Cid Moreira queria deserdar filho: é possível tirar herdeiro de testamento no Brasil?

Advogados afirmam que existem possibilidades previstas na lei brasileira para que um herdeiro necessário perca seu direito

Anna França

Reprodução/Instagram/Record
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A morte do apresentador Cid Moreira nesta quinta-feira (3) trouxe à tona novamente uma briga familiar que se arrasta desde 2021, quando seus filhos, Rodrigo e Roger Moreira, entraram na Justiça para pedir a interdição do pai e investigar se sua mulher, Fátima Sampaio Moreira, estaria dilapidando o patrimônio do apresentador. Os dois alegavam que ela teria se apoderado dos bens de forma “ilegal e abusiva”, aproveitando-se da senilidade do pai.

Segundo informações de entrevistas na época, Fátima teria transferido para sua própria conta e de parentes mais de R$ 40 milhões de Moreira, além de vender 11 dos 18 imóveis de sua propriedade. O ex-âncora do Jornal Nacional, no entanto, conseguiu comprovar sua sanidade e declarou em entrevistas que seus filhos “erraram de maneira definitiva, motivados por interesses financeiros, e por isso sentia vergonha de Roger e Rodrigo.”

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O Ministério Público do Rio de Janeiro pediu, em 2023, que o processo movido pelos filhos fosse arquivado, após visitar a casa do apresentador e constatar que ele não sofria maus-tratos. Na época, o promotor que analisou o caso afirmou que não havia indícios que sustentassem a denúncia.

Diante de tudo isso, Cid Moreira anunciou que iria “deserdar os dois filhos”, alegando injúria. Ele citou que excluiria especialmente Roger, que era seu sobrinho e foi adotado pelo apresentador e sua ex-esposa quando tinha 14 anos.

Mas será que é possível deserdar filhos?

Considerados herdeiros necessários, os filhos têm direito a 50% do patrimônio de seus pais e não podem ser deserdados, como acontece nos Estados Unidos, segundo advogados especialistas em sucessão ouvidos pelo InfoMoney. As únicas maneiras que podem impedir um filho de receber sua parte na herança ocorrem quando o filho atenta contra a vida de pais e familiares, como ocorreu no caso de Suzane von Richthofen, ou quando cometem injúria e difamação grave.

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Segundo a advogada Júlia Moreira, sócia da área de família do PLKC Advogados, no caso dos filhos de Cid Moreira, as ações tiveram o intuito de difamar, principalmente a esposa de Cid, conforme os fatos relatados nas reportagens. “Isso faz com que incorram na situação prevista no art. 1.814 do Código Civil, podendo se tornar indignos à herança, porque, ao entrarem com ação alegando desvio de recursos e imputando crimes a ela, atingem a honra da pessoa”, afirma.

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Contudo, para que sejam efetivamente excluídos do recebimento, será necessário que haja uma sentença judicial confirmando e reconhecendo a hipótese de indignidade.

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Júlia lembra ainda que a adoção de Roger é um processo irreversível, e Cid não pode desfazer o ato pelo qual reconheceu voluntariamente um filho. “Uma vez reconhecido, o filho adotivo constará sim no rol dos herdeiros necessários, que têm direito a receber uma parcela legítima na herança”, disse.

Por outro lado…

Caso as alegações de Rodrigo e Roger Moreira de que Fátima estaria dilapidando o patrimônio do apresentador com o intuito de prejudicar a herança legítima dos herdeiros fossem comprovadas, o Judiciário poderia aplicar a chamada “pena de sonegados”, de acordo com a advogada Laísa Santos, especializada em Direito de Família e Planejamento Sucessório.

“Sonegados são aqueles bens que deveriam ter sido inventariados ou trazidos à colação na época do falecimento, mas não o foram, pois foram ocultados pela pessoa que exerceu o encargo de inventariante ou por algum dos herdeiros. Como consequência, a pena de sonegados constitui uma sanção civil, gerando a perda do direito sobre os bens ocultados por parte da atual esposa”, explica Laísa.

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A advogada Marina Dinamarco alerta, no entanto, que testamentos alegando questões de injúria precisam estar muito bem fundamentados, com provas concretas de que houve efetivamente aquilo que é citado, para que não sejam contestados. “Sempre recomendo, em caso de brigas entre filhos e interdições por incapacidade, que provas concretas sejam incluídas para que não haja margem para contestação”, explica.

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Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro