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Coalizão parte para a defesa da manutenção do imposto sobre o aço chinês

Abimaq e outras associações reclamam de alto custo do aço no mercado interno e temem aumento de preços, caso o governo sobretaxe o insumo

Rikardy Tooge

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Em um momento em que as siderúrgicas se movimentam e pressionam o governo para que aumente a taxação do aço vindo do exterior para 25%, em especial o da China, os segmentos que dependem do insumo partem para defender a manutenção do atual imposto, de 9,6%, e argumentam que o aço produzido no país sai mais caro no mercado interno do que as empresas de siderurgia cobra de seus clientes no exterior.

“O Brasil vende o aço 83% mais caro dentro do país do que na exportação. Até onde me consta, as siderúrgicas não fazem caridade para vender mais barato ao exterior”, argumenta José Velloso, presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). A Abimaq lidera uma coalizão de 20 setores, entre eles infraestrutura (Abdib), naval (Sinaval), autopeças (Abipeças), ferroviário (Abifer), saneamento (Sindesan) e construção civil (CBIC), que se posiciona contra a sobretaxa.

Um exemplo, acrescenta o dirigente, está no custo para as indústrias da bobina quente – tipo de aço utilizado em capôs de carro e porta de geladeiras, por exemplo. O insumo local está hoje 14,9% acima do  importado, de acordo com levantamento semanal da Platts, do grupo S&P. “Estamos falando de uma commodity, há referências de preços. E, mesmo com o atual imposto, sai mais barato trazer do exterior. Enquanto houver essa disparidade, vai ter importação.”

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O Instituto Aço Brasil, entidade que congrega as principais siderúrgicas do país, diz que não é possível afirmar que há a assimetria de preços indicada pela coalizão. “Não é possível fazer este cálculo de forma acurada e confiável, considerando a infinidade de produtos disponíveis no mercado brasileiro, bem como as particularidades, em termos de conveniência, disponibilidade e customização, do que é oferecido pela indústria brasileira para seu consumidor interno”, argumentou a instituição (leia a nota no fim desta reportagem). 

“Os preços externos do aço não servem como parâmetro porque as cotações internacionais encontram-se pressionadas para baixo, devido ao excesso de capacidade ociosa de produção de 564 milhões de toneladas/ano, a concorrência desleal oriunda de países que subsidiam exportações, notadamente a China, e a escalada protecionista”, complementa a associação de siderúrgicas.

Outro argumento da coalizão de indústrias pela manutenção da atual taxa está em um iminente repasse de preços, caso a sobretaxa sobre o aço chinês seja aplicada. Velloso lembra que, somente entre as 8,5 mil empresas do setor de máquinas e equipamentos, cerca de 90% compra o aço de distribuidoras, que não estão no debate de preços. “Ninguém vai fiscalizar, caso ocorra a taxação, se os preços locais vão seguir nos mesmo patamares ou se as distribuidoras vão embutir o aumento do imposto nos preços. A história já nos mostrou que sempre há o reajuste”, acrescenta o executivo.

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Conforme o IM Business já mostrou, o CEO da ArcelorMittal Brasil, Jefferson De Paula, que também preside o Instituto Aço Brasil, defende o aumento do imposto por um ano até que o mercado se reequilibre. “Nós queremos estar nas mesmas condições de Estados Unidos, União Europeia e México [países que aplicaram tributação semelhante]. Nós acreditamos e defendemos o livre comércio, mas ele precisa ser justo. Não dá para sermos bonzinhos do nosso lado enquanto o outro lado trabalha com subsídios”, defendeu.

Como efeito imediato, cerca de 400 funcionários da ArcelorMittal em Resende (RJ) vão entrar em férias coletivas entre novembro e dezembro – o mesmo ocorrerá em Piracicaba (SP) e Juiz de Fora (MG), que terão seu período de parada técnica estendido neste ano. Em outra frente, a Gerdau anunciou a demissão de 700 funcionários e a Usiminas sinalizou que poderá desligar seu alto-forno em Ipatinga (MG).

“Nós empregamos mais que as siderúrgicas e estamos com uma previsão de 10% de queda na receita e, mesmo assim, estamos mantendo empregos”, rebate o presidente executivo da Abimaq. O setor de máquinas emprega pouco mais de 390 mil pessoas e tem faturamento anual em torno de R$ 300 bilhões, enquanto o do aço tem 127 mil funcionários e saldo comercial positivo de US$ 6 bilhões.

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José Velloso aponta ainda que são as siderúrgicas que têm tirado mais proveito do custo mais baixo do aço chinês do que as próprias indústrias. Dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) mostram um aumento de mais de 880% na importação de aço semi-acabado, que, em sua maioria, é utilizado pelo setor de siderurgia. O volume exportado passou de 45 mil para 443 mil toneladas, o equivalente a US$ 253,1 milhões. “Nenhuma indústria tem laminador para terminar uma placa de aço. E, também, nem toda a empresa tem fluxo de caixa para esperar de seis a sete meses entre o pedido na China e a chegada do produto”, prossegue o presidente da Abimaq. 

