PetroReconcavo avança receita em gás natural e se posiciona como consolidadora entre ‘junior oils’

Petroleira afirma ainda que segue em negociação com a Petrobras para operar Polo Bahia Terra, em deal que se arrasta desde o ano passado

Rikardy Tooge

Publicidade

O gás natural garantiu fôlego extra à PetroReconcavo (RECV3) em um momento em que os preços do petróleo recuam no mercado internacional. O barril tipo Brent já devolveu a valorização provocada  pela guerra na Ucrânia e, em um ano, acumula queda de 10%. A despeito desse movimento de preços, a petroleira baiana manteve praticamente estável sua receita no primeiro semestre, graças ao avanço do peso do gás em sua estratégia. A receita recorrente vinda dos contratos de fornecimento do produto  fez, inclusive, a empresa diminuir seu hedge com petróleo, oferecendo mais flexibilidade para aproveitar as oportunidades de mercado da commodity.

A PetroReconcavo surfa na tese do gás desde o início do ano passado, na esteira das mudanças regulatórias promovidas pelo governo federal. A petroleira independente fechou importantes contratos de fornecimento de gás natural para as principais concessionárias do Nordeste, como a Bahiagás, Potigás, Sergás, PBGás, Cegás e Copergás.

“Basicamente, nós só não fornecemos para a concessionária do Maranhão. Temos uma clientela muito relevante. Além disso, conseguimos novos contratos, de prazos longos e com uma banda no preço do Brent que nos dá previsibilidade de caixa”, explica Marcelo Magalhães, CEO da PetroReconcavo, ao IM Business. Além das empresas estaduais, a PetroReconcavo fornece gás para Unigel, TAG, Shell, entre outras.

No fim do primeiro semestre, a receita líquida da companhia com gás natural avançou 4% em relação ao ano passado, para R$ 537,4 milhões. Vale destacar que o produto tem relação direta com o preço do petróleo, o que dá ainda mais relevância ao resultado, lembra Magalhães. O desempenho poderia ter sido ainda maior, caso a empresa não tivesse enfrentado problemas de processamento no Rio Grande do Norte, o que a fez deixar de ganhar cerca de R$ 48 milhões no período. Essas dificuldades já foram superadas.

“A queda nos preços do Brent, combinada com limitações no Polo Potiguar, que geraram custos de produção e pagamentos de royalties, mas sem receitas, foram parcialmente compensadas por um aumento da produção que deu o tom do último trimestre”, indicaram os analistas Monique Greco, Eric de Mello e Bruna Amorim, do Itaú BBA.

Hedge perde espaço

Com o avanço nas receitas recorrentes do gás, a companhia vem reduzindo seus hedges com petróleo. Na comparação entre o segundo trimestre de 2022 e o deste ano, a proteção de preços diminuiu 49,8%, de 3,8 milhões de barris “hedgeados” para 1,9 milhão. “O hedge foi muito importante no nosso ciclo de investimentos de 2019 e, mais ainda, no início da pandemia. Mas o hedge tem um custo muito alto aqui no Brasil e não pretendemos ‘hedgear’ neste momento em que temos essa estabilidade no preço do gás”, avalia o executivo.

Continua depois da publicidade

Nesse sentido, o Itaú BBA lembrou que a estratégia de hedge não foi muito positiva para a PetroReconcavo no último trimestre, em que a petroleira registrou perdas de R$ 60 milhões no Ebitda ajustado.

Outro reforço a essa percepção está na estimativa da companhia de que os preços do petróleo não deverão oscilar tanto quanto nos últimos anos, o que permite negociar o produto mais “a mercado”.

“Nós devemos ter um patamar de preços do petróleo que vai viabilizar nosso programa de investimento. Temos uma transição energética em curso, mas ainda haverá demanda para o petróleo”, acrescenta Magalhães. Ele estima que o preço vai variar dentro de uma banda entre US$ 65 e US$ 85 nos próximos trimestres. “Podem existir alguns picos, mas esta é uma banda que nos permite continuar a crescer e investir.”

Continua depois da publicidade

Bahia Terra e consolidação

Em outra frente, o mercado segue à espera de novidades em relação ao Polo Bahia Terra, um bloco maduro no qual  a Petrobras (PETR4) chegou a anunciar um acordo inicial de venda a um consórcio formado por PetroReconcavo e Eneva ([ativo=ENEV4]), em maio do ano passado. No entanto, com a mudança de governo e a consequente revisão da política de venda de ativos da Petrobras, o negócio esfriou, com sinalizações de Jean Paul Prates, CEO da estatal, de que a venda do Bahia Terra não deverá ocorrer.

