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Força-tarefa resgata operários em condições análogas à escravidão em obras da BYD

Empresa está construindo fábrica em Camaçari, na Bahia; problemas iam de jornadas excessivas, até falta de colchões e banheiros e retenção de parte dos salários

Iuri Santos

Obras da fábrica da BYD em Camaçari, Bahia. (Foto: Iuri Santos)
Obras da fábrica da BYD em Camaçari, Bahia. (Foto: Iuri Santos)

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O Ministério Público do Trabalho (MPT) anunciou nesta segunda-feira (23) ter encontrado 163 trabalhadores em condições análogas à escravidão nas obras da nova fábrica da montadora de veículos elétricos BYD, em Camaçari (BA). Os funcionários, diz o MPT, seriam da empresa terceirizada Jinjiang Group.

Parte da obra foi interditada pelo órgão, que montou uma força-tarefa para resgatar os operários. Ela conta com representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), pela Defensoria Pública da União (DPU) e pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), além do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal (PF).

No local, segundo o MPT, trabalhadores eram submetidos a jornadas de trabalho que excedem o permitido na legislação brasileira e não teriam período de folga. Em apenas um dos cinco alojamentos as condições não demandaram o resgate de trabalhadores.

O MPT lista problemas relacionados à falta de colchões em camas, quantidade insuficiente de banheiros, falta de assentos sanitários, ausência de local para lavagem de roupa, cozinhas sem armários e proximidade de material de construção civil próximo aos alimentos.

MPT fala em31 trabalhadores para um banheiro

Em um dos alojamentos, na Rua Colorado, trabalhadores dormiam em camas sem colchões ou armários para pertences pessoais, que ficavam misturados junto a materiais de alimentação — um só banheiro atendia a 31 trabalhadores que, segundo o órgão, precisavam formar uma fila às 4h para sair ao trabalho às 5h30.

Em outro caso, um quarto ocupado por uma cozinheira abrigava panelas com alimentos já preparados e abertos no chão. Sem refrigeração, eles seriam servidos no dia seguinte.

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“A obra apresentava múltiplas irregularidades relacionadas ao ambiente de trabalho, levando ao embargo das atividades de escavações profundas e à interdição parcial de estabelecimento, especificamente da cozinha de um dos alojamentos na Rua Colorado”, diz publicação do MPT. “Uma serra circular de bancada também foi interditada por não possuir qualquer medida de segurança.”

Investigações

O Ministério Público do Trabalho iniciou fiscalizações na fábrica em meados de novembro, após denúncias sobre condições irregulares de trabalho nas obras.

Poucos dias após a denúncia, o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), afirmou “confiar” na BYD. O governador esteve em uma visita controlada promovida pela empresa para a imprensa da qual o Infomoney participou.

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Na ocasião, o vice-presidente sênior da companhia no Brasil, Alexandre Baldy, disse que “a BYD respeita as leis brasileiras, ela trabalha dentro de toda legislação municipal, estadual e federal. Sejam de relação trabalhista, relação com meio ambiente ou comercial com as empresas que prestam serviços”.

O Infomoney pediu um posicionamento da companhia quanto ao anúncio feito pelo MPT nesta segunda-feira, mas não recebeu resposta até a publicação da matéria.

O Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e emprego marcaram uma audiência virtual para o próximo dia 26 para que BYD e Jinjang apresentem as providências necessárias à garantia das condições mínimas de alojamento e também para que sejam negociadas as condições para a regularização geral.

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Por enquanto, os trabalhadores seguem nos alojamentos, mas não estão permitidos a trabalhar e seus contratos foram rescindidos.

Segundo o MPT, os trabalhadores eram obrigados a pagar caução e tinham retido 60% de seus salários. A rescisão antecipada do contrato implicava na perda da caução e dos valores retidos, além da obrigação de custear a passagem de volta e restituir o valor da passagem de ida.

O órgão aponta que, caso um trabalhador quisesse rescindir seu contrato após seis meses, os descontos e passagens o levariam a não receber efetivamente nada pelo trabalho.

Iuri Santos

Repórter de inovação e negócios no IM Business, do InfoMoney. Graduado em Jornalismo pela Unesp, já passou também pelo E-Investidor, do Estadão.