Sobre este ponto, o Instituto Aço Brasil alega que o volume representa 14% das importações brasileiras e que a medida ocorreu porque algumas empresas não puderam produzir placas de aço em volume suficiente no mercado interno para atender seus clientes. “A elevação de importação de aço por siderúrgicas brasileiras não decorre de captura de ‘oportunidade de mercado'”, reforça.

As importações de aço da China dispararam 48,6% neste ano, enquanto a produção nacional caiu 8,4% até setembro, com as vendas recuando 5,4% e as exportações, 4,4%.  A previsão é que a entrada de aço chinês no país cresça 50% em 2023 em relação ao ano passado, para 5 milhões de toneladas, ou 25% do consumo anual de aço no país (20 milhões de toneladas).

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Leia a nota do Instituto Aço Brasil

Em relação à reportagem publicada nesta segunda-feira (4/12) sobre elevação de tarifa de importações de aço, o Instituto Aço Brasil informa que a indústria de aço brasileira vem enfrentando uma guerra assimétrica representada pela disparada de 48,6% das importações, em 2023,  que ingressam no país para competir de forma desleal com o produto brasileiro, a preços de custo ou mesmo abaixo desse patamar. 

A afirmação, na reportagem, de que o produto brasileiro vendido no mercado interno é 83% superior aos preços praticados no exterior não procede. Não é possível fazer este cálculo de forma acurada e confiável, considerando a infinidade de produtos disponíveis no mercado brasileiro, bem como as particularidades, em termos de conveniência, disponibilidade e customização, do que é oferecido pela indústria brasileira para seu consumidor interno. 

Além disso, por definição, em qualquer circunstância e mercado, preços de produtos externos ofertados são inferiores aos preços desses produtos se vendidos internamente; logo, tal comparação será desfavorável para qualquer indústria em qualquer país. Por fim, os preços externos do aço não servem como parâmetro porque as cotações internacionais encontram-se pressionadas para baixo, devido ao excesso de capacidade ociosa de produção de 564 milhões de toneladas/ano, a concorrência desleal oriunda de países que subsidiam exportações, notadamente a China, e a escalada protecionista. 

A ameaça das importações não é uma realidade exclusiva da indústria brasileira. Prova disso é que relevantes mercados – Estados Unidos, Reino Unido, 27 países da União Europeia e México – já regiram à concorrência desleal, elevando alíquota de 25% para importação. Enquanto isso, o Brasil segue com alíquota de 9,6% para a maioria dos produtos importados, em uma assimetria que, se mantida,  acabará agravando o problema. Por este motivo, a indústria brasileira do aço solicita que o governo eleve para 25%, em caráter temporário e emergencial, a tarifa de importação de 18 NCMs (nomenclatura Comum do Mercosul), de 273 NCMs existentes. 

A prioridade da indústria do aço, com o pedido de elevação da tarifa de importação, é assegurar demanda que justifique uma produção em volume suficiente para manter a operação industrial em patamar minimamente aceitável, para garantir a sustentabilidade do setor, e não elevação de preços. E, pelos motivos expostos anteriormente, elevar exportações não é uma alternativa estratégica viável para o setor que possa ser considerada para mitigar os efeitos da deterioração do mercado interno. Em resumo, exportar é apenas uma forma pontual de evitar formação de estoques, diante da contração da demanda interna, mas que não demonstra viabilidade financeira capaz de preservar a sustentabilidade do setor. 

Diferentemente do que o entrevistado pela reportagem acusa, a elevação de importação de aço por siderúrgicas brasileiras não decorre de captura de “oportunidade de mercado”, mas, sim, de atendimento a necessidades contratuais específicas de algumas empresas, que, por restrições operacionais, não puderam produzir placas de aço em volume suficiente no mercado interno para atender seus clientes. Diante disso, decidiram importar para fazer frente a seus compromissos. As importações pelas siderúrgicas representam apenas 14% do volume total importado pelo país. Em outras palavras, 86% do volume importado é consumido fora do setor siderúrgico. Por fim, a acusação carece de lógica, porque, se importar aço representasse uma real oportunidade de elevar seus resultados financeiros, a indústria do aço não estaria defendendo de forma tão veemente o aumento da tarifa de importação. 

A indústria do aço é estratégica para o país e para sua soberania, uma vez que o produto garante a segurança alimentar, energética e nacional, fornecendo um item necessário para uma infinidade de processos industriais. Investe R$ 12 bilhões por ano em inovação tecnológica e modernização. Tem efeito multiplicador na economia – movimenta 3 milhões de empregos diretos, indiretos e induzidos – além de promover impacto significativo nas regiões em que está presente. O enfraquecimento dessa indústria, diante do ataque desproporcional representado pelas importações, resultará em fechamento de mais unidades, desemprego, desabastecimento e desarranjo das cadeias produtivas, sendo certo que tais efeitos nocivos serão disseminados por toda a economia. 

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br