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Os analistas de mercado têm assumido como cenário base a vitória de Donald Trump nas eleições americanas, e o consenso é que um novo governo Trump trará um choque inflacionário para a economia global. Contrariando as expectativas, não deveria ser descartada a possibilidade de a eleição do candidato do Partido Republicano ser um vetor anti-inflacionário – ou até mesmo deflacionário.
Basta colocar no horizonte a possibilidade de o preço do petróleo entrar em tendência de queda nos próximos anos.
A vitória do candidato de Trump parece algo provável, mesmo com a mudança de oponente. E, amparados nessa tese, os relatórios dos departamentos de pesquisa de bancos globais têm argumentado que o republicano implantará uma política comercial mais protecionista. A título de ilustração, o Banco UBS estimou que a imposição de uma tarifa de 60% sobre as importações da China adicionaria de 36 a 130 pontos-base ao núcleo da inflação dos Estados Unidos.
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Os relatórios também chamam a atenção para a possibilidade de haver menor imigração ilegal e um déficit primário um pouco mais elevado – inferências que também vão na direção inflacionária, implicando menor afrouxamento monetário (ou política monetária mais restritiva) nos próximos anos.
Vivemos em um mundo recém-saído de uma pandemia, com aumento acentuado do endividamento público e elevação das taxas reais de juros, com rolagem das dívidas soberanas mais custosas – e, por conseguinte, demandando cada vez mais recursos financeiros dos respectivos governos. Logo, o aumento da perspectiva inflacionária gerada por um eventual novo governo Trump acarretaria ainda mais pressão sobre as taxas de juros futuras (ao longo de 2024, as taxas de juros americanas de 10 anos saíram de 3,88% em janeiro para 4,2% em julho).
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O curioso nessa conversa é que, apesar da percepção generalizada de maiores protecionismo comercial e déficit primário e menos imigração ilegal, não houve mudança de regime inflacionário durante o primeiro governo Trump (2017-2020). O gráfico abaixo evidencia que, excetuando 2020 (marcado pelo limiar e auge da pandemia), não há diferença nem do núcleo nem da inflação cheia no período 2017 a 2019 em relação aos oito anos anteriores do governo democrata de Barack Obama (2009-2016).
Guerras e petróleo
Já que os números não exatamente confirmam essa percepção, porque não considerar, adicionalmente aos vetores inflacionários já descritos, duas outras promessas feitas por Trump que têm poder para colocar o preço do petróleo em tendência de queda no quadriênio 2025-2028: 1) a resolução dos conflitos na Europa e no Oriente Médio; e 2) a reversão da regulamentação imposta pelos democratas, no atual governo de Joe Biden, para permitir o aumento de poços perfurados e a maior extração de petróleo e gás natural.
De fato, uma queda significativa dos preços do petróleo e do gás teria impacto significativo na redução da inflação nos Estados Unidos e no mundo. Ao mesmo tempo, diminuiria a capacidade da Rússia de financiar os esforços de Guerra contra a Ucrânia, assim como fragilizaria as economias do Oriente Médio, inclusive a do Irã.
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O possível fim das guerras na Ucrânia e em Gaza, assim como a elevação do número de poços perfurados, contribuiriam para aumentar a oferta global de petróleo, gás natural e até mesmo de fertilizantes. Consequentemente, o patamar atual de preço do barril de petróleo diminuiria, com espraiado impacto sobre os insumos da cadeia de produção, contrapondo-se aos vetores inflacionários descritos.
É importante também ressaltar que, como já mostramos na nossa carta comercial de maio, esse contraponto de vetores desinflacionários, com previsão de preço do petróleo e de inflação mais baixos em caso de vitória de Trump, baseia-se em duas hipóteses fundamentais:
A primeira é a manutenção das atuais condições de oferta global de petróleo, que não apresentam qualquer restrição, com crescente diversificação de produtores, da produção, das reservas provadas e da duração média dessas reservas.
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A segunda é que, em um governo republicano, as pautas ambientalistas e de preocupação com as mudanças climáticas não vão se sobrepor aos anseios de menor inflação, com consequente diminuição do custo de vida e de maior expansão da produção de petróleo, gás natural, emprego e renda.
‘Onda vermelha’
Além disso, vale destacar que, em eventual vitória acachapante republicana (a “onda vermelha”, em que o partido ganha não só a presidência na eleição, mas também maioria na Câmara e no Senado), a efetividade dessas medidas anti-inflacionárias será ainda maior e mais rápida. Isso pode tornar o contraponto desinflacionário mais intenso, levando a uma deflação, não mais a inflação no curto prazo.
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Walter Maciel é CEO da AZ Quest
Alexandre Manoel é economista-chefe da AZ Quest e ex-secretário nos ministérios da Economia e da Fazenda (2018-2020)