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Novas fábricas de fertilizantes no Brasil podem reduzir descompasso global de oferta

Produtores de soja no Brasil têm postergado aquisições, aguardando períodos mais próximos à janela de aplicação dos insumos

Suzana Liskauskas

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O mercado global de fertilizantes tem assistido a movimentos atípicos, como a restrição da oferta de fosfatados (com concentração de fósforo). As flutuações eram esperadas em função de gargalos logísticos, mas não havia a previsão de escassez na produção global. Parte dessa limitação tem origem na China, um dos principais produtores globais do produto. Com prioridade para abastecer o mercado doméstico, as exportações chinesas têm sido restritas no mercado externo.

Levantamento feito pela Argus, especializada em relatórios e análises de preços para o mercado de combustíveis, agricultura, fertilizantes, gás natural e petroquímica, aponta que as restrições na oferta de fosfatados pela China devem ficar mais frequentes. Com a diminuição da oferta do fertilizante chinês, o preço do insumo tende a subir no mercado global. E o Brasil – que não é autossuficiente na produção de fosfatados – é impactado pelo comportamento do mercado nos Estados Unidos.

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“A disponibilidade reduzida de fosfatados nos EUA fez com que compradores adquirissem mais TSP, um fertilizante à base de fosfato que não é amplamente utilizado no país. A disponibilidade de TSP também é restrita no Brasil. Com a produção da China mais frequentemente voltada para o mercado doméstico, o volume do fertilizante chinês disponível para o Brasil diminuiu”, observa Renata Cardarelli, especialista em Agricultura e Fertilizantes da Argus.

Chapadão do céu – GO. Aplicação de herbicida, fertilizante. Agricultura de precisão. Agro 4.0. Foto: Wenderson Araujo/Trilux

Soma-se a esse cenário o aumento da demanda por fosfatados no Brasil. Havia uma expectativa, segundo dados coletados pela Argus, de que o preço dos fertilizantes fosfatados diminuísse em função da oferta da produção chinesa. Como esse movimento não se concretizou, o preço do insumo subiu no mercado, provocando mudanças também para os produtores rurais no Brasil.

Segundo Cardarelli, há uma procura muito grande por fosfatados no mercado brasileiro no pré-plantio da safra de soja. Por outro lado, as restrições de oferta da produção chinesa e a manutenção dos preços do insumo russo têm impactado o comportamento de compra dos agricultores brasileiros.

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“Nos últimos anos, temos observado os agricultores brasileiros postergarem a decisão de compra, deixando para adquirir o produto mais perto da janela de aplicação. Eles esperam o preço do fosfatado baixar e uma melhor cotação da oleaginosa”, diz Cardarelli.

Produção com hidrogênio verde

A produção brasileira de fertilizantes tende a se transformar até 2030, com a entrada em operação de fábricas da Petrobras (PETR4) e inauguração de outras plantas com investimento privado. No início do ano, a Atlas Agro deu mais um passo para a construção da fábrica de fertilizantes nitrogenados a partir do hidrogênio verde, em uma área que ultrapassa 1 milhão de metros quadrados no Distrito Industrial 3 de Uberaba (MG). 

Projeção de nova fábrica de fertilizantes da Atlas Agro, em Uberaba (MG). Crédito: Divulgação

Com investimento total de R$ 4,3 bilhões, a fábrica deve entrar em operação entre o fim de 2028 e início de 2029, e tem potencial para reduzir em 2,5% a dependência de importação total de fertilizantes do Brasil. A expectativa é de que a nova fábrica gere cerca de dois mil empregos na fase de construção, com duração de 36 meses. A partir do início da operação, a previsão da Atlas Agro é criar cerca de 540 empregos diretos e indiretos.

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Entre fevereiro e junho, a Atlas Agro finalizou a primeira fase do projeto de engenharia e construção, que incluiu a contratação de dois consórcios. Nos próximos 12 meses, será desenvolvido o projeto executivo de engenharia (FEED), e as construções devem ser iniciadas em segundo semestre de 2025.

