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O Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), conhecido como “inflação do aluguel” por historicamente reajustar contratos imobiliários, continua a aprofundar a sua deflação no acumulado em 12 meses – o que indica uma redução dos preços na comparação anual (e possivelmente dos alugueis).
O IGP-M voltou ao terreno negativo em abril, quando recuou 0,95% no mês e passou a acumular queda de 2,17% em 12 meses (a última vez que isso tinha acontecido foi em fevereiro de 2018, há mais de 5 anos).
A deflação se intensificou em maio, quando o índice caiu mais 1,84% e a retração anual aumentou para 4,47%. Em junho, o IGP-M caiu ainda mais (-1,93%), o que jogou inflação acumulada para -6,86% em 12 meses.
Isso significa que um aluguel de R$ 5 mil mensais pode ficar R$ 343 mais barato, dependendo do contrato que foi assinado. Em 12 meses, a economia seria de R$ 4.116 (mais que três salários mínimos).
O IGP-M tem retraído mais do que o projetado por analistas, e não há sinais de que a tendência vá se reverter no curto prazo. É por isso que o InfoMoney consultou especialistas e perguntou: o que os inquilinos e os proprietários devem fazer neste cenário atual?
A principal resposta é: depende do que está no contrato de locação. Historicamente, eles preveem o IGP-M como índice de correção dos alugueis. Mas o IGP-M disparou na pandemia e chegou a ultrapassar os 37% no acumulado em 12 meses, em maio de 2021, o que fez com que muitos proprietários não repassassem toda a alta para os inquilinos.
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Da alta de 37% à deflação
Se isso ocorreu com você, leitor, especialistas recomendam que agora é a sua vez de ser flexível. “O IGP-M está negativo porque está começando a ‘devolver’ o que tinha subido no passado, quando atingiu 37% em maio de 2021. Ele está devolvendo parte daquele excesso de aumento”, afirma Alberto Ajzental, coordenador do curso de negócios imobiliários da FGV.
Cintia Senna, mestre em educação financeira, diz que este “é um excelente momento, porque a gente passou por fases com o IGP-M muito alto”. “Naquele momento alguns locatários abriram comunicação, outros não. Agora que estamos no negativo vale essa conversa, até mesmo antecipada, para propor o que vai acontecer” (veja mais abaixo).
Essa negociação vale não só para o aluguel de imóveis residenciais, mas também negócios, como comércio de rua, lojas de shopping, lajes corporativas e até galpões logísticos. “Vale para pessoa jurídica também, vale para shopping, vale para tudo. O lojista não pode ver um aluguel subir 37%”, afirma Ajzental.
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Antes de mais nada, ambos recomendam que o locatário leia (e respeite) o contrato. “Primeiro de tudo, tem respeitar contrato. Depois, se tiver algo de atípico, tem de conversar. Seja conjunto comercial, laje corporativa, loja de shopping, loja de rua. Tem de preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato”, afirma o especialista da FGV.
Reajuste só positivo vale?
Depois que o IGP-M explodiu na pandemia, alguns proprietários e imobiliárias passaram a usar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para reajustar os contratos. Mas muitos continuam ainda usam o IGP-M, que é calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Depois de ver qual é o índice de reajuste do seu contrato, é preciso ver se tem alguma cláusula de exceção (há casos em que está explícito no documento que o reajuste só ocorrerá se o índice for positivo, o que é prejudicial ao locatário).
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“É preciso olhar a cláusula de reajuste do contrato e entender se está determinado se é só a variação positiva [do indicador], para que seja colocado os direitos de cada parte”, afirma Senna. Ajzental, da FGV, diz que há normalmente três situações:
- A “mais normal”, em que o contrato prevê que o índice é o IGP-M e que ele vale tanto para o positivo quanto para o negativo;
- A prática de mercado, em que o contrato até prevê o reajuste independentemente de ser negativo ou positivo, mas o proprietário (e a imobiliária) sobem o aluguel quando o índice é positivo, mas não repassam a redução quando o indicador recua;
- Quando o contrato prevê a aplicação do IGP-M (ou qualquer outro índice) só quando ele for positivo. O problema é que essa “trava” determina que o preço só vai subir – e beneficia apenas o proprietário.
“Na prática, o que acontece no mercado é que, quando [o índice] é positivo o aluguel sobe, mas, quando cai, faz ‘cara de paisagem’ e mantém. Então tem de partir do inquilino exigir que tenha uma redução”, recomenda Ajzental.
Ele também critica os contratos que preveem o reajuste só em caso de o indicador ser positivo. “Se você só trabalha com o índice no positivo, uma hora fica insustentável [para o inquilino]. Tem que negociar. E, se não é explícito que o reajuste não é só positivo, você não deve ficar esperando o dono”.
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Negociação antecipada
Senna, que é mestre em educação financeira, também recomenda que a iniciativa parta do locatário – e com alguns meses de antecedência. Ela aconselha também que a negociação (e o que ficou acordado) seja formalizado de alguma forma, de preferência por escrito.
“Agora que estamos [com o IGP-M] no negativo vale essa conversa, até mesmo antecipada, para propor o que vai acontecer. Se vai ser aplicado o indicador negativo – e você vai pagar menos nos próximos meses – ou se vai ficar o mesmo aluguel”, afirma a especialista.
Ela pondera, no entanto, que neste segundo caso a redução tem de ser usada nos próximos reajustes, para que o aluguel suba menos em 2024, quando o IGP-M provavelmente voltará ao terreno positivo.
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“Essa redução que você teria direito, quando tiver uma variação positiva, tem de descontar o que não foi repassado”, afirma Senna. “Pode ser que daqui a um ano o IGP-M esteja em 10%, daí o inquilino esquece e o proprietário vai querer repassar toda a inflação. Por isso é bom ter algo oficial, mesmo que um e-mail”.
IGP-M é o melhor índice?
Há também uma discussão se o IGP-M é o melhor índice para reajustar contratos de locação. Por causa da alta de 37% em 2021, muitos proprietários e inquilinos negociaram na pandemia e resolveram substitui-lo pelo IPCA.
Alberto Ajzental, coordenador do curso de negócios imobiliários da FGV, é um dos críticos ao uso do IGP-M. “O mais correto é usar o IPCA, não o IGP-M. Porque o IGP-M não mede a inflação”, diz o especialista. “O IPCA calcula uma cesta de produtos que as famílias consomem. O IGP-M não, 60% do índice é de preços do atacado. Uma boa parte da variação é atrelada a commodities e também ao dólar”.
Ele diz que o uso do indicador é uma “herança” da hiperinflação. “A partir da década 60 e 70, a gente vivia em hiperinflação e não dava para acreditar na moeda brasileira. O mercado imobiliário então adotou o IGP-M, tanto na construção quanto na venda e no aluguel”.
“O IPCA é muito menos volátil. Ele não passou de 12%, 13% nos últimos anos, enquanto o IGP-M bateu 37%”, diz o especialista da FGV. “Não faz sentido aumentar um aluguel em 37% porque o preço do aço subiu quatro vezes. Pode até estar escrito no contrato, mas é algo completamente atípico”.