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“É como terra arrasada”, diz CFO responsável por reestruturação das Americanas

A executiva começou na empresa logo após o pedido de recuperação judicial por causa da fraude contábil que atingiu R$ 25 bilhões

Bloomberg

Camille Loyo Faria durante entrevista na sede da Americanas, no Rio de Janeiro (Maria Magdalena Arrellaga/Bloomberg)
Camille Loyo Faria durante entrevista na sede da Americanas, no Rio de Janeiro (Maria Magdalena Arrellaga/Bloomberg)

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Em uma sala de reuniões na decadente sede da Americanas, Camille Loyo Faria concorda que o escritório já viveu melhores dias.

É “feio, como uma empresa em recuperação judicial deve ser”, diz a CFO.

A executiva de 50 anos começou na empresa sediada no Rio de Janeiro em 1º de fevereiro de 2023, logo após o pedido de recuperação judicial por causa da fraude contábil que atingiu R$ 25 bilhões – um dos maiores do Brasil em todos os tempos. E essa é apenas a mais recente empresa que Faria ajudou a tirar do sufoco.

“É como terra arrasada”, ela fala sobre o processo de reestruturação, em uma rara entrevista. “Fico estranhamente calma em momentos de muito estresse, e isso permite me desconectar e pensar com a cabeça fria. Isso ajuda a ter coragem para tomar riscos”.

A ex-banqueira de investimentos – com passagens pelo Morgan Stanley, Bradesco e Bank of America Merrill Lynch – agora já está envolvida em duas das maiores reestruturações do mercado brasileiro, sendo a outra a recuperação da Oi. Ela se estabeleceu como negociadora competente para fechar negócios. Ou, como ela diz, ela sabe como “distribuir igualmente a dor”.

Faria admite que fica desconfortável ao falar dela mesma, mas adora conversar sobre reestruturações.

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“Você tem que ter estomago para lidar com tudo isso. As notícias na imprensa, as discussões com bancos e credores, conversas com acionistas”, ela diz. “É muita coisa”.

Mesmo no início de sua carreira, trabalhando com estratégia em empresas de telecomunicações, Faria teve que administrar momentos de caos e transição. Na virada do século, durante seu período na Embratel e na Telecom Italia, o governo brasileiro estava privatizando grande parte da indústria de telecom. Isso significava que ela trabalhava em fusões e aquisições e frequentemente ocupava um lugar à mesa durante as negociações.

Mais tarde, ela ampliou sua área de atuação ao trabalhar em negócios pela América Latina. Em 2006, ela assumiu seu primeiro cargo de CFO, em uma empresa de energia chamada Terna Participações, supervisionando seu IPO. Então, se mudou para São Paulo para trabalhar em bancos de investimentos, assessorando clientes nos setores de telecomunicações e energia.

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Enquanto estava no Morgan Stanley, ela foi convidada a assumir o cargo de CEO de sua então cliente Multiner, em 2010, para supervisionar uma recuperação e vender a empresa de energia. Ela voltou para o Morgan em 2012. Posteriormente, quando estava no Bank of America, onde a Oi era cliente, decidiu ingressar na empresa de telecomunicações como CFO em meio ao processo de recuperação judicial em 2019.

“Com os bancos de investimentos, quanto mais sênior você se torna, mais você se torna uma pessoa de relacionamento”, disse ela. “Não tenho nada contra quem gosta disso, mas não sou aquela pessoa que gosta de levar clientes para almoçar, tomar um café, jantar fora. Gosto de projetos e estava me afastando cada vez mais daquilo que gosto de fazer.”

Ela brincou sobre outra constatação que teve quando deixou o banco de investimentos: “Eu estava envelhecendo como banqueira, mas ainda era uma executiva superjovem”.

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Após um breve retorno à TIM, depois da Oi, Faria assumiu seu maior desafio até então, e no varejo, setor em que nunca havia trabalhado antes.

Sergio Rial, ex-CEO do Santander Brasil que assumiu o comando da Americanas por poucos dias antes de pedir demissão devido às descobertas explosivas, foi quem convidou Faria para ingressar como CFO com o apoio dos acionistas.

Uma loja da Americanas dentro da sede da empresa

Mas a Americanas só teve dias – em vez de semanas ou meses – para se preparar para um pedido de recuperação judicial. E isso teve de ser feito sem uma lista completa de credores e ou uma compreensão clara do funcionamento interno da fraude. Ao mesmo tempo, a empresa era pressionada por todos os lados por credores e fornecedores que lutavam para receber suas dívidas.“Foi fácil aceitar o convite, por mais incrível que pareça”, disse Faria. “Mas pegou todo mundo de surpresa. As pessoas queriam respostas para uma série de perguntas que a empresa não tinha.”

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Daniel Goldberg, sócio-gerente e diretor de investimentos da Lumina Capital Management, disse que não ficou surpreso com o fato de Faria ter aceitado o cargo. Ele trabalhou com ela quando era presidente do Morgan Stanley no Brasil e novamente durante seu período no hedge fund Farallon, que financiou a reestruturação da Oi.

“Camille é uma das melhores executivas do mercado para lidar com esse tipo de situação”, disse. “Lidamos com questões urgentes e de alta complexidade de uma forma que, na minha opinião, mostrou que Camille era uma das melhores do mercado.”

No que diz respeito à Americanas, Faria também tinha uma ligação emocional com a gigante do varejo, referência no Brasil há mais de 90 anos.

“Eu comprava shampoo e balas lá”, disse Faria. “Quando você pensa que certas experiências e conhecimentos que acumulou como profissional podem ajudar a integrar uma equipe e ajudar a salvar a marca e a empresa com mais de 30 mil pessoas, você tem um propósito totalmente diferente.”

Foram necessários meses de investigação nos registros contábeis da empresa para compreender a verdadeira dimensão do problema. Faria disse que negociou principalmente ao lado de Roberto Thompson, um aliado de longa data dos acionistas bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Sicupira, que finalmente concordaram em investir R$ 12 bilhões para recapitalizar a empresa.

Faria e a sua equipe conseguiram que mais de 97% dos credores concordassem com um plano que reduzirá a dívida da empresa para cerca de R$ 1,8 bilhão e converterá grande parte dos passivos detidos pelos bancos em ações.

“Não estávamos tentando aprovar o plano por maioria simples, mas tentando fazer com que todos concordassem”, disse ela. “Porque gastar R$ 12 bilhões para resolver apenas parte do problema é um empreendimento caro.”

Ela também minimiza o que, visto de fora, pareciam ser conversas longas e prolongadas com certos bancos, que apresentaram argumentos duramente formulados em tribunal, com certos detalhes vazados para a imprensa.

Os problemas estão longe de acabar para Americanas e Faria. Na noite de quarta-feira (24), a empresa informou em documento que um processo de arbitragem está sendo iniciado por um investidor sobre perdas decorrentes da queda no preço das ações.

“As falências são processos dolorosos”, disse ela. “Para mim, quando você consegue encerrar o processo de reestruturação é quando as pessoas ao redor da mesa sentem que a dor foi distribuída igualmente.”

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