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Boa Safra tenta driblar “tempestade perfeita” no agro e mira oportunidades no mercado

Em meio a crise de crédito e onda de recuperações judiciais no setor, empresa busca aumentar market share e monitora possíveis aquisições

Marcos Mortari

Fundadores da Boa Safra, os irmãos Marino Colpo (CEO) e Camila Colpo (Presidente do Conselho de Administração) | Foto: Divulgação
Fundadores da Boa Safra, os irmãos Marino Colpo (CEO) e Camila Colpo (Presidente do Conselho de Administração) | Foto: Divulgação

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Uma “tempestade perfeita” atingiu diferentes segmentos do agronegócio em 2024. A combinação de preços mais baixos (e, consequentemente, margens mais apertadas), juros elevados e a conta cobrada por eventos climáticos extremos deflagrou uma onda de recuperações judiciais que acendeu o sinal de alerta entre investidores.

No mercado financeiro, o clima é de cautela em meio à percepção de que ainda mais players poderão ficar pelo caminho na travessia da crise e diante de uma espécie de “correção” após anos de fluxos intensos de recursos para o agronegócio.

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A avaliação de analistas que acompanham o setor de perto, no entanto, é de que o momento também oferece boas oportunidades para empresas com fôlego de caixa ganharem participação em mercados mais pulverizados − e até irem às compras em busca de “pechinchas”.

Diante deste cenário, um dos segmentos vistos como “bola da vez” no agro é o de sementes, em razão de uma exposição menor aos riscos recentes observados e de melhores condições de alavancagem de algumas empresas. Além de margens mais interessantes pelo valor agregado do produto trabalhado − consequência do crescente uso de tecnologia para o aumento de produtividade.

Para entender melhor o ambiente para o segmento, o InfoMoney visitou o novo escritório da Boa Safra (SOJA3), inaugurado em agosto em Brasília.

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A companhia é líder na produção de sementes de soja no Brasil, mas ainda detém apenas 8,5% de market share e enxerga o atual momento como uma oportunidade para ganhar participação. Sua ação atualmente tem recomendação de “compra” por 11 casas do mercado, com um preço-alvo que varia de R$ 16,50 a R$ 22,00 (na última sexta-feira (27), os papéis SOJA3 fecharam cotados a R$ 12,00).

De Formosa para o Brasil

Fundada em 2009 pelos irmãos Marino Colpo (CEO) e Camila Colpo (presidente do conselho de administração), a Boa Safra nasceu como empresa familiar, mas chegou à B3 12 anos depois, com a promessa de ser um case de crescimento. De um ano antes do IPO (Oferta Pública Inicial, da sigla em inglês) para cá, a companhia viu seu faturamento anual sair de R$ 625,21 mil em 2020 para R$ 2,13 milhões em 2023 (uma alta de 241%).

Desde então, a companhia investiu cerca de R$ 600 milhões. Comprou fatia de 2/3 da Bestway Seeds, empresa focada na produção de sementes de milho, e 45% da Dasoja, especializada na produção de sementes de soja. Em abril, realizou um processo de follow-on (nome em inglês para oferta subsequente de ações) em que captou mais R$ 300 milhões para investir em expansão de negócios de armazenamento, por meio de Unidades de Beneficiamento de Sementes (UBS) e Centros de Distribuição (CD).

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Em consonância com o plano de expansão vendido ao mercado, a Boa Safra também arrematou ao longo do ano dois terrenos – um em Campo Novo do Parecis (MT), em valor não revelado, e outro em Ribeirão Cascalheira (MT) com preço justo informado de R$ 1,5 milhão – para a construção de centros de distribuição. Boa parte dos recursos captados no follow-on, no entanto, seguem à disposição para novos movimentos.

Apesar da ansiedade do mercado, o comando da companhia prefere manter os pés no chão e diz não querer acelerar os próximos passos. “Não temos pressa”, diz Felipe Marques, Chief Financial Officer (CFO) da Boa Safra. “Tivemos o recurso do follow-on, mas não precisamos sair correndo para fazer alguma alocação de capital. Há boas oportunidades no mercado. E se não tiver uma que não está do jeito que gostaríamos, haverá outra. Não existe essa escassez.”

Um dos fundadores da empresa, Marino Colpo, atual Chief Executive Officer (CEO), conta que a missão da Boa Safra é levar ao mercado sementes de qualidade, com tecnologia de ponta, de modo a permitir ganhos de produtividade aos clientes.

