Mais uma década perdida ou, finalmente, uma próspera?

Se houver persecução dessa agenda fiscal proposta pelo governo e as predições advindas da nova dinâmica do setor externo se efetivarem teremos finalmente uma década próspera

Alexandre Manoel Lucas Barbosa

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Ilustração com personagem caminhando em uma estrada que leva a muitos caminhos diferentes com portas abertas, representando o conceito de decisões. (Foto: GettyImages)
Ilustração com personagem caminhando em uma estrada que leva a muitos caminhos diferentes com portas abertas, representando o conceito de decisões. (Foto: GettyImages)

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O PIB potencial tem sido motivo de intensa discussão entre economistas. As estimativas rondam o intervalo entre 1,5% e 2,5%, sendo que em 2021, os mais otimistas acreditavam que era 1,5%, no máximo, o que certamente contribuiu para os equívocos de previsão ocorridos nos últimos quatro anos.

Recentes relatórios de mercado jogam luz sobre as causas de tais surpresas positivas, enfatizando a mudança estrutural do setor externo, que apresentará, ao longo dos próximos anos, crescimento do volume exportado, em especial de grãos e petróleo, que possibilitará ao Brasil sustentar um maior nível de investimento mesmo com menor taxa de poupança.

A perspectiva de o saldo comercial ficar próximo ou acima dos US$ 100 bilhões nos anos vindouros cria condições para a demanda interna (consumo das famílias e do governo e o investimento) crescer acima do PIB sem pressionar as contas externas.

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Em um ambiente de juros reais elevados, os modelos clássicos têm capturado pouco da dinâmica de curto prazo do setor externo. Uma alternativa – de inspiração keynesiana, com ênfase na demanda, portanto – é o modelo do recém-falecido Anthony Thirlwall, que relaciona o crescimento econômico de um país às suas taxas de crescimento das exportações e às importações.

O modelo informa que a taxa de crescimento de longo prazo de uma economia é dada pelas suas exportações, dividida pela elasticidade-renda de longo prazo da demanda de importações. Por exemplo, se a taxa de crescimento das exportações é de 6% e a elasticidade-renda das importações é de 2%, a taxa de crescimento de longo prazo do PIB é de 3,0%.

Ao somar os apontamentos dos relatórios de mercado com o modelo de Thirlwall, pode-se depreender que a nova realidade do setor externo demandará um maior nível de investimento para fazer frente a um maior quantum de produção, gerando maior crescimento econômico e maior arrecadação para os cofres públicos.

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Os exemplos para que esse maior crescimento se concretize são muitos: a maior produtividade do setor agropecuário, a exploração de novas bacias de petróleo e a ampliação da produção de energias renováveis. Soma-se a isso a continuidade da agenda de reformas microeconômicas iniciadas em 2016.

Esse cenário de maior nível de investimento e maior crescimento econômico, mesmo com relativa baixa taxa de poupança, pode se concretizar se as autoridades mantiverem o compromisso com o arcabouço fiscal.

Estamos diante de uma oportunidade de acelerar o ajuste fiscal e retomar o superávit primário sustentado, especialmente se forem consideradas as medidas para a remoção das distorções tributárias e que o limite de despesas imposto pela nova regra fiscal será respeitado ao longo do tempo.

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Esse compromisso será aferido com a melhora tanto do resultado primário convencional quanto estrutural, a exemplo do calculado pela Instituição Fiscal Independente (IFI). De fato, o cenário de contas públicas deterioradas herdado em 2016 foi construído a partir de 2006; lentamente, no início, e, depois, aprofundado a partir de 2011 quando olhamos para o resultado estrutural.

Nos idos de 2016 a 2022, reformas estruturais foram feitas nas despesas. Contudo, havia a necessidade de recuperar arrecadação, o que vem sendo feito pela atual equipe econômica, por meio de remoção das distorções tributárias.

Daqui em diante, faz-se necessário retomar às reformas pelo lado da despesa, adequando as regras de saúde e de educação ao crescimento real das despesas proposto pelo arcabouço fiscal, assim como retomando o debate sobre a regra do salário-mínimo, que é incompatível com a perenização do novo marco fiscal.

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Se houver persecução dessa agenda fiscal proposta pelo atual governo e as predições advindas da nova dinâmica do setor externo se efetivarem, teremos finalmente uma década próspera, e não mais uma década perdida.

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Alexandre Manoel

Economista-chefe da AZ Quest Investimentos e ex-secretário dos ministérios da Fazenda e da Economia (2018-2020)

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Lucas Barbosa

Economista da AZ Quest