Início de corte de juros nos EUA fica mais distante após CPI, dizem economistas

Diretores do Federal Reserve vinham dizendo que precisavam de mais confiança sobre a desinflação para iniciar ciclo de normalização monetária, mas dados têm surpreendido negativamente

Roberto de Lira

Sede do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA) (Nathan Howard/Bloomberg)
Sede do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA) (Nathan Howard/Bloomberg)

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A divulgação de mais um CPI “quente” em março nos Estados Unidos tornou improvável que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) inicie mais cedo o esperado ciclo de cortes de juros, dizem economistas.

Com atividade econômica aquecida, mercado de trabalho apertado e renda ainda alta, a demanda continua pressionada e foram poucas as boas notícias dentro do índice de preços no mês.

O Itaú que os dados cheios do mês (0,4%) e em 12 meses (3,8%) vieram acima de suas estimativas e do consenso de mercado, mas citou também a composição adversa do índice.

Os serviços, por exemplo, surpreenderam, principalmente devido às variações de transportes e saúde que empurraram o “super core”, uma medida de núcleo que exclui a habitação, para 0,65%, acima da expectativa do banco, de 0,39% %, e da leitura anterior, de 0,47%.

“A quebra foi muito adversa com a aceleração em serviços para os máximos do ciclo. Além disso, indica uma leitura elevada do núcleo do PCE [que mede os gastos dos consumidores], com nossa estimativa preliminar apontando para 0,33% no mês. Isto reduz a possibilidade de quaisquer cortes do Fed no horizonte”, diz o banco.

Andressa Durão, economista ASA Investments, também avalia que a surpresa no CPI leva a revisões altistas no PCE, embora os itens que contribuíram para a alta desse primeiro indicador de março não pressionem tanto o segundo indicador, que será divulgado no final do mês.

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Para ela, a inflação ao produtor (PPI), que será divulgada amanhã. trará informações mais precisas sobre a inflação dos cuidados de saúde no mês, alterando as projeções para o PCE.

Ela também afirma que o dado de hoje reduz muito as chances de um corte de juros pelo Fomc na reunião de junho. “Ainda temos alguns dados de inflação até lá. Mas, mesmo que venham baixos, não devem ser suficientes para deixar o Fed confortável em iniciar o ciclo de queda”, comenta.

Juliano Camargo, economista da AZ Quest, concorda, e destaca que a narrativa das duas últimas reuniões do Fed de que o processo de normalização monetária poderia começar ainda no primeiro semestre não foi corroborada pelos indicadores de inflação e mercado de trabalho.

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“A queda nos juros deve ser postergada para o segundo semestre, se é que acontece ainda esse ano, dado que vários diretores do banco central americano já voltaram a aventar novas altas caso os dados se mostrem menos favoráveis, como inflação persistentemente mais alta.”

Confiança abalada

Para Danilo Igliori, economista chefe da Nomad, o cenário reforça que a conclusão do processo de desinflação segue sendo um grande desafio para a economia americana. “A leitura de hoje certamente anda na direção contrária da necessidade de confiança extra no processo de convergência para a meta de inflação que vem sendo declarado pelos membros do Fomc desde o início do ano”, afirma.

“O resumo é os juros vão demorar mais para começar a cair. E provavelmente vão cair menos do que o antecipado. O ‘high for long’ permanece mais vivo do que nunca”, avalia Igliori.

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Felipe Salles, economista chefe do C6 Bank, é outro especialista a comentar que a inflação americana tem dados sinais de estar se estabilizando em um patamar elevado, mesmo com juros no maior nível dos últimos 20 anos. “A composição do índice mostra que a inflação de serviços segue pressionada pelo mercado de trabalho aquecido, representando um entrave para a convergência da inflação para a meta de 2%”, diz.

Para ele, esse quadro não é condizente com o início do ciclo de cortes de juros neste primeiro semestre. “Acreditamos que haverá dois cortes [de juros] e somente no segundo semestre. Mas não descartamos a hipótese de que nenhum corte seja feito em 2024 caso a inflação se mantenha resiliente como vem se mostrando.”

Já André Cordeiro, economista sênior do Banco Inter, afirma que o resultado de março sugere que os dados ruins de janeiro e fevereiro não podem ser completamente atribuídos a fatores sazonais. “A economia americana ainda se mostra bastante resiliente, com o mercado de trabalho aquecido como mostra o payroll”, lembra.

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Ele destaca ainda que o presidente do Fed, Jerome Powell disse que o comitê de política monetária gostaria de ver a continuidade do processo de desinflação para ter maior confiança para o início do ciclo de cortes. Mas que, nesse primeiro trimestre, essa confiança não aumentou e que o início do ciclo de cortes em junho passa a se tornar menos provável.

“Sem uma reversão da atual dinâmica, o Fomc terá dificuldade em entregar os 3 cortes projetados. E o atual contexto não contribui, com commodities dando sinais de reaceleração, em particular o preço do petróleo.”