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Embora as margens menores decorrentes da queda dos preços de grãos no mercado pressionem o orçamento dos produtores (clientes da Boa Safra), a empresa acredita que o investimento em sementes de alta tecnologia será cada vez mais estratégico. Com ele, seria possível encurtar ciclos e até entrar em duas safras de culturas distintas em um ano.

Colpo costuma comparar o papel de sua companhia ao de uma fabricante de celulares. O aparelho vem acompanhado de “softwares” e um “sistema operacional”, que neste caso corresponderia à genética ou à biogenética desenvolvida por uma multinacional parceira. O Windows seria da “Bayer”, o iOS, da “Syngenta”, e o Android, da “Basf”, por exemplo.

A Boa Safra fabrica suas sementes com essas tecnologias. O resultado do processo, argumenta o executivo, é decisivo para determinar quantas sementes vão nascer e quantos pés por hectare será possível plantar. Hoje, a companhia oferece mais de 70 variedades de sementes de soja, para condições específicas de solo, clima, regime de chuvas e doenças. E também quer crescer nos mercados de milho, sorgo, feijão e forrageiras, onde ainda detém participação menor.

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Apesar de um ceticismo inicial de investidores, os executivos da Boa Safra contam que têm notado crescente disposição de produtores em investir mais em sementes diferenciadas por entenderem o valor do movimento sobre os resultados. “Hoje, a discussão do produtor é qual seria o maior teto produtivo que ele pode atingir e com quais insumos. O produtor que ganha dinheiro hoje no Brasil não é aquele que economiza em custo, é o que tem maior produtividade. Isso está claro. O produtor se deu conta disso e faz essa conta”, aponta Felipe Marques.

“Ficou muito claro para o produtor que o protagonismo da produtividade dele vem da semente. Não adianta ter o melhor fertilizante, o melhor defensivo, se ele economizou na semente. Como o custo de produção é alto (ou seja, é preciso mais sacas para pagar a produção), no fim do dia, ele vai economizar na semente?”, prossegue.

Antes da abertura de capital, o CFO conta que as operações da Boa Safra se concentravam em um raio de cerca de 300 km. A entrada na Bolsa, diz o executivo, permitiu uma expansão, que agora se materializa na mudança de escritório de Formosa (GO), município de pouco menos de 116 mil habitantes, para a capital Brasília.

Mas não só. A empresa também conta com 5 Unidades de Beneficiamento de Sementes em áreas estratégicas do agro: Formosa (GO), Buritis (MG), Cabeceiras (GO), Jaborandi (BA) e Primavera do Leste (MT). E 3 Centros de Distribuição, em Sorriso (MT), Balsas (MA), Paraíso (TO), Campo Novo do Parecis (MT) e Ribeirão Cascalheira (MT). Em parceria com a Bestway, há outras duas unidades em Uberlândia (MG) voltadas ao tolling de milho.

“Hoje temos uma atuação em 100% do Brasil”, celebra Marques. “A transformação que tivemos para sermos uma empresa nacional nos dá muito mais capacidade para alocar melhor o capital. Agora temos mais opções”, explica. Com operações espalhadas pelo País, a companhia ganha em escala, competitividade e mitiga riscos por diversificar sua carteira de exposição a riscos associados ao comportamento da natureza.

Na inauguração do escritório, Marino Colpo disse que escolheu Brasília por ser um polo para o agronegócio – além de aproximar a empresa do centro das decisões estratégicas do País e de ponto estratégico para a atração de talentos.

“Aqui é mais do que um espaço físico. É também o símbolo da nossa missão: somos ambiciosos, queremos chegar longe, queremos ter um local bastante tecnológico para que consigamos trazer inovação”, disse a uma plateia formada por colaboradores, fornecedores e investidores da Boa Safra.

O movimento ousado contrasta com a pressão enfrentada por pares do agronegócio, que enfrentam restrição de liquidez e problemas crescentes para fechar as contas.

O novo escritório da Boa Safra, em Brasília (Foto: Divulgação)

As origens de uma “seca perfeita”

O preço da soja no mercado interno saiu de R$ 207 a saca de 60 quilos no porto de Paranaguá (PR) em março de 2022, para R$ 115 dois anos depois (-44%), e agora marca R$ 140, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), que faz parte do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP).

