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De edição genômica à compensação de carbono, agtechs entram na mira dos investidores

Estudo mostra que agtechs foram as mais procuradas por investidores-anjo no país em 2023, recebendo 56,3% dos aportes

Michele Loureiro

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Apesar de ser um dos setores mais importantes para a economia, o agronegócio vem sendo amplamente impactado pelas questões climáticas. Segundo a consultoria MB Agro, a renda agrícola este ano deve ficar em R$ 642 bilhões, uma queda de 12,9%, já descontada a inflação, em comparação a 2023. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), por conta das condições climáticas menos favoráveis, o PIB da agropecuária para o segundo trimestre deve ter queda de 2,2% em relação ao período anterior. Nessa toada, as chamadas agtechs, startups focadas em soluções ambientais, ganham destaque entre os investidores e podem ser uma alternativa para abrandar as consequências do clima.

Um estudo da Anjos do Brasil apontou que as agtechs foram o setor mais procurado por investidores-anjo no país em 2023, com 56,3% dos aportes. Isso porque, além de o planeta estar em um ciclo vicioso no qual o aquecimento global prejudica os ecossistemas, a capacidade de absorção de carbono, a biodiversidade e, consequentemente, a agricultura, há muitas oportunidades de negócios em todas as frentes que envolvem o meio ambiente.

Papel da tecnologia

É justamente aí que entra a atuação das agtechs, que buscam soluções inovadoras, como agricultura de precisão, tecnologias de irrigação e produtos biológicos, para reduzir a necessidade de insumos químicos, otimizar o uso de recursos hídricos e produzir em áreas menores e com menos emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE).

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A InEdita Bio, que usa a edição genômica de plantas visando a produção sustentável de alimentos, é uma delas. De maneira prática, a ideia é fazer pequenas alterações nos genes das plantas para dar a elas uma nova característica, como uma resistência maior a pragas e doenças. A empresa criou plataformas de edição genômica para o desenvolvimento de características biológicas de alto valor em qualquer cultura agrícola e tem uma meta bem ambiciosa: mudar o cenário da produção global de alimentos, garantindo a preservação da natureza para as futuras gerações.

“A edição genômica é como trocar palavras de um texto, corrigir. Ao modificar ou apagar alguma letra, é possível silenciar genes que seriam atacados por um fungo, por exemplo, para diminuir a dependência de pesticidas”, diz o professor Paulo Arruda, sócio-fundador e CEO da startup InEdita Bio e coordenador do Centro de Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas da Unicamp.

Dessa forma, há a possibilidade de criar cultivos agrícolas mais adaptados ao novo clima, consumindo menos água e com mais resistência a pragas e doenças, menos necessidade de agentes químicos e com mais produtividade por quilômetro quadrado plantado.

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Um dos projetos centrais da empresa, que utiliza também inteligência artificial e aprendizado de máquina, é voltado ao desenvolvimento de uma soja que seja resistente à ferrugem asiática, uma doença que causou US$ 3 bilhões de prejuízo na safra 22/23 aos agricultores brasileiros. “Foram 450 mil toneladas de fungicida pulverizadas nas plantações, um impacto enorme ambiental e no bolso do agricultor”, diz Arruda. O objetivo da InEdita Bio é reduzir o uso de fertilizantes e pesticidas químicos. “A dependência de agrotóxicos não é sustentável em nenhum aspecto — ambiental, social e econômico”.

Criada em 2022, a agtech está em fase de pesquisa e desenvolvimento, e já recebeu investimentos do Vesper Ventures, fundo venture builder com foco em biotecnologia avançada, e da gestora Ecoa Capital, voltada para a agricultura sustentável, e mira novos aportes. Outro plano da empresa é fechar parcerias com produtoras de sementes. “Ninguém vai resolver o problema das mudanças climáticas sozinho e a colaboração é fundamental”. A perspectiva é que os primeiros ensaios de campo aconteçam no final de 2025.

Medir para controlar

Outra empresa que vem ganhando destaque é a Gedanken, que desenvolveu uma plataforma para calcular o desempenho ESG da cadeia de fornecimento, que atualmente concentra 90% das emissões de carbono das grandes empresas, segundo o relatório Carbon Disclosure Project (CDP). Por lá, é possível avaliar a sustentabilidade dos fornecedores por meio de 80 indicadores agrupados em quatro pilares — cuidados com meio ambiente, governança, responsabilidade social e impacto de compras sustentáveis. Cada pilar é baseado em metodologias de referência, constantemente aprimoradas por meio de Conselhos com a participação de companhias, instituições acadêmicas e parceiros.

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Entre as funcionalidades estão a identificação e mitigação de ameaças relacionadas à sustentabilidade, provenientes da cadeia de fornecimento, construção de relatórios e acesso a fornecedores que fazem parte da Comunidade de Fornecimento Sustentável da Gedanken, o que auxilia na geração de um ecossistema mais seguro. A empresa também auxilia no processo de onboarding de fornecedores, gestão de riscos, performance e due diligence.

Apesar de não atuar diretamente no campo, com essa parte mais burocrática, a companhia ajuda mais de 200 clientes, incluindo nomes como Ambev, MRV e Gerdau, a olharem para a questão ambiental com dados práticos que ajudam a fazer mudanças reais nas políticas — e cuidar do meio ambiente.

Agrofloresta e compensação de carbono

Outro exemplo que tem chamado atenção dos investidores é a Agroforestry Carbon, que desenvolve junto de pequenos agricultores projetos de agrofloresta para compensação voluntária de carbono e acaba de arrecadar R$ 1,1 milhão por meio de rodada de crowdfunding realizada pela Arara Seed, primeira plataforma de equity crowdfunding em startups do agronegócio e clima.

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A Agroforestry Carbon atua por meio da oferta de soluções de descarbonização para empresas e plantio de árvores em sistemas agroflorestais de pequenos agricultores. Ao restaurar áreas degradadas com integração de árvores com culturas agrícolas, cria-se ecossistemas mais resilientes, promovendo a saúde do solo, água e um ambiente mais equilibrado.

Segundo Gabriel Neto, CEO da Agroforestry Carbon, a tecnologia é o pilar central da companhia. “É como a espinha dorsal das nossas soluções, contamos com um banco de dados agroflorestal robusto, composto por milhares de árvores e propriedades mapeadas”, diz.

Enquanto as agtechs apostam na tecnologia para tentar resolver os problemas ambientais, este é justamente um dos principais desafios do setor. Afinal, 73% das propriedades rurais estão desconectadas da internet, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária e a conectividade acaba sendo um obstáculo para muitas iniciativas e para a obtenção de dados em tempo real. Ainda assim, a criação e expansão dessas empresas é um caminho sem volta.

O Brasil é o país com mais agtechs na América Latina. Em 2023, o Radar Agtech Brasil identificou 1.953 agtechs no país, um crescimento de 14,7% em relação ao ano anterior.

Michele Loureiro

Jornalista colaboradora do InfoMoney