Caso Larissa Manoela: pais podem gerir patrimônio de filho que atinge a maioridade?

Lei define o papel dos pais na administração do dinheiro de crianças e adolescentes; confira

Jamille Niero

A atriz e cantora Larissa Manoela rompeu a sociedade que possuía com os pais (Foto: Reprodução/Instagram)
A atriz e cantora Larissa Manoela rompeu a sociedade que possuía com os pais (Foto: Reprodução/Instagram)

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O caso do rompimento familiar e societário da atriz Larissa Manoela, de 22 anos, com os pais e então empresários e responsáveis por sua carreira, Silvana Taques e Gilberto Elias, ganhou todos os holofotes desde o último domingo (13), quando a atriz rompeu o silêncio e falou sobre a gestão de seus bens.

Larissa, que iniciou sua carreira aos 4 anos, contou em entrevista concedida ao “Fantástico” que descobriu possuir apenas 2% da sociedade de uma das empresas abertas para gerenciar seu patrimônio e contratos profissionais, enquanto os pais somavam 98% dessa pessoa jurídica.

Essa empresa teria sido aberta quando a artista ainda era menor de idade. Larissa contou que ao questionar os pais, eles alegaram que as cotas eram divididas igualmente entre os três, com cerca de 33% para cada.

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A artista contou ainda que uma outra empresa foi aberta quando ela já era maior de idade, sendo ela a única sócia, porém com os pais tendo “plenos poderes” de decisão sem depender de sua autorização. Segundo Larissa, ao descobrir todas essas situações, ela optou por abrir um outro CNPJ, desta vez sob sua inteira responsabilidade, para ela mesma administrar de perto sua carreira e novos contratos.

Partindo do exemplo desse “imbróglio” familiar e societário da Larissa Manoela e seus pais, o InfoMoney consultou especialistas para explicar qual deve ser o papel de pais que administram o patrimônio construído por jovens menores de idade.

“De acordo com o Código Civil, os pais detêm o poder familiar e, portanto, devem representar os filhos com menos de 16 anos e assistir aqueles que possuam entre 16 e 18 anos de idade, competindo a eles a administração dos bens dos menores, até que atinjam a capacidade civil plena, seja pela maioridade, seja pela emancipação [processo que concede a um menor de idade os direitos e responsabilidades legais de um adulto]”, explica Luciana Toledo Niess, advogada especialista em direito de família.

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Vale dizer que a administração dos bens dos filhos menores de 16 anos é realizada exclusivamente pelos seus representantes. Já entre 16 e 18 anos, os pais devem administrar os bens em conjunto com os filhos.

Importante salientar que é obrigação dos pais preservar o patrimônio dos filhos, portanto a administração deve ser sempre em benefício destes. Se houver uma administração aparentemente abusiva, a qual prejudique os interesses dos menores, pode-se discuti-la judicialmente”, ressalta Luciana.

Os atos considerados administrativos seriam, por exemplo:

Mas não podem vender ativos dessa pessoa jurídica sem uma justificativa plausível. E o Ministério Público pode fiscalizar essa movimentação, inclusive até por provocação externa – como por denúncia de algum parente que desconfiar que “o pai ou a mãe estão exercendo esse poder familiar em excesso”, explica David Andrade Silva, advogado especialista em direito societário.

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De acordo com Silva, em uma situação como a vivida por Larissa Manoela, os problemas estão na falta de transparência – inclusive na estruturação da sociedade. “Os pais jamais poderiam ser donos dessa empresa como eram e jamais poderiam ser cotistas dessa empresa. Eles poderiam ser no máximo usufrutuários. As cotas que representam o patrimônio só poderiam ser dela, porque o trabalho dela é que gerou a riqueza”, comenta Silva.

O usufrutuário é quem tem o direito de usufruir do bem, sem ser dono. Ou seja, pensando em um imóvel, por exemplo, pode morar, alugar e fazer a manutenção do espaço, porém não pode vender. Nesse último caso, inclusive, seria necessária uma autorização judicial. “É o que a gente chama no direito de ‘nua-propriedade’. Eu sou proprietário mas não uso, e o usufrutuário não é proprietário, mas usa”, aponta o especialista em sociedades.

Com a maioridade ou a emancipação, o “poder familiar” é cessado e a pessoa passa a ter capacidade civil plena, podendo gerir o seu patrimônio. Nessa situação, para que os pais continuem administrando os seus bens ou para que outra pessoa passe a fazê-lo, utiliza-se uma procuração cedendo esse poder. “No caso da administração de uma empresa, também há a possibilidade de se incluir um administrador no contrato social, o que não prejudica a opção da procuração”, acrescenta Luciana, especialista em direito da família.

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Tudo no papel

Na avaliação do advogado Victor Fernandes Cerri de Souza, especializado em contratos, existem caminhos que podem ser seguidos pelo jovem que acumulou um patrimônio significativo quando era menor de idade.

Souza explica que não há nada que impeça os pais de continuarem administrando o patrimônio dos filhos. Inclusive, com a maioridade, “quando se trata só de patrimônio, podem ser previstos em contrato instrumentos que tragam condições de administração”, diz o advogado, como:

“É possível que tudo isso seja regulamentado dessa forma e é o que se aconselha. O que observamos na prática é que situações como a da atriz acabam sendo administradas de forma informal, por causa dos laços de confiança”, pontua Souza. Ele ressalta que apesar de o conceito de patrimônio ser amplo, quanto mais especificado estiver no contrato, melhor, para evitar questionamentos.

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Quando ocorrem casos de desavença familiar, sem acordo, o único caminho que resta acaba sendo o judicial. “Quando não há estabelecimento prévio via contrato, não é possível seguir para um canal de mediação ou arbitragem”, comenta o advogado especializado em contratos.

Quando o problema chega ao tribunal, a resolução pode levar de três a cinco anos considerando o julgamento em primeira instância, segundo estimativa de Souza. Se for levado para as instâncias superiores – como o STJ (Superior Tribunal de Justiça) ou o STF (Supremo Tribunal Federal), “pode levar 20 anos ou mais”.

Para evitar esse tipo de situação, explica Silva, o ideal numa formatação societária de um “artista mirim” com os pais, por exemplo, é “uma pessoa jurídica de um sócio só”, considerando os pais como administradores até o indivíduo completar 16 anos. A partir dessa idade, a função será a de “assistir” o filho. “Mas jamais serem donos das cotas”, complementa Silva.

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Jamille Niero

Jornalista especializada no mercado de seguros, previdência complementar, capitalização e saúde suplementar, com passagem por mídia segmentada e comunicação corporativa