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Como o Starbucks desvalorizou sua própria marca

Por que a rede de cafeterias já não representa o que representou no passado

B. Joseph Pine II e Louis-Étienne Dubois Harvard Business Review

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O Starbucks está enfrentando problemas novamente. Em seu último relatório de lucros trimestrais, a empresa divulgou resultados decepcionantes, com uma queda de 4% nas vendas de lojas abertas há pelo menos um ano (11% na China, seu segundo maior mercado). Após a divulgação, suas ações despencaram. E o seu fundador e três vezes CEO, Howard Schultz, mais uma vez postou uma missiva no LinkedIn, apelando aos atuais líderes do Starbucks para que redescubram e abracem o propósito central da empresa, sua razão de existir.

A carta aberta de Schultz, que veio na esteira de uma anterior divulgada em fevereiro, reflete amplamente os crescentes sentimentos de muitos clientes de longa data: ir ao Starbucks não é mais como era, e a marca também já não mais representa o que representou no passado. O problema fundamental: o Starbucks vem se comoditizando.

Logotipo da Starbucks em uma loja em Los Angeles, EUA (REUTERS/Lucy Nicholson)


Neste artigo, argumentamos que a empresa deveria voltar seu foco para a experiência pessoal e sugerimos formas pelas quais ela pode fazer isso. Seus problemas ilustram como empresas que foram bem-sucedidas em oferecer experiências excepcionais aos clientes podem ceder à tentação de buscar objetivos como eficiência e volume, acabando por se comoditizar no processo. Nossas recomendações abordam como aqueles que se perderam pelo caminho podem retomar o rumo certo.

Autocomoditização



O termo “terceiro lugar” (cunhado pelo sociólogo Ray Oldenburg), que Schultz aplica há muito tempo ao Starbucks, significa “um lugar além de casa e do trabalho em que as pessoas podem se reunir, relaxar e conversar”. No entanto, ao longo da última década, as cadeiras confortáveis praticamente desapareceram, dando lugar a cadeiras de madeira dura, que são melhores para incentivar as pessoas a retornarem mais rapidamente para suas casas e escritórios. A empresa também transformou a busca por tomadas elétricas para conectar computadores ou telefones em uma verdadeira caça ao tesouro.

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Pedidos impressos substituíram os escritos manualmente nos copos, o que eliminou o toque pessoal de suas famosas bebidas artesanais. O rico aroma dos grãos de café torrados e moídos desapareceu; em seu lugar ficaram embalagens lacradas prontas para uso. E, em junho de 2024, a empresa anunciou que iria oferecer refeições promocionais. Pelo amor de Deus!

O alardeado programa de fidelidade do Starbucks também está passando por um processo de autocomoditização. Apesar do aumento geral nas vendas, seu acompanhamento das compras faz com que os clientes foquem mais no preço do que estão comprando do que no valor daquilo que bebem, comem e vivenciam.

Loja do Starbucks operada pela SouthRock Capital (Divulgação)


Há algum tempo, a empresa introduziu drive-thrus em muitos de seus endereços suburbanos, o que também impulsionou as vendas, mas diminuiu a experiência dentro das lojas. Isso dividiu a atenção dos baristas, aumentou o tempo de serviço e ocupou espaço que poderia ser mais bem aproveitado para aprimorar a experiência presencial.

Pedidos feitos para viagem colocam você e seu pedido em uma fila invisível, cuja duração é indeterminada e, às vezes, parece interminável. Você acaba se deparando com compradores de conveniência que entram e saem, ouvindo e vendo-os durante todo o tempo em que tenta aproveitar ao máximo seu momento longe de casa e do trabalho. E agora algumas lojas do Starbucks removeram todas as cadeiras – tanto as confortáveis quanto as rígidas – para se concentrarem nos pedidos para viagem.

Paralelamente, a empresa tem enfrentado tensões cada vez maiores em sua força de trabalho e um crescente movimento rumo à sindicalização. Embora o Starbucks tenha sido consistentemente classificada como um dos melhores lugares para trabalhar, os colaboradores têm se manifestado cada vez mais sobre suas condições de trabalho, enfatizando a desconexão entre métricas de desempenho focadas em volume de vendas e aquelas voltadas para a qualidade das conexões com os clientes.

