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Quando um atleta olímpico atinge o ápice – a sonhada medalha –, o glamour da vitória muitas vezes eclipsa as fases difíceis até o ponto mais alto do pódio. No mundo corporativo, há um sentimento semelhante: quando chega o dia de concluir um negócio importante ou fazer uma apresentação, e o resultado se traduz em sucesso absoluto.
“Ninguém vê o que você teve que fazer para chegar até aquele momento: treinar na chuva, no frio, a dor no corpo, o cansaço. Quando se cruza a linha de chegada, parece fácil. Isso vale também para o trabalho. Por trás, há muitas viagens, negócios perdidos, dúvidas de estar no caminho certo”, diz Christian Wellisch, CEO da Globus Seguros.
Wellisch sempre gostou de esportes. Começou com o futebol ainda na adolescência. Aos 25 anos, o Ironman cruzou a vida do CEO da Globus como um desafio. Fumante e praticante esporádico de esportes, Wellisch surpreendeu os amigos quando fez a primeira prova, em 2005. Não parou mais, participou de provas de Ironman em 2005 e 2006, correu também maratonas (42km) no Rio de Janeiro, em Nova York, nos Estados Unidos, e na Noruega, além de meias maratonas.
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“Ao longo do tempo de treino, comecei a perceber que, com disciplina, metodologia, foco e resiliência, é possível fazer coisas incríveis. Isso começou a transformar minha jornada profissional. O Ironman me ensinou: You can quit, nobody cares, but you will always know [em tradução livre, significa que você pode abandonar uma prova e ninguém vai se importar, mas você sempre vai saber o que fez]. No esporte, a disciplina, o foco, o respeito, a resiliência, os princípios, os valores são inegociáveis e dependem apenas de fazer a coisa certa”, afirma Wellisch.
Leia mais: O operador da Bolsa que trouxe o triatlo mais exigente do mundo ao Brasil
Considerada um símbolo da resistência humana, física e emocional, a prova de Ironman é exaustiva. Exige que o atleta nade 3,8 quilômetros, pedale 180 quilômetros e corra por 42 quilômetros. Já na modalidade do triatlon olímpico, o percurso é composto por 1,5 quilômetro de natação, 40 quilômetros de ciclismo e 10 quilômetros de corrida.
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Nos momentos de total entrega aos desafios do esporte, Wellisch tomou decisões imprescindíveis também aos negócios.
“Quando estávamos passando pela nossa primeira rodada de investimentos, tinha um ponto no contrato que era importante para a empresa e que poderia ser deal breaker. Foi na corrida que consegui refletir que não podíamos abrir mão desse ponto e conseguimos achar um modelo para continuar com a rodada”, detalha.
Organização e persistência para metas ousadas
Praticante de triatlo há 18 anos, Adriano Merigli, presidente da fabricante global de retroescavadeiras e manipuladores telescópicos JCB no Brasil, já passou por seis provas de Ironman, 12 Half Ironman e 12 maratonas. Também movido pelo desafio, Merigli destaca o aprendizado em lidar com frustrações e perseguir a disciplina para alcançar resultados consistentes.
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“Com o esporte, aprendi que nada é impossível se há um bom planejamento e assessoria de profissionais que ajudam no direcionamento. As adversidades existem para serem vencidas”, afirma.
Sem esconder a emoção ao cruzar um pórtico com sensação de entrega de resultado, entre pedaladas e braçadas, Merigli conta que fez amigos e viu oportunidades de negócios. “Quando estou me preparando para provas, e durante horas e horas de pedal e corrida, inevitavelmente, negócios são conversados”.
O InfoMoney foi a campo buscar histórias de superação protagonizadas por executivos. Em uma série de reportagens, vai mostrar como os esses profissionais encontram no esporte o combustível para a disciplina e altos índices de assertividade no dia a dia. Veja matéria já publicada:
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Prática para lidar com imprevistos e frustrações
Para Priscilla Leão, diretora de recursos humanos da EXM Partners, o trialto chegou em 2020, durante a pandemia de covid-19. Apesar de praticar esportes desde criança e ainda ballet clássico, a rotina pesada de trabalho a obrigou a fazer escolhas mais práticas e adaptáveis.
Durante o isolamento imposto pela pandemia, com as academias fechadas, ela começou a correr e pedalar em estradas. Mesmo sem saber nadar, pulou na piscina de casa amarrada a um elástico. Da superação dos medos nasceu a triatleta. Apesar de o triatlo ser um esporte individual, Leão ressalta que a prática dessa modalidade exige treinamentos em grupo, fortalecendo relacionamentos e senso de pertencimento.
“Sempre conhecemos pessoas interessantes, de diversas áreas, que se tornam parceiros também fora do esporte”, diz Leão, que considera o triatlo um esporte versátil e muito exigente.
