Ibovespa: quais os possíveis cenários com cortes de juro pelo Fed e altas pelo Copom?

Em 18 de setembro, na próxima Super Quarta, deve haver movimentação de juros; como fica a bolsa brasileira e os índices globais em cada cenário?

Camille Bocanegra

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Há meses, o mercado aguarda ansioso o início dos cortes de juros nos Estados Unidos (EUA). E, há algumas semanas, vem assistindo à possibilidade de alta de juros nos Brasil. Na próxima quarta-feira, 18, os dois eventos devem se materializar na Super Quarta, que contará com decisões dos dois bancos centrais.
Lá fora, o primeiro de alguns ajustes esperados deve vir em 0,25 ponto percentual, de acordo com a ferramenta FedWatch, do CME Group, que aponta 69% de chances hoje para o corte. Nas últimas semanas, dados mais fracos do mercado de trabalho reforçaram a probabilidade de cortes pelo Federal Open Market Comittee (FOMC), mas com ajustes graduais.

Para alguns analistas, a afirmação de Jerome Powell, dirigente do Federal Reserve, sobre a alta do desemprego não ser fruto de escalada em demissões mas sim de aumento de oferta de trabalhadores sugere que o corte pode ser brando. “É uma avaliação ainda benigna e sugere que, embora preocupado com o mercado de trabalho, o Fed mantém a
cautela e o perfil data dependent”, afirma Maykon Douglas, economista da Highpar SA.

Como esperado, o Índice de Preços ao Consumidor (CPI), um dos principais indicadores de inflação dos EUA, trouxe estabilidade, com ligeira alta de 0,2%, de acordo com o previsto pelo consenso LSEG. Com isso, as apostas pelo corte só devem oscilar em relação à magnitude esperada.

Por outro lado, aqui no Brasil, o caminho tem sido inverso. Sinalizações do já indicado próximo presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, apontam para subida da taxa básica de juros, a Selic, logo. A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC será a primeira após a indicação do atual diretor de política monetária e devem já trazer alta. Apesar de algumas visões de que a deflação apresentada pelo IBGE com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) poderia trazer alguma complicação para a decisão do Copom, a visão majoritária ainda é de elevação nas taxas. Contudo, a magnitude do ciclo está em discussão.

Com uma diversidade de possíveis cenários tanto lá fora quanto por aqui, o que esperar dos possíveis cortes nos EUA, das altas na Selic e seus impactos nas bolsas tanto doméstica quando globais?

De acordo com Carla Argenta, economista chefe da CM Capital, há mais fatores a serem analisados do que apenas as decisões de juros. No curto prazo, explica, pontos como tom, magnitude e sinalização adotada por cada banco central também impactam a reação dos mercados. “Sem considerar a dosagem das expectativas frente à política monetária propriamente dita, a queda nos juros internacionais e alta nos juros domésticos sinaliza posterior aquecimento da atividade global e arrefecimento da atividade doméstica”, afirma Carla.

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Para Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV, do ponto de vista macroeconômico, o cenário de alta de juros aqui e queda de juros lá fora é negativo para o nosso mercado acionário, a princípio. Isso porque a variável que mais explica o desempenho da bolsa brasileira é justamente a taxa de juros local. No entanto, o impacto tende a ser atenuado pelo corte lá fora. “Todo ciclo de aperto monetário, sabe-se como começa, mas nunca se sabe aonde acaba, porque o Banco Central vai testando, ninguém tem uma ideia precisa de qual a intensidade necessária dos apertos”, afirma.

Confira os panoramas projetados para cada um dos casos:


1. FOMC realiza corte de 0,25 p.p. e Copom eleva Selic em 0,25 p.p.

Para Paulo Gala, economista chefe do Banco Master, esse é o cenário mais provável para as taxas. O cenário do IPCA divulgado na última terça não muda, em sua visão, a expectativa para elevação de juros por aqui. “Quanto mais o Fed corta juros em termos de ciclo longo ou de tamanho do corte, mais facilita a vida para o Brasil porque a taxa de câmbio se aprecia mais, vem mais fluxo de capital para cá. E quanto mais o câmbio aprecia, mais fácil controlar a inflação no Brasil”, explica.

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Já a Bolsa brasileira, nesse cenário, poderia subir um pouco, dentro da expectativa atual, na visão de Marcelo Mello, CEO da SulAmerica Investimentos. O efeito na Bolsa sempre depende da razão da movimentação de juros. “Se os juros nos EUA estão caindo porque a economia está desacelerando com inflação controlada e no Brasil estamos subindo juros porque a economia está aquecida (nosso base case), a Bolsa brasileira pode subir”, explica.

Esse é o cenário que Gala trabalha, de pequenos cortes de 0,25 p.p. por lá e pequenas altas de 0,25 p.p. por aqui. “Mais ou menos esse é o cenário que a gente tem para hoje e sem dúvida que o IPCA de ontem foi muito bom, contribui para que o ciclo brasileiro seja o menor possível”, afirma.

Para Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos, a decisão de juros americana prevalece sobre os juros brasileiros, então os cortes do Fed impactam mais do que as possíveis altas do BC. Apesar de nenhuma alta na Selic ser bem recebida hoje para a Bolsa, o melhor cenário seria de corte e altas de igual magnitude em 0,25 p.p., uma vez que é o mais esperado.

