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Como ocorre ao fim de todo processo eleitoral, um conjunto de narrativas, principalmente no que diz respeito aos supostos “vencedores” e “perdedores”, são formuladas pelos observadores do cenário político. Tais narrativas, muitas vezes, incorrem no equívoco de relacionar automaticamente o pleito municipal com as eleições gerais subsequentes.
Ao olharmos para as eleições municipais deste ano, uma primeira constatação é que o pleito representou uma vitória do modelo tradicional de fazer política, em que pese o fenômeno representado pelo antiestablishment Pablo Marçal (PRTB) em São Paulo. Vejamos, nas capitais, dos 20 prefeitos que buscavam a reeleição, 16 conquistaram um novo mandato, o que significa um índice de reeleição de 80%.
Esta força dos incumbentes tem relação com os fundamentos tradicionais de campanha como:
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- A força a máquina;
- O peso das alianças políticas e das estruturas partidárias;
- A relevância do tempo de televisão como instrumento de comunicação política, sobretudo pelo impacto das inserções veiculadas durante o período eleitoral, que divide o protagonismo com as redes sociais; e
- A forte relação entre o direcionamento das emendas parlamentares e o sucesso eleitoral dos prefeitos, principalmente entre os partidos do chamado centrão.
Outra característica do pleito municipal foi o voto retrospectivo. Ou seja, os prefeitos bem avaliados foram “premiados” com a reeleição ou conseguiram eleger seu sucessor.
A segunda é que, ao contrário de algumas narrativas construídas, as eleições municipais não significaram o desgaste da polarização nacional entre o presidente Lula (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Apesar do bom desempenho de partidos de centro como o PSD e o MDB, que foram as siglas que mais elegeram prefeitos no país, a pauta do debate eleitoral foi os temas das cidades, não sendo possível estabelecer uma relação automática entre os resultados das eleições municipais com a disputa de 2026.
Quanto à polarização, é importante observar que, na primeira rodada de pesquisas do instituto Quaest nas 26 capitais, foi perguntado aos eleitores se eles preferiam prefeitos ligados ao presidente Lula (PT), ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ou independentes. Ao fazermos uma média das respostas constatamos que 43% dos entrevistados responderam que preferiam prefeitos independentes. 28% disseram que desejavam alguém ligado a Lula; e 27% manifestaram preferência por prefeitos vinculados a Bolsonaro. Esses números mostram que, de um lado, a maioria dos eleitores queriam prefeitos independentes. Entretanto, 55% dos eleitores manifestaram a preferência por prefeitos ligados a Lula ou Bolsonaro. Ou seja, a polarização nacional, embora não tenha sido o centro do debate municipal, segue presente.
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Outra narrativa observada envolve a vitória da direita sobre a esquerda nas eleições municipais. De fato, o desempenho dos partidos de direita foi superior aos de esquerda. Entretanto, novamente é realizada uma “confusão” entre o resultado do pleito municipal com 2026. Embora os partidos de direita tenham tido um melhor desempenho, principalmente quando comparamos PL e PT, podemos identificar um paradoxo.
A direita, mesmo com o desempenho positivo, está dividida. Jair Bolsonaro teve embates com governadores vistos como potenciais presidenciáveis como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União Brasil-GO) e Ratinho Júnior (PSD-PR). Além disso, a direita, quando olhamos para 2026, está fragmentada e não possui um candidato natural ao Palácio do Planalto, já que Bolsonaro está inelegível. Porém, a reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB), em São Paulo, fortalece politicamente Tarcísio, que desde o primeiro momento se engajou na campanha de Nunes à reeleição. A esquerda, por outro lado, tem um pré-candidato estabelecido – o presidente Lula (PT) – sem que haja um competidor postado com o mesmo peso político.
Assim, por mais paradoxal que isso possa parecer, a vitória da direita não representou um revés para o governo Lula, pois as eleições municipais não foram nacionalizadas. Outra questão a ser observada é que dos seis partidos que mais elegeram prefeitos – PSD, MDB, União Brasil, PL, PP e Republicanos – somente um deles – o PL – é de oposição a Lula.
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Evidentemente que o PT, assim como Lula, terá desafios importantes até 2026, sobretudo a consolidação de alianças com o centro político, principalmente PSD e MDB. Além disso, de acordo com a recente pesquisa Quaest sobre 2026, embora Lula lidere o cenário eleitoral, a maioria dos entrevistados, inclusive os eleitores de baixa renda – importante pilar de sustentação social do lulismo –, entendem que o presidente não deve buscar uma nova reeleição.
O cenário para a direita, de outro lado, também não é confortável. Além da necessidade de construir um candidato ao Palácio do Planalto para enfrentar Lula, precisará se unir, já que as eleições municipais, apesar de não terem sido nacionalizadas, deram indícios de uma divisão entre a direita tradicional e o bolsonarismo. Embora possam ser aliados, a direita e o bolsonarismo não são um bloco monolítico.
Essas considerações iniciais sobre as eleições municipais de 2024 mostram que as narrativas construídas no calor do acontecimento, precisam ser vistas como cautela, afinal de contas, não há uma relação automática entre o resultado eleitoral deste ano com 2026.
De um lado, o desempenho positivo dos partidos de centro e direita parecem indicar que essas siglas tendem a ter um desempenho positivo no pleito subsequente ao Congresso Nacional. Porém, a nacionalização do resultado de 2024 deve se restringir a isso, já que em relação à disputa pelo Palácio do Planalto temos um cenário complexo pela frente.