Não há dúvidas de que a empresa obteve receita e eficiência no curto prazo, mas a que custo a longo prazo se ela se transformar em uma commodity, perder sua autenticidade e diminuir o valor da experiência de se estar em um terceiro lugar? Consideramos isso uma barganha faustiana que pode agradar a Wall Street hoje, mas acabará por corroer a empresa, deixando-a em uma enorme casca de si mesma.

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Caminho de volta



Certamente ainda não é tarde para o Starbucks corrigir seu rumo, voltar a focar na experiência e se afastar da autocomoditização. Em muitos aspectos, concordamos com a avaliação de Schultz de que o caminho a seguir começa com uma análise do que tornou a empresa tão bem-sucedida.

Recapturar a autenticidade da marca significa acabar com a sensação de linha de montagem do Starbucks de hoje, permitindo que os colaboradores sejam mais uma vez atores-chave na experiência. A vivacidade que acompanha os baristas gritando pedidos e as conexões humanas que eles estabelecem são exatamente o que deu a esses lugares uma sensação de cafeteria de bairro. Tais “erros” tornaram a experiência do Starbucks autenticamente humana.

A empresa também deveria reformular seu programa de fidelidade, que se tornou uma mera comoditização, para evitar oferecer de graça bebidas e alimentos que os clientes comprariam de qualquer forma. Em vez disso, ela deveria transformar o programa em uma plataforma de experiências que dê aos clientes experiências que não teriam de outra forma.

Quase todas as empresas de cartão de crédito, companhias aéreas e empresas de hospitalidade já fizeram isso. O programa SkyMiles Experiences da Delta, por exemplo, enfatiza como “você pode transformar suas milhas em memórias”. A plataforma da Mastercard (MSCD34) oferece experiências que “não têm preço”. E o programa de fidelidade Hilton Honors incentiva os membros a utilizarem seus pontos “onde está sua paixão, com experiências em todo o mundo e em sua cidade natal que o dinheiro não pode comprar”.

o Starbucks também deve encontrar maneiras de atender às pessoas que tratam o Starbucks como um mero serviço, sem prejudicar a experiência daqueles que a consideram algo mais. Isso significa separar pedidos para viagem e os feitos por drive-thru dos pedidos feitos dentro da loja para minimizar as interações entre esses diferentes públicos. Significa também reinvestir em conforto e comodidades para quem quer passar tempo dentro da cafeteria. Na verdade, considerando-se que o trabalho remoto está se consolidando e que, desde a recente pandemia, muitas pessoas descobriram que suas casas são longe de ideais para o trabalho, nunca houve momento melhor para o Starbucks se estabelecer como um local atraente para trabalhar.

Uma maneira de fazer uma clara diferenciação entre clientes que permanecerão dentro da loja e os que fazem seus pedidos para viagem é entender que, enquanto serviços cobram pelas atividades realizadas pelos colaboradores, as experiências cobram pelo tempo que os clientes passam no local. Isso pode significar cobrar uma taxa de entrada ou de adesão ou um preço mais alto para bebidas e alimentos.

Há muitos lugares ao redor do mundo, muitas vezes chamados de “anticafés”, que cobram, por exemplo, pelo tempo que se passa socializando, jogando ou trabalhando no local – e muitas vezes oferecem café feito à máquina de graça. No entanto, não é necessário cobrar pelo espaço inteiro; você pode cobrar por áreas específicas dentro do local e pelas experiências que acontecem lá. Na verdade, o Starbucks já cobra entrada para experiências de degustação e aulas em seus locais “Reserve Roastery”, onde a experiência ainda reina suprema.

Não há dúvida de que abraçar estas ideias requer não só a estratégia certa, mas também uma liderança forte. Exceto Howard Schultz, alguém conseguiria fazer isso? Sua última carta aberta pode ser um apelo para ser convidado para voltar ao Starbucks, como já fez tantas vezes antes. Entretanto, dado que ele nem está mais no conselho da empresa, isso é altamente improvável. Mas se não for Schultz, então o Starbucks precisa de um líder com paixão, motivação e apreço semelhantes pelo valor das experiências. Alguém que valorize café e conexões, não só dólares e centavos.

HBR: ©.2024 Harvard Business School Publishing Corp./Distribuído por The New York Times Licensing Group

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