Dólar aumentou 1 real no ano e ‘tá tudo caro’; o que acontece se a moeda for a R$ 6?

Desvalorização do real frente ao dólar impacta no bolso do brasileiro por meio da inflação

Monique Lima

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O dólar comercial estava avaliado em R$ 4,94 em janeiro de 2024, e agentes do mercado financeiro projetavam que a moeda norte-americana fecharia o ano no mesmo nível, em R$ 4,92, conforme o Boletim Focus. Corta para novembro: o dólar está na faixa dos R$ 5,80, com a projeção revista para R$ 5,48 ao fim do ano (com algum otimismo). 

Entre cotações máximas e mínimas ao longo do ano, o preço do dólar aumentou 1 real inteiro, uma amplitude que foi vista no mesmo nível – e até um pouco maior – em 2022, mas com uma diferença importante: naquele ano, a moeda estrangeira passou por grandes oscilações, mas com tendência baixista. A tendência agora é de alta

“Um real inteiro de aumento é uma pancada. O impacto no preço dos alimentos é rápido e no custo das empresas também, que vão acabar repassando para a população de qualquer forma”, diz Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV.

“Mesmo que o valor [do dólar] à vista recue, o que aumentou ficou e já tem o seu impacto.”

— Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV

 A desvalorização do real diminui o poder de compra da moeda brasileira em relação ao resto do mundo. Produtos e insumos importados, em geral, ficam mais caros. Desde a “blusinha” da Shein até o fertilizante do arroz e a ração dos bois. 

Carrinho mais caro 

Muitas matérias-primas e produtos comercializados por aqui são importados, como insumos da indústria química e farmacêutica, perfumes, chocolates e vinhos, ou itens mais básicos, como trigo para o pão e combustível para automóveis.  

Mesmo o que é produzido no Brasil também é influenciado pelo dólar. Alimentos como soja, carnes, café, açúcar e milho são negociados em moeda estrangeira, de modo que, quando o dólar está mais caro em relação ao real, fica mais vantajoso para o produtor exportar, diminuindo a venda desses itens na economia doméstica

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O resultado é o mesmo nos dois casos: tudo fica mais caro

André Almeida, gerente do índice de inflação do Brasil (IPCA) no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , afirma que o aumento de preços acontece em cascata e não tem um prazo – logo quando o dólar aumenta ou um mês depois –, depende exclusivamente da decisão do produtor ou empresário. 

“As empresas estão sempre atentas a essa variável, porque é uma decisão importante para o negócio. Independente do dólar subir 10% no mês ou no ano, o que muda é a percepção do consumidor, porque, para os negócios, seja um aumento gradativo ou abrupto, o impacto será minimizado de alguma forma”, diz Almeida. 

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O gerente cita como exemplo o preço da carne. Segundo ele, a exportação de carne está maior em 2024 do que no ano passado e o preço do dólar pode ser uma das variáveis consideradas para isso. 

Segundo o IPCA de outubro, divulgado pelo IBGE, o preço das carnes no acumulado do ano subiu 6,28%, enquanto a variação do índice em geral de inflação foi de 3,88%. A carne de porco foi destaque de aumento, com alta de 7,71% desde janeiro, enquanto o corte patinho, da carne bovina, subiu 9,43%. Outros itens importantes na exportação como arroz (+9,71%), açúcar (+4,39%), café (+29,94%) e feijão (+11,97%) também acumularam altas maiores do que o índice geral ao longo de 2024

Almeida, no entanto, alerta para o fato de que alimentos também estão passando por pressões de natureza climática, com quebra de safras por excesso de chuva ou sol, entre outros problemas no plantio, como pragas. 

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“Além da questão cambial, a questão climática tem sido recorrente. De modo geral, os preços se movem por multifatores e o aumento do dólar é um desses fatores. O que pode acontecer é o dólar estar relacionado a mais de uma das variáveis”, diz. 

Para além dos alimentos, roupas, combustíveis (gasolina e etanol), eletrodomésticos e viagens também são afetados pela moeda americana mais forte que a nacional. 

“Tudo isso é aumento no custo de vida. A inflação vai deteriorando o poder de compra. Ela [a inflação] pode diminuir, mas isso significa que vai aumentar os preços mais devagar, não que vai retroceder para o valor de um ano atrás”, diz Padovani. 

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O que acontece se o dólar chegar a R$ 6? 

Para efeitos de inflação e repercussão nos preços cotidianos, Almeida afirma que é indiferente o dólar cruzar a marca de R$ 6,00. 

“O IBGE não faz previsão e nem trabalha com projeção. O fato é: o real mais desvalorizado influencia diretamente nos preços de forma inflacionária. Agora, o nível desse impacto só pode ser mensurado depois que acontece”, diz o gerente do IPCA. 

No Banco BV, a equipe de análise macroeconômica vislumbra essa possibilidade para 2025, principalmente após a vitória de Donald Trump como presidente nos Estados Unidos, devido às políticas que o republicado prometeu na campanha.

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A expectativa é por um dólar mais forte no mundo, logo, um dólar mais forte no Brasil.  Em novembro de 2024, a projeção de Padovani e sua equipe é de um fechamento do câmbio a R$ 5,90 ao fim de 2025, mas claro, com altos e baixos ao longo do ano. 

O câmbio não deve dar alívio. Vai embora agora”, diz o economista-chefe ao avaliar o cenário inflacionário no mundo, não só no Brasil. “Dólar subindo, aumenta o custo das empresas de forma geral, insumos e dívida, vai respingar na inflação e no custo de vida da população.”