comando da empresa foi acompanhada por cinco trocas na diretoria-executiva. Sob a nova gestão de Tércio, a Ambipar emplacou um follow-on de R$ 560 milhões.
- Marisa: João Pinheiro Nogueira Batisa assumiu o comando da companhia em fevereiro, após quatro troca de CEOs em menos de um ano. O executivo é um crítico ferrenho das varejistas de moda chinesa e tem conduzido um plano de remodelagem da empresa, com o fechamento de lojas.
- BMG: BMG: Luis Felix Cardamone ocupa o cargo de CEO do banco desde março deste ano e vem apostando no crescimento do crédito consignado dentro da instituição financeira. Sua gestão também tem sido marcada pela renovação da diretoria-executiva, corte de pessoal e redução de gastos, para buscar maior rentabilidade.
- Portobello: John Suzuki, ex-diretor vice-presidente de finanças e de relações com investidores, assumiu a posição de CEO da empresa em maio deste ano.
- ClearSale: Também em maio, Eduardo Mônaco substituiu Bernardo Lustosa no cargo de diretor-presidente da empresa, especializada em ferramentas antifraude.
- Westwing: O fundador Andres Mutschler renunciou ao cargo de CEO no final de junho, afirmando ter se retirado para tocar projetos pessoais. A renúncia ocorreu antes de assembleia que destituiu o conselho de administração da companhia. Desde então o cargo é ocupado interinamente por Marcelo Kenji, CFO e DRI da varejista.
- Getninjas: Eduardo L’Hotellier, fundador da empresa, perdeu o posto de CEO e foi substituído por Leonardo Meneses, executivo indicado pela Reag Investimentos. A gestora, que se tornou maior acionista da companhia, lançou uma oferta pública de aquisição (OPA) para comprar todas as ações da Getninjas.