Com incertezas econômicas, volatilidade é palavra constante em teleconferências e balanços do 4º trimestre

Guerra da Ucrânia, resquícios do impacto da pandemia e cenário local são fatores que dificultam leitura de cenário

Vitor Azevedo

(Shutterstock)
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Nos últimos dois anos, a economia mundial possivelmente passa por um dos períodos de maiores oscilações da história recente quando os temas são, por exemplo, commodities, câmbio e taxas de juros. Pandemia e, posteriormente, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia inseriram uma série de variáveis no mercado que impactam as decisões políticas, de investimentos e das companhias.

De um lado, a guerra e as interrupções nas cadeias produtivas jogaram preços para cima, bem como os estímulos econômicos implementados pelos governos durante o período mais tenso da pandemia. Do outro, bancos centrais tentam conter a alta dos preços, aumentando os juros e buscando derrubar a economia. No meio, uma relação de preços que é mais do que bilateral.

Se o cenário externo não fosse o suficiente, o interno também não ajuda. Quase chegando ao quarto mês do ano, o Governo Federal, por exemplo, não definiu um novo arcabouço fiscal nem deu muitas indicações de projetos no âmbito macroeconômico, o que aumenta as incertezas em relação à economia brasileira.

“2023 certamente trará desafios e riscos, mas também oportunidades. Sabemos como navegar na incerteza e na volatilidade”, disse Jean Jereissati, diretor executivo (CEO) da Ambev (ABEV3), em teleconferência realizada na última quinta-feira (2). “Devemos nos manter de olho no cenário macroeconômico mundial e possíveis riscos e volatilidades no mercado doméstico e internacional”, comentou o diretor financeiro (CFO) da WEG (WEGE3) na teleconferência da companhia, no dia 16 de fevereiro.

As duas falas são apenas alguns exemplos que vêm permeando a temporada de balanço do quarto trimestre de 2022.

“Nossa competitividade nos permite mitigar alguns custos que não estão sob nosso controle. Temos que ver que o preço do carvão está muito volátil. Desce e depois sobe com notícias vindas da Austrália”, pontuou Gustavo Werneck, CEO da Gerdau (GGBR4).

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A commodity mencionada pelo diretor executivo da Gerdau oscilou muito durante 2022. Com a guerra, países europeus ficaram com menos acesso ao gás natural e ao petróleo russos e, por isso, passaram a buscar o carvão como fonte alternativa de energia.

De forma geral, as três companhias mencionadas até então sofreram em 2022 com a oscilação de gastos. Boa parte dos custos da WEG está associada ao cobre e metal. A Ambev, por sua vez, depende dos preços de produtos químicos e de commodities agrícolas. A Gerdau, como citado pelo próprio CEO, sofreu por conta do carvão. Todos esses produtos não manufaturados foram diretamente impactados pela guerra na Ucrânia.

E eles não são os únicos. Há exatos seis meses atrás, no dia seis de setembro, a tonelada do minério de ferro, outra commodity muito utilizada por indústrias, era negociada a quase US$ 100 no porto chinês de Dalian. Em novembro, o valor foi para cerca de US$ 90. Agora, os mesmos mil quilos da commodity valem US$ 127,80. O barril de petróleo Brent, saiu de US$ 95, tocou US$ 76 em dezembro e agora está US$ 74,80.

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As variáveis que estão oscilando muito vão além das commodities. A dinâmica das curvas de juros e do câmbio também vêm impactando os negócios das companhias. E, nesta frente, às incertezas econômicas globais são somadas às locais.

E as alterações bruscas do mercado, obviamente, fazem as companhias buscarem proteção e também investirem menos.

“Continuamos avançando em nossa política de hedge cambial, aproveitando a volatilidade do real”, expôs Aires Galhardo, CEO da Suzano (SUZB3). “Temos agora em hedges operacionais cerca de US$ 6 bilhões com put média de R$ 5,58 e mais US$ 1,8 bilhão de hedges relacionados ao projeto Cerrado com put média de R$ 5,78. Se o real continuar no patamar atual, podemos esperar um ajuste positivo no caixa em 2023 e 2024”.