Mas Marcelo Magalhães demonstra otimismo nas conversas com a Petrobras. O CEO da PetroReconcavo reconhece que a transação não deverá ocorrer da forma inicialmente prevista, mas afirma que há negociações em curso para que o consórcio possa fazer uma parceria estratégica com a estatal ou com a compra de uma fatia minoritária.

Marcelo Magalhães, CEO da PetroReconcavo: negociações com a Petrobras seguem em curso (Divulgação)

“Aventou-se a possibilidade de uma parceria e estamos em conversas preliminares sobre isso. Mas elas têm ocorrido e creio que [a parceria estratégica] faz sentido para Petrobras, para a PetroReconcavo e para a Bahia”, diz o executivo. “Estamos flexíveis para negociar, as petroleiras independentes conseguem gerar renda e possuem expertise para atuar em conjunto com a Petrobras. Estamos muito animados com a possibilidade.”

Continua depois da publicidade

A política de desinvestimentos da Petrobras permitiu o crescimento das petroleiras independentes (também conhecidas como “junior oils”), como a própria PetroReconcavo, PRIO (PRIO3) e 3R Petroleum (RRRP3). No entanto, com a mudança de política de ativos da estatal, a tendência é que as vendas de blocos de exploração maduros desacelerem, fechando uma avenida de crescimento relevante para a petroleiras juniores, lembra um relatório recente publicado pelo Morgan Stanley.

“Um gatilho importante continua sendo o crescimento via M&A, embora as opções no mercado sejam atualmente escassas, já que a Petrobras não está mais buscando a venda do restante de seus ativos onshore maduros”, apontaram os analistas Bruno Montanari e Thiago Casqueiro, do Morgan Stanley.

Magalhães projeta que ainda há espaço para todas as empresas obterem crescimento orgânico com o aumento de escala e eficiência na extração de petróleo. “Mas eu acredito que daqui alguns semestres há uma possibilidade grande de consolidação do mercado. E, naturalmente, nós acreditamos ter os pré-requisitos para ser uma das consolidadoras”, avalia o CEO.

Continua depois da publicidade

“Não por sermos a mais antiga, mas também uma das mais eficientes e lucrativas. São qualidades que nos credenciam para sermos consolidadores, uma vez que esse tipo de transação começar.” A última aquisição da PetroReconcavo ocorreu no ano passado, quando comprou os ativos da Maha Energy, que atuava em um campo vizinho ao seu na Bahia, por US$ 138 milhões.

Para a XP, o último trimestre reportado pela companhia, com lucro líquido de R$ 178 milhões, foi considerado positivo e um sinal de que a empresa deverá melhorar seus resultados à frente e poderá dar tração ao plano de consolidar o setor. “A alavancagem [0,53 vez a dívida líquida pelo Ebitda] está controlada e vemos a empresa bem posicionada para o processo de consolidação que acreditamos deva ocorrer no mercado onshore brasileiro de óleo e gás”, escreveram os analistas André Vidal e Helena Kelm.

Verticalização

Outro ponto de eficiência, na visão do CEO da PetroReconcavo, foram os investimentos na verticalização da operação. A empresa ampliou em 20% sua frota de exploração, como sondas, unidades de bombeio e estimulação – equipamentos que demandam muito capital. O capex da empresa no segundo trimestre foi de R$ 295 milhões.

Continua depois da publicidade

“No momento em que temos diversas petroleiras independentes, todas buscando expandir seus negócios em um mercado com poucos prestadores de serviços, nós ganhamos autonomia. Eu diria que nenhuma outra tem essa independência para desenvolver seu trabalho. Além disso, temos uma questão de eficiência de custos que faz muita diferença”, completa Marcelo Magalhães.

Sonda adquirida no Canada pela PetroReconcavo: equipamento deve entrar em operação daqui algumas semanas (Divulgação)

O research da XP vê que os investimentos deverão seguir como detratores da geração de caixa nos próximos trimestres. Ainda assim, a casa manteve sua recomendação de compra para o papel. Para o Morgan Stanley, a estratégia de verticalização tem sido acertada, uma vez que, quando a PetroRecôncavo buscou a terceirização, houve problemas com eficiência e produtividade. Mas o banco tem recomendação neutra para a ação.

“A administração pintou um quadro positivo para produção, custos e capex no segundo semestre do ano, que, se entregues, podem se mostrar fortes catalisadores. Mas, a julgar pela reação das ações, acreditamos que os investidores provavelmente não pagarão antecipadamente, o que concordamos”, completa o Morgan Stanley. No ano, os papéis da PetroReconcavo recuam 29,7%.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br