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O Ibovespa fechou 2023 com uma alta de 22,28%, aos 134.185 pontos, praticamente na sua máxima histórica e firmando o ano como o de melhor desempenho desde 2019. O índice, no entanto, não teve nos últimos 12 meses uma trajetória unidirecional, passando por altas e baixas, mas com os touros, no final das contas, se sobressaindo sobre os ursos.
A palavra-chave para o rally que empurrou o Ibovespa para cima foi juros. Desde o início de novembro, o principal índice da Bolsa brasileira engatou uma sequência de altas, seguindo, principalmente, o que foi visto no exterior.
Nos Estados Unidos, a percepção de que a inflação está enfraquecendo e de que o Federal Reserve terá espaço para cortar juros em breve animou investidores, puxando os ativos americanos para cima e arrastando junto deles os de países emergentes como o Brasil.
Pelo fato de o título da dívida pública americana ser considerado o “ativo mais seguro do mundo”, quando há um recuo das taxas por lá, aumenta-se o apetite por risco e há um fluxo de saída para outros investimentos. O mercado, então, aceita tomar mais risco para conseguir retornos maiores.
“A tônica do movimento dos mercados foi a relação entre a inflação global e a taxa de juros. Tivemos, ali pelo fim de fevereiro, a primeira alta de 25 pontos-base na fed funds”, diz Diego Faust, operador de renda variável da Manchester Investimentos. “Depois de dados da inflação (comportados), já para o fim do ano, começou a crescer a expectativa de queda dos juros no começo de 2024”.
Desde o início de 2022, a instituição monetária americana vinha aplicando uma sequência de alta 50 pontos-base, o que durou seis reuniões. A taxa de referência saiu do intervalo de 0% a 0,25% em novembro de 2022 para o de 4,50% a 5% em fevereiro deste ano. Depois, houve mais três altas de 25 pontos, com a taxa fechando no intervalo de 5,25% e 5,50%, patamar no qual está desde julho deste ano.
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De forma geral, o que explica as decisões do Fed em 2023 foi que a inflação, por lá, vem se assentando. No começo do ano a variação anual de preços medida pelo PCI, um dos indicadores mais importantes, passava dos 6%. Em novembro, último dado publicado, ela se encontrava em 3,1%, bem mais perto da meta do Fed, que é de 2%.
“O exterior ajudou muito na melhora do cenário, principalmente a partir do momento em que os indicadores passaram a mostrar que o Fed poderia parar com as altas dos juros e até mesmo antecipar o ciclo de queda. Esse movimento ficou mais claro na última reunião de política monetária, a partir da qual passou-se a admitir que a redução dos juros pode ocorrer a partir de março de 2024”, explica Alexsandro Nishimura, economista e sócio da Nomos.
Desde o dia 13 de dezembro, data da última reunião do Fomc, quando Jerome Powell, presidente do Fed indicou cortes em 2024, o Ibovespa acumulou uma alta de mais de 5,5%.
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Mas o chamado “rally de fim de ano” vinha de antes. Em novembro, o mercado já estava animado e o mês contou com uma alta de 12,54%, sendo o melhor para a Bolsa brasileira desde 2019. Nesse mês, o Fomc, com o mesmo Powell sinalizando que um novo aumento da taxa consideraria o “efeito acumulado da política monetária” e apontando que a instituição esperava que a economia dos EUA desacelerasse ainda mais, bem como dados da inflação americana abaixo do esperado, foram os principais impulsionadores do Ibovespa.
O movimento quebrou um período de alguns meses, de julho a outubro, nos quais a Bolsa americana sofreu pelo temor de que as taxas poderiam ficar em patamares elevados por mais tempo.
“Em novembro tivemos o chamado ‘pivô do Fed’, que deve começar cortar juros no segundo trimestre do ano que vem. Os índices americanos também estão flertando com suas máximas históricas e esse movimento se espalhou para mercados emergentes”, fala Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master.
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“Isso impulsionou também a moeda brasileira e ajudou a consolidar a ideia de que o Brasil também terá um ciclo de corte de juros mais estável, com o mercado já precificando uma Selic a 9% no fim do ano que vem”, completa.
Cenário interno também ajudou o Ibovespa
Apesar de o cenário externo ter sido, em parte, um forte impulsionador do Ibovespa, o Brasil também fez sua lição de casa.
Gala destaca que o IPCA, principal índice da inflação nacional, também está convergindo para a meta já há algum tempo, fechando o ano por volta dos 4,5%, abaixo do teto da meta do Banco Central, que é de 4,75%.
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E a inflação no Brasil vinha sendo destaque já há algum tempo. Em abril, por exemplo, o Ibovespa teve sua maior alta diária de 2023 e sobe 4,29%, chegando, então, aos 106 mil pontos, na esteira do anúncio do IPCA de março, que foi aquém do esperado.
