Lula diz que Campos Neto “tem lado político” e trabalha para “prejudicar o país”

Em entrevista, presidente diz que chefe do BC não tem "nenhuma capacidade de autonomia" e sugere influência de Tarcísio de Freitas

Marcos Mortari

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a fazer duras críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Em entrevista concedida à rádio CBN, na manhã desta terça-feira (18), o mandatário disse que o comportamento da autoridade monetária está “desajustada” e que seu comandante não demonstra “nenhuma capacidade de autonomia”, mas “lado político” e um esforço em “prejudicar o país”.

“Nós só temos uma coisa no Brasil desajustada nesse instante: o comportamento do Banco Central. Essa é uma coisa desajustada. Um presidente do Banco Central que não demonstra nenhuma capacidade de autonomia, que tem lado político e que, na minha opinião, trabalha muito mais para prejudicar do que para ajudar o país. Porque não tem explicação a taxa de juros do jeito que está”, afirmou.

As declarações ocorrem no primeiro dia de reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que amanhã (19) divulgará o novo patamar da taxa básica de juros − a Selic, atualmente a 10,5% ao ano. No mercado, as apostas são de que a autoridade monetária interrompa o ciclo de cortes nos juros e mantenha a taxa no atual patamar, em meio a crescentes preocupações com o cenário fiscal em nível doméstico e olhares mais atentos para o comportamento do dólar.

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Questionado sobre a possibilidade de manutenção da Selic em 10,50%, Lula disse achar “muito triste”. “O Brasil não precisa disso”, disse. “Temos uma situação que não necessita essa taxa de juros. O Brasil não pode continuar com uma taxa de juros proibitiva de investimento no setor produtivo. Como você vai convencer um empresário a fazer investimento se ele tem que pagar uma taxa de juros absurda? Então, é preciso baixar a taxa de juros compatível com a inflação”, prosseguiu.

“A inflação está totalmente controlada. Agora fica se inventando discurso de inflação do futuro, que vai acontecer, vamos trabalhar em cima do real. Realmente o Brasil está vivendo um bom momento. A economia está andando, os empregos estão crescendo, o salário está crescendo, a inflação está caindo. O que mais nós queremos? O que mais nós queremos é atrair mais investimentos para o Brasil e que o Banco Central se comporte na perspectiva de ajudar esse país e não de atrapalhar o crescimento do país”, criticou.

Durante a conversa, Lula lembrou de jantar promovido pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para Roberto Campos Neto. Nos bastidores, especula-se sobre um possível convite para que o atual presidente do BC ocupe o Ministério da Fazenda caso Tarcísio disputa a presidência da República em 2026 e vença. O episódio foi usado por Lula para questionar o nível de independência política de Campos Neto e compará-lo com Henrique Meirelles, que ocupou o comando da autarquia durante seu governo (quando o BC ainda não tinha autonomia estabelecida por lei e seus diretores não tinham mandatos fixos).

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“Eu tenho muito tempo de experiência, eu já lidei muito tempo com o Banco Central. E o [Henrique] Meirelles é o meu presidente do Banco Central e eu duvido que esse Roberto Campos tenha mais autonomia que tinha o Meirelles. Duvido. O que é importante ver é a quem esse rapaz é submetido. Como ele vai a uma festa em São Paulo quase que assumindo a candidatura a um cargo do governo de São Paulo? Cadê a autonomia dele?”, questionou Lula.

“Quando ele se auto lança a um cargo, eu fico imaginando: nós vamos repetir o [Sergio] Moro? O presidente do Banco Central está disposto a fazer o mesmo papel que o Moro fez? Como paladino da Justiça? Com rabo preso a compromissos políticos?”, prosseguiu o mandatário. A referência a Sergio Moro se deve ao fato de o ex-juiz da Lava Jato ter deixado a magistratura para ser ministro da Justiça e Segurança Pública do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

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Com a vigência da autonomia legal do Banco Central, Lula é o primeiro presidente a ter um governo em que o comandante da autoridade monetária foi indicado por Bolsonaro. O petista só poderá escolher um novo presidente para a instituição no fim do ano, quando termina o mandato de Campos Neto. Nos bastidores, o nome de Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC, é visto como favorito.

“Eu trato com muita seriedade [a escolha do próximo presidente do Banco Central]. Eu vou escolher um presidente do Banco Central que seja uma pessoa que tenha compromisso com o desenvolvimento desse país, com o controle da inflação, mas que também tenha na cabeça que a gente não tem que pensar somente no controle da inflação. Nós temos que pensar também numa meta de crescimento. É o crescimento econômico e o crescimento da massa salarial que vai permitir que a gente possa controlar a inflação com certa tranquilidade”, disse Lula.

“Na hora em que eu tiver que escolher o presidente do Banco Central, vai ser uma pessoa madura, calejada, responsável. Alguém que tenha respeito pelo cargo que exerce. E alguém que não se submeta a pressões de mercado. Alguém que faça aquilo que for de interesse dos 203 milhões de brasileiros”, finalizou.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.