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Na terça-feira (14), dia considerado o mais quente da história na cidade de São Paulo (e em boa parte do Brasil), o diretor de marketplace da Shein, Raul Jacob, deixou o ar-condicionado do escritório na avenida Faria Lima, no coração financeiro da cidade, e enfrentou a onda de calor no Brás e no Bom Retiro, no centro da capital paulista. Sua missão era visitar lojistas e atacadistas que passaram a vender, diretamente ao consumidor final, seus produtos em uma das maiores plataformas de e-commerce de moda do mundo.
Essa tem sido a rotina de Jacob, um jovem de barba muito bem feita e cabelo meticulosamente penteado, desde o ano passado. Ex-Shopee e Dia, ele lidera a operação do marketplace (vendas de terceiros) da Shein no Brasil, que segundo a companhia já tem mais de 10 mil vendedores locais e representa 50% do GVM (vendas brutas totais) no país. Os outros 50% são divididos entre vendas próprias com produção nacional (1P) e o cross border (produtos importados da China).
O trabalho “de formiguinha” começou pelo Brás e depois pelo Bom Retiro, dois bairros conhecidos nacionalmente como centros de produção e venda de roupas, tanto atacado quanto varejo, mas já se espalhou para outras cidades, como Franca, no interior de São Paulo — o principal polo calçadista brasileiro —, Blumenau, em Santa Catarina — polo têxtil muito forte em malharia —, e Nova Friburgo, no Rio de Janeiro — por causa de roupas íntimas e moda praia.
O Brasil oscila entre o segundo e o terceiro maior mercado da Shein — os primeiros são os Estados Unidos —, e a estratégia para crescer aqui tem envolvido a busca ativa de sellers que não tinham presença digital. “A gente queria vendedores que não comercializavam seus produtos na internet. Eram pessoas geralmente de mais idade, que tinham resistência ao on-line e a gente precisou ‘pegar na mão’ e ensinar todo o processo”, conta Jacob ao IM Business. “Muito lojista não quer estar no on-line. E é esse o tipo de vendedor que a gente quer”.
Ele diz que a escolha tem um motivo: os vendedores mais novos, que já têm seus produtos na internet, são geralmente revendedores (intermediários). “Mas a gente queria o atacadista, que também produz as peças e por isso consegue oferecer produtos a um custo mais baixo”. No começo, a varejista chinesa ofereceu o pacote completo aos sellers, definindo até o computador e a impressora que seria preciso comprar, financiando as fotos dos produtos e enviando pessoas para ensiná-los a usar a plataforma.
O próprio site precisou ser redesenhado, pois a Shein trabalhava apenas com vendas internacionais (cross border) em todo o mundo. Toda a área para vendedores foi desenvolvida do zero. “O app não foi construído para ter intermediários, pois era 100% B2C [business to consumer]”, conta o diretor responsável pela nova frente no Brasil.
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Hoje, a Shein (pronuncia-se “She in“, que em inglês significa “ela dentro [da moda]”) trabalha com vendas 3P só aqui e no México e possui produção local só no país e na Turquia. O Brasil é, portanto, o único mercado onde ela atua nas três frentes de negócio. A meta é que 85% das vendas no país sejam made in Brazil até 2026 – fabricados pelos seus próprios fornecedores (1P) ou por sellers brasileiros (3P). Ou seja: só 15% das vendas serão importadas.
Formado em engenharia mecatrônica pelo Mackenzie e com MBA em gestão de marketing em Harvard, Jacob diz que cerca de 80% dos sellers vieram da “aquisição off-line” e que 90% deles ainda são do Brás, do Bom Retiro e da 25 de Março. Mas o diretor tem viajado para outras regiões para expandir a rede da Shein. “Há dois meses fui pra Turitama, em Pernambuco. A gente viaja bastante para entender qual é o tipo de produção que tem nos locais, a capacidade e a demanda”.
Crescimento vertiginoso, entregas nem tanto
Nascida na China e com sede em Cingapura, a Shein atua em mais de 150 países e tem atualmente cerca de 11 mil funcionários. No Brasil, tem 250 pessoas no escritório na Faria Lima, das quais 100 trabalham apenas no marketplace. Eram apenas duas em março do ano passado, quando Jacob foi contratado da Shopee para montar o 3P no Brasil.
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A varejista tem investindo pesado em logística, tanto no first mile (a coleta dos produtos dos sellers e dos produzidos por parceiros) quanto no last mile (a entrega final ao consumidor, um dos calcanhares de Aquiles da marca). Mas o foco ainda está no começo da cadeia. São cinco galpões logísticos no Brasil, sendo três em Guarulhos, um em Perus e outro em Embu das Artes, que somam uma Área Bruta Locável (ABL) de 256 mil m² (há menos de um ano eram “apenas” 43 mil m²).
Sobre as entregas, Jacob diz apenas que “tinha um prazo muito ruim, que está evoluindo”, mas não quantifica essa redução em dias, e ressalta que a redução no prazo de entrega ainda não é o foco da companhia. “Prazo não é o meu foco agora, meu principal desafio é atender o seller que quer vender na Shein”.
A empresa diz que tem 10 mil vendedores cadastrados na plataforma, mas a “fila de espera” é maior e muitos ainda não podem ser atendidos (o número exato não é revelado). “Pela nossa limitação logística, a pessoa vai se cadastrar, mas vai ficar on hold [em espera]. Eu ainda não consigo atender um vendedor em Manaus, por exemplo”.
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Outros objetivos são melhorar a coleta, o recebimento e a triagem dos produtos dos vendedores, que são centralizados nos galpões da empresa e depois enviados aos clientes, e também a devolução de produtos, que é de graça para o consumidor e tem um custo relevante para a empresa. “Queremos evoluir para uma logística reversa melhor, tanto para nós quanto para o consumidor”.
Também ao IM Business, o diretor de logística da empresa, Julio Manzano, disse que “já conseguimos entregar compras em São Paulo a partir de dois dias e estamos trabalhando para baixar esse prazo”. “Somos novos no mercado e estamos construindo competência logística para dar conta da demanda de forma mais eficiente”.
Tudo isso tem um custo, mas a Shein ainda abre poucos números. A empresa quer fazer um IPO (abrir capital na bolsa) nos Estados Unidos e busca uma avaliação de até US$ 90 bilhões (quase R$ 440 bilhões na cotação atual), por isso busca um forte crescimento e só divulga as informações que convêm.
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A empresa não detalha números da operação no Brasil e se ela é lucrativa (ou se “queima” muito caixa), dados os pesados investimentos em logística e na atração de vendedores, além dos (muitos) descontos aos consumidores e os preços agressivos que popularizaram a marca. Ela, por exemplo, dá frete grátis em compras internacionais acima de R$ 69, em compras locais de qualquer valor durante períodos como o 11/11 e a Black Friday, está com mais de R$ 22 milhões em cupons de desconto neste mês, não cobra dos clientes a devolução de produtos e não cobra a comissão (take rate) de 10% dos lojistas nos três primeiros meses. É uma estratégia bastante agressiva para continuar crescendo no Brasil.
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