Movimento similar foi visto com o milho, cuja saca de 60 kg chegou a cair de R$ 103 para R$ 56 na mesma comparação de dois anos. Hoje está negociada na faixa de R$ 63,34. E a média do boi gordo a prazo no estado de São Paulo (referência calculada pelo mesmo Cepea), que caiu de R$ 350 para R$ 230 e hoje opera a R$ 267.

Já no mercado internacional, em uma janela de 30 meses, os preços da soja e do milho na bolsa de Chicago (EUA) apresentaram quedas na casa de 20% e 30%, respectivamente, refletindo um aumento dos estoques globais com produções robustas em países como Estados Unidos e Argentina, e diante de uma lentidão da economia da China.

A queda dos preços gerou forte pressão sobre produtores rurais, que viram crescerem seus custos proporcionais com insumos e arrendamento de terras, por exemplo, comprometendo a capacidade de honrar compromissos financeiros assumidos.

O resultado foi uma espécie de “efeito dominó”, que castigou atores com menor capacidade de caixa para suportar as adversidades do ano.

A seca e o aumento nos registros de incêndios florestais também afetam o cultivo e os resultados gerais do agronegócio. Mais de 5,7 milhões de hectares foram afetados no ano pelo fogo, sendo 1,7 milhão de área de plantio – o equivalente a 2% de toda a área brasileira de cultivo.

Soma-se a isso o novo ciclo de alta de juros, com a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de elevar a Selic para 10,75% ao ano, em um novo aperto para as condições de financiamento do setor. E tudo indica que o movimento deve seguir: a mediana das expectativas de economistas consultados pelo Relatório Focus aponta para uma taxa de 11,50% em dezembro.

Onda de Recuperações Judiciais

Um levantamento feito pela Serasa Experian mostrou um aumento expressivo em pedidos de recuperação judicial no agronegócio. Ao todo, 76 produtores que atuam como pessoas jurídicas tiveram que lançar mão do instrumento legal nos primeiros três meses de 2024 – maior número para um trimestre desde o início da série histórica, iniciada em 2018.

No caso de empresas relacionadas ao setor, foram 82 pedidos no mesmo período, repetindo o recorde observado de janeiro a março de 2023. Já entre proprietários rurais que atuam como pessoas físicas, foram 106 solicitações de recuperação judicial no primeiro trimestre de 2024 – contra 3, 5 e 17 nos três anos anteriores.

Um dos episódios recentes envolve pedido ajuizado, na semana retrasada, pela AgroGalaxy (AGXY3), um dos maiores conglomerados do agronegócio brasileiro, que atua no setor de insumos e serviços. Em fato relevante divulgado ao mercado, a companhia apontou para “eventos climáticos diversos e a deterioração das condições dos mercados brasileiro e internacional” como fatores de pressão sobre sua estrutura de capital. E disse que o pedido visa garantir a sustentabilidade da empresa, a manutenção de serviços prestados e o cumprimento de compromissos assumidos.

Leia também: Com dívida de R$ 700 milhões, Grupo Portal Agro pede recuperação judicial

No pedido de recuperação judicial, a companhia (que atua sobretudo no comércio de insumos e produtos como fertilizantes, sementes, defensivos agrícolas e insumos biológicos) entrou em detalhes sobre os “fatores exógenos” que levaram ao movimento e classificou o momento como a “maior crise no agronegócio brasileiro nos últimos anos”. E listou 7 razões principais para isso:

  1. Queda drástica do preço das commodities (a empresa calcula mais de 20% para a soja no ano e 30% para o milho), que comprimiram margens e atrasaram a compra de insumos e levaram à migração para produtos de menor valor agregado;
  2. Condições climáticas adversas iniciadas no final de 2023 e agravadas em 2024, impactando severamente a disponibilidade hídrica, o suprimento de energia e, consequentemente, a produção no campo;
  3. Altos níveis de estoque a altos custos de aquisição (devido a altas nos preços em 2022), que impactaram negativamente as vendas, a lucratividade e a geração de caixa nos anos seguintes;
  4. Queda drástica do preço de mercado dos insumos agrícolas, gerando tanto uma desvalorização do seu estoque como margens menores no momento da sua comercialização;
  5. Restrições de acesso a crédito, altas taxas de juros e elevados índices de alavancagem dos produtores agrícolas, que resultaram em altos níveis de inadimplência (somando um passivo de R$ 1,6 bilhão de contas a receber atrasadas) e escalada nos pedidos de recuperação judicial de agricultores, gerando maior pressão na liquidez de toda a cadeia de insumos agrícolas;
  6. Aumento das exigências de garantia por parte dos fornecedores, que estressaram ainda mais as cadeias; e
  7. Aumento da sua alavancagem e custo de financiamento.