O número da inflação, publicado pelo IBGE, desencadeou uma onda de otimismo e reprecificação dos ativos de risco, com investidores esperando que ele permitisse ao Banco Central brasileiro iniciar o ciclo de queda dos juros, bem como cortá-los de forma mais rápida. O movimento de queda começou em agosto e já conta com quatro baixas, com a Selic saindo de 13,75% para 11,75% atualmente, com quatro cortes de 50 pontos-base.
“O forte desempenho em 2023 do Ibovespa contrasta com o começo de ano bastante cético e de preocupações, não sem motivos, com o cenário econômico interno e externo. Porém, ao longo dos meses foi se formando uma combinação de fatos que permitiram a guinada do Ibovespa, com atividade mais resiliente, que resultou em forte crescimento do PIB, ao mesmo tempo em que houve a desaceleração da inflação e avanço na agenda fiscal, ainda que este último fator permaneça no radar dos investidores para 2024”, diz Nishimura, da Nomos.
Para além da inflação, o especialista faz referência ao avanço do produto interno bruto brasileiro no primeiro trimestre, que surpreendeu positivamente, com uma alta de 1,9%, ante 1,3% do consenso.
Questões como a aprovação do arcabouço fiscal e a sinalização de maior compromisso do que o esperado com as contas públicas do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também são lembradas. Nesse ponto, os últimos pregões de 2023 vão no sentido contrário dos primeiros.
Nos dias dois e três desse de janeiro o índice caiu 5%, com investidores temendo as atitudes do novo presidente, então recém-empossado. As ações ordinárias e preferenciais da Petrobras (PETR3;PETR4) caíram, respectivamente, 6,67% e 6,45% no primeiro dia do ano, repercutindo o discurso de posse, com o Ibovespa tombando 3,06%.
Lula, fora falas quanto aos lucros da petroleira, logo que assumiu determinou que seus ministros revogassem atos que iam em direção à privatização das estatais. Fora isso, o petista, logo de cara, também prometeu que iria revogar questões como o teto de gastos e a reforma trabalhista, o que estressou a curva de juros e, consequentemente, também os ativos de risco. Havia, então, ainda o temor de forte de que o novo governo seguiria por um caminho de “gastança”.
No entanto, pouco tempo depois, as sinalizações do Governo Federal já mudaram.
Perspectivas para 2024
Para 2024, com, aparentemente, as questões da inflação e dos juros já endereçadas, tanto no Brasil, com a perpetuação das quedas, quanto nos Estados Unidos, com a discussão ficando quando as baixas começam, especialistas destacam a necessidade de monitorar mais o fiscal.
“No Brasil ainda deveremos observar a realização efetiva do novo arcabouço fiscal e se realmente o governo conseguirá cumprir o equilíbrio das contas”, debate Nishimura.
“Para o ano que vem, quando haverá eleições municipais, o governo já sinaliza uma possibilidade de mudança na meta. Nossa expectativa é de que o governo tenha um déficit fiscal de -1% do PIB em 2024, muito pior que a meta de equilíbrio no resultado primário. Se esse cenário se concretizar, o gatilho para crescimento dos gastos deveria ser acionado, algo que ainda temos dúvidas se acontecerá”, acrescenta Luca Mercadante, economista da Rio Bravo.
Faust, da Manchester, opina que mesmo quando o assunto é política brasileira o fato de o governo ter aprovada uma série de medidas traz certo otimismo. “Fica um bom presságio para 2024”, fala.
Gala, por fim, diz que vê o movimento de valorização do Ibovespa permanecendo. “Provavelmente o BC continuará cortando as taxas em 0,5 ponto percentual. Fechamos o ano de uma maneira bem positiva para os ativos brasileiros e com uma boa perspectiva para 2024”, expõe.
Nos EUA, o desafio, para os especialistas, é saber quando as condições econômicas permitirão que o Fed inicie o ciclo de queda dos juros, com a continuidade da queda da inflação, ao mesmo tempo em que o patamar atualmente não impacte tão profundamente o crescimento do PIB.
“O principal tema para o ano que vem continuará sendo a taxa de juros nos EUA. O ano de 2024 tem tudo para ser um período de política monetária restritiva por parte do Fed. Nas suas últimas projeções, o BC americano sinalizou o corte de apenas 50 bps da sua taxa de juros. Além disso, as preocupações com o equilíbrio fiscal nos EUA não necessariamente serão solucionadas de forma imediata, especialmente em ano de eleição, criando pressão relevante para toda a curva de juros americana. Esse cenário indica que viveremos em um ambiente de juros mais alto no mundo e consequentemente no Brasil”, pondera Mercadante.