A meta, segundo a Atlas Agro, é produzir 500 mil toneladas por ano de fertilizantes nitrogenados. Toda a produção será destinada ao mercado doméstico, portanto, não há planos para exportar parte da produção.

“A nossa planta em Uberaba vai ser a primeira fábrica de fertilizante nitrogenado com 100% de produção a partir do hidrogênio verde no Brasil”, afirma Rodrigo Santana, diretor de operações da Atlas Agro.

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Santana observa que a produção atual de fertilizantes nitrogenados utiliza hidrogênio, porém de origem fóssil, elaborado a partir do gás natural e carvão. A inovação será possível pelo uso de eletrolisadores mais potentes. Esses dispostivos permitem quebrar as moléculas da água em átomos de oxigênio e hidrogênio.

Rodrigo Santana, diretor de operações da Atlas Agro. Crédito: Divulgação

“Substituiremos o hidrogênio cinza pelo hidrogênio verde, a partir da eletrólise da água. O processo já existe há algumas décadas. A grande diferença agora é que, com a capacidade maior dos eletrolisadores, há um ganho enorme de competividade da tecnologia”, ressalta.

O Brasil importa 95% dos fertilizantes nitrogenados e, com a guerra entre Rússia e Ucrânia, houve uma pressão ainda maior dos produtores rurais brasileiros, pois havia uma enorme preocupação de não haver fertilizante para a agricultura, diz Santana. Esse contexto favorece o desenvolvimento de uma indústria local de fertilizantes verdes e amônia verde.

A Atlas Agro tem trabalhado de forma muito próxima com agentes do governo pelo desenvolvimento do plano nacional de fertilizantes. Santana ressalta que essa política pública é importante para deve reduzir a dependência de produtos importados na área de fertilizantes.

A criação do Programa de Desenvolvimento da Indústria de Fertilizantes (Profert), pelo Projeto de Lei nº 699/2023, deve trazer um arcabouço legal para o mercado de fertilizantes nitrogenados no Brasil. “Pode viabilizar grandes investimentos na neoindustrilização brasileira, sobretudo com novas fábricas de fertilizantes nitrogenados a partir do hidrogênio verde”, afirma.

Aprovada no Senado, em março, a criação do Profert está sob análise na Câmara dos Deputados. Para Santana, o tema deveria ter aprovação em regime de urgência, porque estimula a construção de novas fábricas no Brasil.

Há duas semanas, o Senado aprovou o marco legal do hidrogênio verde, e esta semana foi aprovado na câmara. O texto segue agora para sanção presidencial. “O marco legal é um passo para trazer segurança e previsibilidade aos investimentos no Brasil. Vai ampliar a produção e o uso do hidrogênio verde (H2V) no Brasil, promovendo o desenvolvimento para a consolidação desse mercado no território nacional”, observa Santana.

Petrobras reativa produção de nitrogenados

Em abril deste ano, a Petrobras anunciou a reativação da fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados S/A – ANSA, no Paraná. A reabertura faz parte do plano estratégico 2024-2028 da Petrobras e do Plano Nacional de Fertilizantes. O Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes do mundo e importa 85% do total utilizado internamente.

Segundo estimativa da Federação Única dos Petroleiros (FUP), a partir da reabertura da fábrica de fertilizantes no Paraná, da retomada das plantas para produção do insumo na Bahia e em Sergipe e da conclusão das obras da fábrica em Mato Grosso do Sul, será possível reduzir para 35% as importações do insumo agrícola.

Em operação desde 1982, a fábrica de fertilizantes do PR entrou no plano de desinvestimento da Petrobras em 2019, no governo Bolsonaro. A unidade chegou a ser responsável pela produção de 30% do mercado brasileiro de ureia e amônia, além de produzir 65% do Agente Redutor Líquido Automotivo (ARLA 32), aditivo para veículos de grande porte que atua na redução de emissões atmosféricas.

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