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A pergunta que se faz no mercado de aço no momento é se a China continuará em ritmo forte de exportação de produtos siderúrgicos. É que janeiro entra na reta final e o governo, via Câmara de Comércio Exterior (Camex), não sinaliza nenhum movimento para atender o pleito das siderúrgicas de adoção de uma medida de proteção contra o que consideram uma avalanche de aço importado, principalmente chinês.
A China exportou 90 milhões de toneladas e o Brasil foi o sétimo principal destino dos embarques. Entraram, de aços laminados, tomando mercados de CSN, Usiminas, Gerdau e outras produtoras locais, mais de 2,5 milhões de toneladas oriundas do país asiático, de um total de 4,4 milhões. Se somar produtos semiacabados, as usinas chinesas despacharam próximo de 3 milhões de toneladas ao Brasil – 60% do total que entrou no país.
Em evento semana passada, o presidente da Usiminas, Marcelo Chara, afirmou que a empresa pode abafar (paralisação temporária) mais um alto-forno, o de número 2, se os níveis de entrada de aço estrangeiro continuarem no mesmo ritmo. Em dezembro, a siderúrgica já havia abafado o equipamento 1. Dessa forma, passaria a operar somente com o alto-forno que passou por uma grande reforma, que custou R$ 2,7 bilhões no ano passado.
Outras siderúrgicas já haviam anunciado, em novembro e dezembro, paralisação de linhas de produção até que houvesse melhoria da demanda interna. Falaram também em adiamento de investimentos. Nessa lista estão Gerdau, ArcelorMittal Aços Longos e a fabricante de aços especiais Aperam.
Especialistas ouvidos pelo IM Business disseram que o que vai determinar se a China continua desovando material no mundo é a reação de seu mercado interno. Nos últimos anos, o setor imobiliário chinês, responsável por cerca de um terço do consumo doméstico de aço, enfrenta profunda crise. Os estímulos do governo central não foram suficientes para reativar a demanda. A expectativa está em estímulos para a economia como um todo: da construção de residências e edifícios comerciais a programas de infraestrutura e indústria, que são os grandes vetores de consumo de aço.
Em dezembro, a produção local desacelerou fortemente, sinalizando que o consumo interno se mantém muito fraco. O volume de aço bruto fabricado desabou 14,9%, para 67,4 milhões de toneladas, ante um ano atrás, conforme publicação da World Steel Association (WSA), de Bruxelas. A WSA recebe dados de 71 países produtores. Mas fica a interrogação as usinas de aço chineses votaram a produzir com força em janeiro.
Segundo dados da Administração Geral das Alfândegas da China, as exportações do país subiram 36,2% em 2023 sobre o ano anterior, embora não tenha superado os níveis de 2014-2016. Porém foi o maior nível dos últimos sete anos. O aumento acentuado dos embarques ao exterior, todavia, intensificou o risco de fricção comercial. Cinco países abriram investigações de medidas comerciais contra aço chinês no ano, conforme informações, mas as autoridades chinesas não indicaram qualquer intenção de desacelerar as vendas ao exterior.
Um especialista do setor, que preferiu não se identificar, afirmou ao IM Business: “Creio que [a decisão das usinas chineses] está mais para manutenção do patamar [de 2023] do que um aumento exponencial de exportações em 2024”. Para o analista Daniel Sasson, do Itaú BBA, as 90 milhões de toneladas que a China embarcou são quase três vezes o total que a siderurgia brasileira fez em 2023 (31,9 milhões de toneladas). O volume exportado representou 9% do volume que a China produziu no ano: 1,019 bilhão de toneladas de aço bruto.
O analista observa que o aumento de 40% sobre as importações de aços laminados pelo Brasil (4,4 milhões de toneladas) no ano passado são bem expressivas. Porém, diz, que esse nível deverá arrefecer em 2024 ante o de 2023. “Uma razão é que o preço do aço no mercado local não está tão mais alto do que o do internacional para fazer essa operação valer a pena. Quando o preço está 30% ou 40% mais alto, justifica-se a importação, mas hoje vemos planos de Usiminas e CSN negociados com um prêmio de 5% a 10% versus o produto importado [internalizado], em linha com a média histórica”, observa Sasson. No caso do aço longo, está mais ou menos em linha com o do importado, acrescenta.
A expectativa que o nível de importações neste ano traga um pouco de alívio aos produtores locais, com as siderúrgicas ganhando mais participação de mercado nas vendas domésticas. O Instituto Aço Brasil trabalha com projeção de alta de 20% sobre o volume importado no ano passado, representando cerca de 20% do consumo interno de todos os tipos de aço.
O setor correu ao governo desde abril e oficializou seu pleito de uma alíquota de importação de 25% em outubro, tendo a China como principal alvo. Mas Rússia, Coréia do Sul e outros países também despacharam expressivos volumes ao país. O Aço Brasil justifica que só assim será possível preservar a indústria de nova avalanche de aço chinês. Caso contrário, será obrigada a parar operações e suspender investimentos. Uma data limite para decisão do governo é fim deste trimestre, segundo uma fonte do setor.
Entre as siderúrgicas, a CSN movimentou-se primeiro em busca de medidas mais efetivas, enquanto não se vê uma ação de governo, conforme antecipou o IM Business neste mês. Em dezembro, a empresa entrou com petições de abertura de processo antidumping no Departamento de Comércio Exterior (Decom) contra alguns tipos de aço oriundo da China que ganharam força em seus mercados com competição desleal de preços. Usiminas, Gerdau e outras fabricantes poderão tomar a mesma atitude em fevereiro, segundo informações.
A avaliação é que o governo federal sentou sobre o pleito, avaliando que a tarifa de 10,8% praticada hoje é suficiente. As autoridades Brasília estão sob uma forte pressão de consumidores de aço contrárias a barreiras comerciais ao importado. A indústria de máquinas e equipamentos, via Abimaq, tem a posição mais dura sobre medidas de proteção, mesmo que temporárias. “Só vai elevar as margens de ganhos das siderúrgicas ao mesmo tempo que nos tira competitividade contra a importação de máquinas”, afirma José Velloso, presidente executivo da associação. O Aço Brasil contesta o argumento de que vão se aproveitar para elevar preços no mercado interno.
No atual cenário, Sasson informa que não tem nenhuma recomendação de compra de ação de siderúrgicas brasileiras. Usiminas e CSN foram colocadas “em neutro” (antes era de venda) porque – afirma – em certa medida o pior já passou. O papel de Gerdau, porém, foi rebaixado em dezembro de compra para neutro. “Não estou otimista com o setor, no momento, para 2024. Vai ser um ano desafiador, com demanda morna e alguma dificuldade para aumento de preço. Por isso, a nossa visão mais cautelosa com o setor”.
O cenário poderia mudar com um eventual aumento das tarifas de importação, para 25%, abrindo espaço para elevação de preços. “Porém não é o meu cenário base, pois há várias questões envolvidas entre os dois países e a elevação de tarifas poderia gerar um desconforto institucional nas relações comerciais entre Brasil e China”.
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