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Paulo Martins, CEO e fundador da Anova Research, destaca que o corte de juros nos EUA tende a ser positivo para mercados internacionais, estimulando o apetite por risco e favorecendo bolsas globais. O movimento, no entanto, pode enfraquecer o dólar e tornar mercados emergentes mais atrativos. A movimentação de 0,25 p.p. para menos pelo Fed e para mais para Copom, manteria o Ibovespa em tendência de alta, de acordo com Martins. “Continuamos a ver esse cenário como uma oportunidade de reforçar posições em setores estratégicos”, afirma.


2. FOMC realiza corte de 0,25 p.p. e Copom eleva Selic em 0,50 p.p.


Para a Bolsa, esse é visto como o pior cenário. De acordo com Mello, isso sugeriria que o BC teria sido “hawk” (duro, mostrando muita preocupação com a inflação) demais enquanto o Fed ainda estaria no início dos cortes. Com a movimentação, a Bolsa poderia cair um pouco.

Nesse caso, para o especialista da Anova Research, a alta mais acentuada da Selic poderia aumentar a migração para a renda fixa. Mesmo assim, por um corte maior pelo Fed, o fluxo de cambial estrangeiro seria forte o suficiente para sustentar o Ibovespa em trajetória ascendente. “Nosso suporte sólido entre 127-128 mil pontos [para o Ibovespa] continua válido, e qualquer retração deve ser vista como uma oportunidade”, afirma. Na última terça, o Ibovespa fechou a 134.319 pontos.

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3. FOMC realiza corte de 0,50 p.p. e Copom eleva Selic em 0,25 p.p.

Com um corte de juros mais expressivo pelo Fed, o dólar tenderia a enfraquecer e, com isso, é esperado mais fluxo para mercados emergentes, na análise do CEO da SulAmerica Investimentos. Nesse caso, o cenário seria positivo para a Bolsa.

A entrada mais robusta de capital estrangeiro poderia impulsionar o Ibovespa a novas máximas, de acordo com Martins. “A combinação de juros competitivos no Brasil com um corte agressivo nos EUA reforça nossa visão de que o Ibovespa poderá atingir novas altas e, possivelmente, entrar em uma fase de euforia, conforme projetamos para setembro/outubro”, afirma.

Para o estrategista chefe da RB Investimento, um corte mais forte, no entanto, poderia passar a impressão de uma recessão maior do que o esperado e que os cortes estariam “atrasados”. Nesse caso, é possível imaginar recuo das bolsas globais em um movimento de realização, precificando a chance de uma recessão.

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Nesse caso, Padovani também aponta para um possível impacto negativo em commodities na hipótese de um corte maior. O economista reforça que, por se tratar de uma variável que tem muito peso na explicação da bolsa brasileira, uma queda mais forte por lá poderia prejudicar o desempenho do índice por aqui.


4. FOMC realiza corte de 0,50 p.p. e Copom eleva Selic em 0,50 p.p.

Gala comenta que, apesar de considerar pouco provável, o corte de 0,50 p.p. pelo FOMC seria excelente notícia para o Brasil. O ajuste poderia garantir maior apreciação do real, podendo vir para mais perto de R$ 5,00. A elevação da mesma magnitude na Selic também garantiria apreciação cambial mais rápida, maior valorização da moeda brasileira e ajudaria a controlar a inflação. No entanto, o economista considera difícil que o Copom faça isso.

Para Anova Research, a volatilidade de curto prazo poderia aumentar. Nesse cenário, a alta nos juros brasileiros poderia tornar a renda fixa mais atrativa, mas o fluxo estrangeiro ainda seguiria como força importante para sustentar o Ibovespa “pressionado para cima”. Essa perspectiva seria muito positiva, para a Anova, com a bolsa nas máximas históricas.

Já para o CEO da SulAmerica Investimentos, a bolsa brasileira poderia ficar flat (estável), uma vez que a notícia de queda lá fora poderia compensar o impacto da alta por aqui.

5. Outros cenários

Gala sugere que, caso o Fed não cortasse juros agora, seria uma surpresa. Isso poderia causar a desvalorização da moeda brasileira, com taxa de câmbio que poderia ir a R$ 5,70, R$ 5,80. E aí apareceria o efeito inflacionário, em sua visão. Gala também projeta como seria caso o BC optasse por não subir juros agora. “O efeito é muito parecido. O câmbio se desvaloriza aqui e isso tem mais efeito inflacionário”, considera.

Mesmo em cenários alternativos, a SulAmerica Investimentos não projeta nem altas acima de 0,50 p.p. para Selic nem cortes maiores do Fed. No caso do FOMC, um corte mais agressivo poderia sugerir que a economia americana está desacelerando muito rapidamente, o que poderia ser ruim para ativos de risco, segundo Mello. “No caso da Selic, se isso acontecer, a Bolsa brasileira sofreria porque a curva inteira de juros subiria, inclusive os juros de longo prazo”, afirma.

A evolução dos ativos em cada um dos cenários depende, além de outros fatores, da expectativa do mercado até cada decisão de juros, considerando dados que ainda serão divulgados tanto no Brasil quanto nos EUA. Além disso, o tom do comunicado, balanço por riscos e opção ou não por guidance também guiam a reação do mercado, segundo Carla Argenta. A possibilidade de outras decisões, no entanto, não seria fora de cogitação, uma vez que já houve movimento descolado das expectativas anteriormente, como no início do ciclo de alta do BC, em março de 2021.