A prática diária de esportes a inspira a fazer analogias com o ambiente corporativo. “Podemos desenvolver várias competências, como a disciplina, persistência, administração do tempo, foco, gestão de risco, planejamento, organização, bem como lidar com imprevistos, limites, pressão e frustrações”, afirma.
Sem limites para estabelecer desafios
Sedentário confesso até os 45 anos, Marcio Milan, vice-presidente de relações institucionais da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), começou a correr em torno de sua casa usando pedras para marcar o número de voltas.
“Tomei gosto pela corrida, treinei e, um mês depois, estava correndo minha primeira maratona de 42,2 km, em Blumenau (SC), em 1995”, diz Milan, que aos 75 anos acaba de completar mais uma Race Across América (RAAM).
Considerada uma das mais severas provas de ciclismo do mundo, a RAAM é realizada nos Estados Unidos, com largada no píer de Oceanside, Santa Mônica, em Los Angeles e cruza 12 estados. No percurso, estão dois desertos, Sonora e Mojave, e a subida de três montanhas (Sierra, Rocky e Appalachian). A chegada é Annapolis, capital do estado de Maryland. A edição 2024 foi realizada em junho.
“Durante sete dias, pedalando ininterruptamente, ou seja, 24 horas por dia, eu e mais três ciclistas percorremos pouco mais de três mil milhas (5 mil quilômetros) de costa a costa dos Estados Unidos”, detalha.
No percurso, Milan enfrentou o calor extremo do deserto do Arizona, as altas elevações do Colorado. Em alguns trechos, foi obrigado a lidar com tornado e chuva de granizo, no Kansas.
“Passamos também por outros perigos inerentes da competição conhecida por levar os ciclistas ao extremo tanto no aspecto físico quanto mental. Esta foi a 18ª vez que participei da prova e o único brasileiro a entrar para o Hall of Fame da RAAM”, conta Milan.
Anos de dedicação para superar desafios no esporte renderam a Milan a capacidade de atuar com agilidade, resistência, resiliência e doses de criatividade. “Nas negociações do dia a dia, várias características do esporte se tornam evidentes, pois nem sempre se obtém o melhor resultado, mas se deve continuar tentando sempre”, diz.
Negócios em treinos de longa duração
Vitórias e derrotas no mercado financeiro têm reflexos de experiências vivenciadas no esporte por Thiago Figueiredo, CIO da Intrabank, gestora de crédito. Com a rotina de praticar ciclismo em estrada, mountain bike, triatlo e corrida de aventura desde os 15 anos de idade, Figueiredo, hoje com 49 anos, é um apaixonado por esportes de longa duração.
“Esses esportes envolvem não somente preparo físico, mas muito planejamento e preparo psicológico. Essa combinação me motiva a seguir competindo. Ter sucesso em competições desse perfil é um projeto de longo prazo, em que a prova é apenas a finalização. Parte do que aprendi carrego comigo na profissão, como saber prever as dificuldades da prova, aprender a se adaptar às mudanças, ter resiliência e confiar no processo do ciclo de treinamento”, diz.
Na bagagem esportiva, Figueiredo traz competições como Ironman Full, Ironman 70.3, L’Étape Ciclismo, Maratona Brasil Ride de mountain bike, Circuitos Chauás e Hakka de Corrida de Aventura. O CIO da Intrabank concorda sobre a importância da interatividade durante os treinos de um esporte individual. E afirma já ter fechado negócios nesses momentos.
“Os treinos em sua maioria são em grupo, intermediados por assessorias e treinadores especializados. Fiz amizades com pessoas da mesma área em que trabalho e de áreas diferentes. O mais legal é que em um treino ‘longão’, de cinco horas de ciclismo com um grupo, dá para conversar e conhecer bastante sobre outros ramos de negócio e sim, às vezes até sai negócio”, detalha.
Triunfo do ciclismo em Paris
Bem no espírito da sede dos Jogos Olímpicos de 2024, Raphael Vicente, diretor geral da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, não larga mais sua bicicleta, desde que começou a praticar ciclismo, há um ano. Vicente escolheu a modalidade buscando aliar novas experiências de vida à prática esportiva de baixo impacto.
“A prática desestressa e auxilia na concentração e determinação. O ciclismo atua numa linha de foco e de pensamento, o famoso ócio criativo, que geralmente ajuda a ter vários insights interessantes. O esporte dá aquele esforço adicional para terminar”, conta.
Vicente está em sintonia com os parisienses e os visitantes da capital francesa para assistir aos jogos olímpicos. Pela primeira vez na história das olimpíadas, será possível acessar todas as arenas e locais de competição por ciclovias. Paris se preparou para isso. São 1,8 mil quilômetros de ciclovias na capital francesa, sendo 415 construídos especialmente para os jogos.
Paris tem atualmente mais pessoas usando bicicletas no lugar de carros. O sistema de bicicletas compartilhadas da cidade conta com 1.475 estações em toda a região metropolitana e mais três mil estações foram instaladas para os jogos olímpicos. No total, são 19 mil bicicletas disponíveis.