Dólar pode seguir se valorizando com juros altos por mais tempo nos EUA? Entenda

Analistas admitem que Fed pode não cortar tanto os juros, mas outros fatores devem beneficiar o real no médio prazo

Leonardo Guimarães

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O aumento da diferença entre os juros nos Estados Unidos – em queda – e os brasileiros – em ciclo de alta – foi o principal motor da valorização de 2,53% do real ante o dólar no terceiro trimestre deste ano. A expectativa do mercado financeiro era de que a alta da Selic combinada aos juros baixos lá fora seguisse atraindo investimentos para cá e apreciando nossa moeda. Mas esta tese está ameaçada.

Indicadores de emprego divulgados na semana passada nos EUA mostraram que o mercado de trabalho segue aquecido. A inflação ainda não chegou ao nível ideal, mas parece sob controle e, por isto, o mercado passou a projetar que o Federal Reserve (banco central dos EUA, Fed) vai promover cortes menores nos juros. Isto deixaria o investimento no Brasil menos atrativo, já que daria para ganhar mais dinheiro investindo na segurança da maior economia do mundo.

“Havia uma expectativa de uma distância entre os juros brasileiros e americanos aumentando 100 pontos-base (pb, ou um ponto percentual) só em novembro, com Fed reduzindo 0,5 pb e Copom aumentando 0,5 bp; mas tivemos surpresas positivas na inflação daqui, com IPCA-15 mais fraco do que o esperado e os EUA afastaram um temor de recessão”, explica Lucas Farina, analista econômico da Genial Investimentos. 

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No próximo dia 7 de novembro, os comitês de política monetária dos BCs brasileiro e americano divulgam novas decisões sobre os juros em seus países. As mudanças de expectativa citadas por Farina derrubariam a diferença entre Selic e Fed Funds de 6,75 ponto percentual para 6,5. Já se a expectativa da minoria (13%) dos investidores brasileiros se cumprir, com alta de apenas 0,25 ponto percentual da Selic, a distância seria ainda menor, de 6,25 ponto percentual. 

“Hoje as projeções são, com certeza, mais altistas para os Estados Unidos”, diz Thomas Gibertoni, especialista em investimentos da Portofino Multi Family Office.

“O mercado levou a taxa final (de juros nos EUA) para perto de 2,80% ao ano por lá. Isso era muito otimista. Hoje, vemos uma taxa terminal mais perto do intervalo entre 3,25% e 3,5%.”

Dólar vai disparar? 

Se o maior diferencial de juros, que ajudou a segurar o real no último trimestre, está ameaçado, por que, então, bancos e corretoras não estão aumentando as projeções para o dólar?

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Itaú e Santander divulgaram revisões de cenário na última sexta-feira (4) sem mudanças na estimativa de dólar a R$ 5,40 no fim de 2024. No Boletim Focus, a mediana das projeções também segue no mesmo patamar. 

A explicação está em um cabo de guerra com notícias favoráveis ao real. Se de um lado a diferença menor de juros pressiona para um dólar mais alto, dois fatores puxam a corda para o outro lado: estímulos da China ao setor imobiliário e a elevação da nota de crédito do Brasil pela Moody’s

Para Farina, o preço das commodities potencialmente mais alto e a possibilidade de entrada do estrangeiro no País “podem mais do que compensar” o diferencial de juros menor, já que as medidas devem atrair investimentos nas empresas brasileiras.

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Além disso, conflitos no Oriente Médio fizeram o petróleo ganhar valor, o que pode fazer dinheiro estrangeiro entrar no Brasil via petrolíferas.  

O Itaú parece concordar com esta visão e projeta dólar caindo para R$ 5,20 em 2025. “A possível retomada do crescimento mais forte da economia chinesa, através do novo pacote de estímulos anunciado pelo governo em setembro, pode ajudar a sustentar os preços das commodities e beneficiar o real adiante”. 

Gibertoni diz que “o diferencial de juros está fazendo a parte dele” e o valor justo para o dólar é de R$ 5,35, mas “prêmio de risco é natural; por isso, pode chegar a R$ 5,40 ou até R$ 5,45”. 

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O prêmio de risco citado pelo especialista se dá, principalmente, pela desconfiança de investidores locais e estrangeiros na política fiscal do Brasil.

O Santander diz que “a indisposição do governo em cortar gastos fica cada vez mais clara”, o que atrapalha o desempenho do real. Já o Itaú cita “surpresa negativa com o relatório bimestral de receitas e despesas de setembro, que reduziu a contenção de gastos”.