Publicidade
O cavalo de pau nas políticas de diversidade, equidade e inclusão entre algumas das maiores empresas dos Estados Unidos — em especial as de tecnologia — reforçou um cenário de cortes nestas áreas que já vinha desde 2022. Embora as operações de companhias estrangeiras no País tenham sido impactadas no período, cenário político, características demográficas e garantias legais podem sinalizar para uma postura diferente entre as empresas nacionais.
Gigantes da tecnologia como Google (GOGL34), Meta (M1TA34) e Amazon (AMZO34) foram algumas das primeiras a promoverem mudanças ou até a descontinuidade de suas políticas de DEI, sigla para diversidade, equidade e inclusão, nos Estados Unidos. Empresas como McDonald’s (MCDC34), Disney (DISB34) e Goldman Sachs (GSGI34) seguiram o mesmo caminho.
Para as big techs, o movimento representou uma brusca mudança de rotas. Em 2024, Google e Amazon lideraram um ranking de marcas mais inclusivas promovido pela Kantar e por anos foram empresas vocais sobre o tema.
Segundo a fundadora da consultoria Elas Programam, especializada na inclusão de mulheres na tecnologia, Silvia Coelho, o ecossistema de tecnologia, que fortaleceu ações do tipo entre 2018 e 2022, já vinha passando por uma transformação no Brasil.
“Vi esses programas diminuírem entre 2022, 2023, já ao fim da pandemia, por conta de uma série de questões econômicas, financeiras, de investidores nos Estados Unidos que acabaram refletindo aqui”, conta. Com menos recursos, big techs como Google e Meta cortaram orçamentos e incluíram equipes dedicadas a DEI em demissões em massa promovidas nos últimos anos.
Fator Trump
Acontece que agora, aspectos políticos e jurídicos entraram em jogo. Poucos dias após a posse de Donald Trump, em uma aproximação entre grandes executivos e a gestão do presidente americano, que chegou a dizer que acabaria com esse tipo de política.
Continua depois da publicidade
Recentemente, um tribunal dos EUA decidiu que a Nasdaq, bolsa que reúne principais empresas de tecnologia, não poderia impor regras para aumentar diversidade em empresas listadas. Em 2023, a Suprema Corte do País já havia decidido que universidades estariam proibidas de instituir programas de cotas raciais.
Brasil pode não refletir cenário internacional
No Brasil, o cenário jurídico é diferente. Garantias como as cotas raciais em universidades públicas ou a lei de cotas para pessoas com deficiência promovem maior acesso ao mercado. Em 2023, foi sancionada a Lei de Igualdade Salarial que busca garantir salários iguais para homens e mulheres no mesmo cargo.
“É algo que já faz parte da nossa consciência social e todo mundo conhece. Não acredito que haja retrocesso quanto a isso [políticas públicas de inclusão]. Acaba reverberando no mercado de trabalho também”, diz Coelho.
Continua depois da publicidade
Enquanto diversas das empresas mais mais vocais sobre o tema nos Estados Unidos começavam a reverter políticas relacionadas ao tema ESG, a Natura (NTCO3) publicou em janeiro deste ano um manifesto reforçando compromissos históricos da empresa com temas sociais e ambientais, sob o lema “Quanto vai Custar para Investir no Futuro”.
“Quando vimos esse movimento todo, começamos a nos posicionar e resolvemos reafirmar publicamente esse compromisso inegociável com a vida, com a construção desse mundo mais justo”, diz a vice-presidente de pessoas, cultura e organização da Natura América Latina, Paula Benevides ao InfoMoney.
Uma pesquisa feita pelo InfoMoney mostrou que a Natura é a empresa mais citada por investidores quando o tema é ESG.
Continua depois da publicidade
Para Benevides, a reação à mudança de rota nos Estados Unidos não deve se refletir no Brasil dados os aspectos demográficos. “Precisamos considerar que [os movimentos nos EUA] podem, sim, influenciar o comportamento de algumas empresas e as próprias políticas que eventualmente já existissem nas empresas, mas estratégias de diversidade, equidade e inclusão precisam ser baseadas em realidades sociais, culturais e econômicas do país.”
“O Brasil é um país com uma diversidade absurda, não só étnica, mas regional, de gênero, de classe social”, diz Benevides. “Como qualquer empresa do País vai ignorar essa realidade? Qualquer uma que ignorar esse contexto sociocultural econômico é uma empresa que está ignorando uma realidade de consumo no final do dia.”
Entre as ações promovidas pela Natura para aumentar diversidade e inclusão na empresa estão o compromisso com metas de contratação e equidade salarial, bem como uma área e orçamento dedicados ao tema. A companhia considera, no entanto, que a política seja transversal e esteja enraizada em todos os setores.
Continua depois da publicidade
A companhia já eliminou, por exemplo, a diferença salarial por gênero e raça, uma meta estabelecida para 2030. Em 2024, chegou a 30,8% de contratações e 26,7% das contratações para posições de liderança foram de pessoas negras.
Cátia Porto, vice-presidente executiva de Pessoas da Vale (VALE3), empresa mais valiosa do Brasil, parece ter uma visão diferente. Em publicações recentes em redes sociais, Porto afirmou que a “cultura woke está perdendo espaço” nas corporações, contrapondo políticas DEI pelo que ela chamou de MEI (Mérito, Excelência e Inteligência), publicou “O Globo“.
Envolvida em tragédias socioambientais nos casos de Mariana e Brumadinho, a Vale é a segunda empresa mais mencionada por investidores na pesquisa do InfoMoney quando o tema é ESG.