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Volatilidade faz companhias se portarem com cautela

No caso da Suzano, por exemplo, a companhia gastou mais com proteção em câmbio, tentando buscar algum tipo de previsibilidade – uma vez que boa parte da sua dívida está emitida em moeda estrangeira (R$ 62,2 bilhões em dólares contra R$ 13,3 bilhões em reais).

“A volatilidade que observamos no mercado é uma consequência do cenário econômico que vivemos, de maiores incertezas. Inflação, questão fiscal, juros altos. Esse cenário acaba afetando as decisões gerenciais das empresas. Vimos, nos últimos meses e no ano passado, muitas empresas decidindo postergar investimentos, como construção de novas fábricas, expansão de produção”, expõe Felipe Moura, sócio e analista da Finacap Investimentos

Na CSN (CSNA3), os executivos afirmaram que estão buscando aumentar o caixa para R$ 15 bilhões, ante os R$ 11,9 bilhões registrados.

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“É um seguro importante nos dias de hoje e estamos fazendo todos os esforços possíveis. Vocês podem ver a volatilidade que temos no fluxo de caixa livre, encerramos o ano com resultados operacionais plenos, mas com um alto nível de estoque. É por isso que temos um fluxo de caixa negativo”, disse Marcelo Cunha Ribeiro, diretor financeiro da CSN.

De acordo com a Companhia Siderúrgica Nacional, os estoques terminaram 2022 acima dos R$ 11 bilhões. A empresa esperava uma normalização, tirando R$ 600 milhões dessa linha e também da linha de custos de matéria-prima, mas, com a volatilidade, acabou mantendo os níveis de estoque de carvão e coque.

Cenários local e internacional são incertos

Felipe Moura, sócio e analista da Finacap Investimentos, explica que, em cenários como esse, companhias tendem a cortar investimentos e buscar cortar custos.

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“A volatilidade que observamos no mercado é uma consequência do cenário econômico que vivemos, de maiores incertezas. Inflação, risco fiscal, juros altos. Tudo isso afeta as decisões de alocações. Vimos também muitos movimentos do lado do corte de custo, com o enxugamento do quadro de funcionários, por exemplo”, expõe.

Rafael Ragazzi, sócio e analista da Nord Research, defende que definir todas as oscilações recentes como “volatilidade” talvez não seja nem justo.

“Volatilidade nós atribuímos a oscilações nos preços que não necessariamente estão ligadas a fundamentos, mas nós estamos vivendo um momento em que os fundamentos estão mudando. Isso tanto no cenário global quanto no brasileiro”, comenta o especialista. “Esse cenário afeta diretamente os resultados via custos ou via receitas. Tudo isso acaba afetando não só o preço das ações mas também os resultados das companhias”.

O especialista menciona que a luta contra a inflação no exterior e a dificuldade de crescimento da economia global devem, no futuro, continuar sendo fonte de volatilidade, principalmente no que tange as commodities.

O recente recuo do preço do petróleo, por exemplo, se deu porque desde as crises dos bancos, como o Silicon Valley Bank e o Credit Suisse, investidores têm achado que a economia global está em risco e, se ela está em risco, o consumo de commodities tende a ser menor.

“Quando olhamos o cenário interno, de olho no dólar, vivemos um momento complicado do ponto de vista político, o que também tem influência nas principais variáveis.  O momento é complicado porque o novo governo assumiu e veio com uma propensão muito forte de aumentar os gastos, o que gera uma série de preocupações quanto à saúde fiscal do país, quanto ao câmbio, e por ai vai”, explica Ragazzi. “Tudo isso acaba afetando não só o preço das ações mas também os resultados das companhias”.

Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, por fim, menciona que a falta de clareza gera muita volatilidade.

“Para as exportadoras, o dólar valorizado é algo positivo, por aumentar as receitas. Vale (VALE3), Petrobras (PETR4) e outras de commodities voltadas ao setor externo são exemplo disso. Outras companhias, que têm custo dolarizados, como o setor aéreo, que depende do petróleo e do câmbio, são afetadas negativamente. Companhias que têm endividamento em dólar, também. Tudo isso não é positivo”, define.