Leia também: AgroGalaxy: como proteger os investimentos contra pedidos de recuperação judicial?

No pedido ajuizado, o grupo AgroGalaxy conta que a inadimplência de produtores e clientes atingiu a marca de 60% de seu faturamento total em março de 2024. Com a falta de recebimento, as empresas rapidamente tiveram que elevar seu endividamento para compor o caixa. Em um intervalo de 3 anos, a dívida líquida do AgroGalaxy saltou de R$ 786,9 milhões para R$ 1,512 bilhão, com o montante de juros anuais devidos aumentando em 6 vezes, para R$ 623 milhões.

A expectativa da AgroGalaxy e de diversos players do setor é de que o ciclo de baixa seja normalizado em 2025, com a recuperação de preços e condições mais favoráveis de mercado. O que contribuiria para a retomada do agronegócio, que deve sofrer uma retração de 1,6% no Produto Interno Bruto (PIB) setorial neste ano, conforme novas estimativas do Banco Central.

Enquanto isso não acontece, analistas do mercado financeiro veem riscos crescentes às companhias com níveis mais elevados de endividamento, menor capacidade de caixa e maior exposição a produtores com margens comprimidas diante de preços menores. Isso porque produtores impactados por margens abaixo da média estão adiando a compra de insumos e atrasando pagamentos sobre insumos já adquiridos.

O cenário de crise para o crédito no agro acertou em cheio o mercado de Fundos de Investimentos em Cadeias Agroindustriais (Fiagros), que chegou a ver cotas registrarem perdas acumuladas na casa de 18% em setembro.

Separando o joio do trigo

Especialistas no setor pontuam que o movimento observado na AgroGalaxy não deve, porém, ser visto como um indicativo de crise generalizada, apesar dos desafios maiores para o agronegócio de uma forma geral. O quadro da companhia está muito associado ao momento do mercado de fertilizantes e ao resultado de estratégias adotadas recentemente.

O Brasil é importador de diversos insumos, sendo muitos deles utilizados nas culturas de grãos, que sofreram uma forte queda nos preços em 2024. No ano passado, houve relevante estocagem de fertilizantes e defensivos, em movimento que, combinado com uma demanda mais fraca pelos produtores, pressionou as margens de companhias revendedoras, como a própria AgroGalaxy.

“As preocupações crescentes com as importações de insumos [desde o início da guerra entre Rússia e Ucrânia] levaram os participantes do mercado brasileiro, principalmente os varejistas agrícolas, a reforçar seus níveis de estoque ao longo de 2022, tanto de fertilizantes quanto de defensivos agrícolas. No entanto, somos da opinião de que a tendência de alta nos estoques não foi atribuída apenas a apreensões de oferta”, observaram os analistas Leonardo Alencar, Pedro Fonseca e Samuel Isaak, da XP investimentos, em relatório distribuído a clientes.

“Alguns varejistas agrícolas podem ter procurado capitalizar as margens elevadas expandindo seus estoques. Essa tendência fez com que o setor entrasse em 2023 com estoques que superavam as médias históricas. Embora seja difícil estimar números precisos sobre os insumos agrícolas do Brasil, tanto as consultorias quanto os varejistas agrícolas indicam que o setor normalmente opera com estoques equivalentes a quase 15% das vendas anuais. Em 2023, os níveis de estoque haviam aumentado para 30-35% das vendas”, explicaram.

“Além dos estoques mais altos no Brasil, o mercado internacional também testemunhou um aumento dos estoques, já que o setor aumentou os níveis de produção após anos de margens favoráveis em meio ao boom das commodities, o que pesou sobre a perspectiva já negativa dos participantes brasileiros”, pontuaram os especialistas.

Para eles, a combinação de aumento de estoques, tanto em escala global quanto entre varejistas agrícolas brasileiros, levou a uma redução de preços. Também houve uma redução na utilização de insumos, já que as menores margens teriam motivado reduções nos custos com utilização de tecnologia (“uma opção viável em muitos casos devido aos níveis substanciais de reservas de nutrientes no solo”, segundo os especialistas).

