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Greves no setor público causam perdas bilionárias a empresas e setores inteiros

Ao menos 15 categorias de funcionalismo têm movimentos em torno de reivindicações

Estadão Conteúdo

Fachada da Escola Paulista de Medicina da Unifesp, durante greve nacional por reajuste salarial (Rovena Rosa/Agência Brasil)
Fachada da Escola Paulista de Medicina da Unifesp, durante greve nacional por reajuste salarial (Rovena Rosa/Agência Brasil)

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Empresas de setores variados têm contabilizado perdas por conta de paralisações de carreiras ligadas ao setor público — e que, no caso do petróleo, já ultrapassam os R$ 2,2 bilhões. Há pelo menos 15 categorias de funcionalismo atualmente com movimentos em torno de reivindicações.

Com negociações simultâneas com o governo há meses, algumas demandas foram atendidas, porém, continuam sem acordos funcionários ligados a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), CGU (Controladoria Geral da União), Tesouro Nacional, Susep (Superintendência de Seguros Privados), Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), e profissionais da educação, entre outras.

Sem renovações e novas licenças de instalação e operação das autoridades ambientais há mais de 120 dias, o setor de petróleo e gás contabiliza perdas de cerca de R$ 2,250 bilhões, segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP). Roberto Ardenghy, presidente da entidade, diz que as empresas da área vêm deixando de produzir 40 mil barris de petróleo diariamente por conta da operação do Ibama, o que impacta não só os negócios como também a balança comercial, o PIB e a arrecadação de tributos, uma vez que deixam de ser recolhidos royalties sobre a extração dos insumos. O valor aumenta a cada dia.

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O volume de produção não será compensado posteriormente, afirma ele, uma vez que é impossível aumentar a capacidade de extração diária. “Uma das nossas associadas teve de devolver uma sonda que veio do exterior porque estava sem licença de produção e demitiu 20 funcionários, já que o equipamento só poderá voltar daqui a um ano”, diz Ardenghy. “O processo só se agrava à medida que o tempo passa porque as empresas são obrigadas a postergar decisões de investimentos.”

Além do impacto na atividade em si, o setor também vem sendo afetado por atrasos em pesquisas feitas por universidades públicas. Por lei, as empresas de óleo e gás têm de investir 1% do lucro bruto em desenvolvimento de novas tecnologias, o equivalente a US$ 2 bilhões anuais, que chegam a 148 universidades. “É um crime que esteja tudo parado”, diz ele.

Outras atividades, como mineração e energia também têm sido afetadas pela paralisação de atividades de campo do Ibama. Segundo a Ascema Nacional (Associação Nacional dos Servidores Especialistas em Meio Ambiente), o número de licenças concedidas, que somou 180 no primeiro quadrimestre do ano passado, está em 69 no mesmo período de 2024. Apenas no setor elétrico, foram afetados quatro processos de termoelétricas que somam 5.970 MW de capacidade e 3 eólicas que somam 934,8 MW, entre outros.

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Também tiveram análises e emissões de autorizações interrompidas projetos ligados à mineração. Mas, segundo o Ibram, que representa as mineradoras, não houve reclamação dos associados.

Segundo a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) há hoje 30 mil veículos aguardando liberação ambiental em portos. Além de atrasar entregas de carros no mercado nacional, principalmente vindos da Argentina e da China, o movimento tem afetado também parte das exportações. Para a entidade, as empresas do setor acabam se adaptando ao ritmo mais lento de liberação. O processo, que levava entre 15 e 20 dias, aumentou para 60 dias, segundo a Ascema Nacional.

A paralisação acontece, porém, pouco antes do aumento de carga tributária para veículos híbridos e elétricos importados, previsto para julho. Montadoras, principalmente chinesas, organizaram-se para trazer um volume maior de carros ao país, antes da majoração da alíquota e não têm conseguido internalizar os veículos.

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Nos sindicatos

O impacto pode escalar, caso o movimento radicalize em categorias que hoje fazem apenas paralisações, diz Rudinei Marques, presidente Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado), que reúne 36 entidades, das quais 22 de âmbito federal. “Ainda não há acordo para os fiscais agropecuários, que respondem por toda fiscalização sanitária do agronegócio e cujo movimento pode escalar, por exemplo”, diz Marques. “A situação no Tesouro também pode comprometer a vida do governo, já que em junho há transferência de emendas parlamentares a municípios no valor de R$ 8 bilhões.” Com isso, diz ele, fazer o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) em agosto se tornaria impraticável.

Sem reajustes há seis anos, os servidores foram estimulados às paralisações pelo próprio presidente Lula, diz Marques. “O reajuste emergencial de um terço dos salários que conseguimos nesta gestão foi completamente insuficiente para estancar as perdas”, afirma. “O presidente Lula disse para fazermos paralisações para pressionarmos por condições melhores e é o que estamos fazendo.”

Segundo Marques, a entidade está acostumada às negociações travadas por questões ligadas à responsabilidade fiscal. Porém, o governo tem tido uma postura “perdida”, diz ele, por ter mudado três vezes a estratégia de negociação. A mais recente consiste em mesas de negociação com cada uma das categorias. Foram 20 mesas de setembro para cá, algumas das quais ainda sem conclusão. “Há mais 60 mesas requeridas, que eles esperam encerrar até julho”, diz. “Isso não vai acontecer.”

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No meio ambiente

A paralisação de atividades de campo do Ibama, responsável pelas maiores perdas corporativas até agora, tem ainda impactos não contabilizados no meio ambiente. Os autos de infração na Amazônia Legal caíram 82% e as atividades de prevenção de incêndios e catástrofes naturais estão praticamente sem ser realizadas. “A retomada do protagonismo brasileiro na pauta ambiental não se refletiu na valorização dos servidores da área”, diz Binho Zavaski, presidente da Ascema Nacional.

As demandas da categoria, praticamente destruída na gestão Bolsonaro, diz ele, vão bem além de aumento de salário. Os funcionários querem a reestruturação da carreira, com a parametrização aos funcionários da Agência Nacional de Águas (ANA), redução do fosso salarial entre cargos, reivindicação de atividades de risco para áreas conflagradas e inclusão das carreiras na lei de fronteiras. Também a recomposição dos quadros das entidades, que hoje têm 45% dos postos em aberto.

Atualmente, as entidades trabalham numa contraproposta ao que foi oferecido pelo governo. “Esperamos haver uma saída negociada com governo sem paralisação geral, o que seria cenário muito ruim”, afirma.

Sergio Lazzarini, professor do Insper e especialista em estratégia e organização no setor público, diz que uma boa alternativa às negociações seria avançar em discussões além da recomposição salarial. Incluir nos debates avaliações de desempenho e qualidade de serviços prestados, como determina a Constituição. Algo que jamais foi regulado. “Há várias iniciativas que poderiam caminhar no sentido da construção de um Estado mais moderno”, diz ele. “Esse poderia ser um bom momento para trazer essa pauta à mesa.”

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