Semeando oportunidades

Apesar do volume robusto de investimentos desde a abertura de capital, a Boa Safra mantém uma posição de endividamento mais favorável do que alguns pares do setor – o que reforça uma percepção de posição privilegiada no atual momento.

Segundo o último demonstrativo de resultados, com dados referentes ao exercício do segundo trimestre, a companhia mantém dívida líquida de R$ 122 milhões. Em relação ao Ebitda (Lucro Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização, da sigla em inglês), chegou a 0,48 vezes – menos da metade de outras companhias.

Em um cenário de crescente inadimplência no setor, Felipe Marques, o CFO da companhia, conta que foi feita uma provisão robusta de recursos. “Fomos muito questionados na época do follow-on. Tínhamos mais de R$ 500 milhões de contas a receber e todo mundo muito preocupado se teríamos um grande problema, dada a situação de menores margens dos produtores e inadimplência”, lembra.

“Fizemos um PDD (Provisão para Devedores Duvidosos) de forma bem conservadora. Do que entendíamos realmente que tinha um maior risco de não recebimento, provisionamos R$ 7 milhões. Muito disso vamos conseguir receber ainda, mas [isso] mostra que conseguimos fazer nosso dever de casa de tomar todas as medidas da nossa análise de crédito e estruturas para mitigar [riscos]“, ressalta.

Felipe Marques, CFO (Chief Financial Officer) da Boa Safra (Foto: Divulgação)

Os múltiplos favoráveis reforçam as possibilidades para a Boa Safra no mercado para possíveis novas aquisições. “Neste ano, nós nos consideramos muito bem preparados. Está sendo um ano difícil? Sim. Mas acho que é nesses momentos em que mostramos quem é quem”, diz o diretor financeiro da companhia.

“Privilegiamos muito a liquidez. Se você olhar hoje o balanço da Boa Safra, temos dívida líquida negativa, fizemos um follow-on recente, temos uma estrutura de capital com taxas prefixadas e mais de 5 anos de vencimento, temos o CRA mais longo do mercado (20 anos). Também temos imóveis, em que fizemos o sale and leaseback (troca de um bem imóvel por capital de giro, com locação subsequente), desmobilizamos o ativo justamente para privilegiar a liquidez”, explica.

“Nós nos preparamos muito bem como companhia e estamos muito preparados para essa situação de restrição de liquidez que estamos vendo no mercado. O que temos que fazer agora é executar bem nossa estratégia”, pontua o executivo.

Questionado sobre a onda de recuperações judiciais, Felipe Marques minimiza os números gerais no agro e aponta um cenário com desafios, mas também de boas oportunidades. Para ele, mais do que companhias que lançaram mão do instrumento legal, também pode haver negócios com empresas que sequer iniciaram processos de recuperação judicial e enfrentam quadros de restrição maior de liquidez.

O executivo evita antecipar estratégias para possíveis novas aquisições, mas diz que não estão no radar expansões para verticais fora do universo das sementes. “Entendemos que somos uma empresa de sementes e tem muita coisa para fazermos ainda no negócio em sementes. É aqui que estamos gastando nossa energia.”

Uma das apostas da companhia para o atual momento é investir em ganhar participação de mercado não apenas na soja, mas principalmente em outras culturas em que o market share da Boa Safra ainda é menor.

Os analistas da XP que cobrem a companhia chegaram a chamá-la de “joia escondida no campo” em relatório distribuído em março. Do lado dos riscos, eles apontam para possíveis reversões em benefícios fiscais, sobretudo associados ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nos estados.

A diretoria da companhia reconhece o impacto negativo da restrição para subvenções no ICMS, defendida pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aprovada recentemente pelo Congresso Nacional. Mas é a reforma tributária que tem sido monitorada com maior atenção.

“O governo deveria conseguir avançar com isso rápido, porque a pior coisa para a economia é a imprevisibilidade. Sem previsibilidade, é difícil até fazer cálculo e tomar suas decisões de investimentos no final do dia”, pontua Felipe Marques.

Apesar dos desafios, o executivo mantém o otimismo com o futuro para o agronegócio e destaca diferenciais da Boa Safra: “A riqueza da Boa Safra é ter toda a energia de uma empresa pequena, que era uma empresa familiar, com a governança e tantas boas pessoas e recursos que nos ajudem a tomar as melhores decisões.”

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.