Macro, fundamentos e espaço para retomada: o que observar para investir em criptoativos em 2023

João Marco Cunha, da Hashdex, e Vivian Satie, da Eleven, avaliam o cenário cripto e o que esperar para os principais ativos esse ano

Paulo Barros

João Marco Cunha, gestor na Hashdex, e Vivian Satie, head de investimentos alternativos na Eleven Financial (Imagem: Leo Albertino)
João Marco Cunha, gestor na Hashdex, e Vivian Satie, head de investimentos alternativos na Eleven Financial (Imagem: Leo Albertino)

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Se 2022 terminou colocando em dúvida a sobrevivência de algumas criptomoedas, este começo de 2023 mostra porque tanta gente topou tomar o alto risco de se expor em um setor tão volátil: em pouco mais de uma semana, o Bitcoin (BTC) subiu 25% e diversos tokens menores chegaram a dobrar de preço no período. Diante do alívio após fortes quedas no ano passado, analistas apostam em um misto de cautela com expectativa de forte retomada na classe de ativos nos próximos meses.

“2023 é um ano cheio de perguntas. Ainda tem inflação, juros vai subir um pouco, recessão ninguém sabe se vai ser longa ou curta, profunda ou rasa, geopolítica com Rússia e Taiwan. Mas, a gente acredita que, se macro não atrapalhar muito, cripto vai voltar muito melhor e muito mais rápido que outros ativos digitais”, destacou João Marco Cunha, gestor de portfólio da Hashdex, durante evento Onde Investir 2023, realizado na noite de ontem.

Para o executivo, as crises que abalaram o preço das criptomoedas no ano passado exacerbaram uma queda que estava prevista em análise técnica, depreciando ativos de maneira exagerada e forçando os preços para longe da evolução de fundamentos que diversos projetos experimentaram no ano passado.

“Por que o Bitcoin vale menos porque o Terra/Luna fracassou? Ou porque [houve] uma empresa mal gerida, como a Celsius, que tinha problemas na gestão de risco, ou se um grupo de empresários resolveram fazer uma fraude usando uma exchange?”, observou Cunha. “Esses eventos não deveriam ter tido o impacto que tiveram no preço. Mas tiveram, e o impacto foi persistente”.

Neste ano, a expectativa é que o Bitcoin colha os frutos que plantou em 2022, fortalecendo a tese de que, mais do que uma moeda digital, é uma nova tecnologia de pagamentos e compensação de valores que resolve um problema real de dependência de intermediários – e, por esse motivo, poderia voltar a atrair investidores de peso, mantendo seu histórico de baixa correlação com ativos tradicionais.

“A adoção de blockchain (a tecnologia do Bitcoin) ainda é muito parecida com a da Internet na década de 1990, quando a gente sabia que existia uma aplicabilidade muito grande, mas ainda faltava uma adoção em massa para entendermos toda a capacidade que essa tecnologia tem”, explicou Vivian Satie, head de investimentos alternativos da Eleven Financial, que também participou do painel sobre criptos.

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Para o investidor que tem um apetite maior a risco e deseja entrar no setor, Satie recomenda olhar principalmente para os projetos mais consolidados, como Bitcoin e Ethereum (ETH), que estão robustos do ponto de vista de fundamentos. “As mais apimentadas, é preciso olhar com um pouco mais de cautela, entendendo que são startups que podem dar certo ou não”.

O gestor da Hashdex concorda. “Se 2023 for um ano ruim [Bitcoin e Ethereum] vão ser as que menos vão sofrer, pelo porte [que têm]. Em um cenário muito bom, elas não vão ser as que mais vão subir, já que projetos menores vão ganhar uma escala diferente. Mas, se o mercado ajudar, Bitcoin e Ethereum vão performar bem, e vão refletir provavelmente esses avanços nos fundamentos do passado, e se manifestar também em preço”, ressaltou Cunha.

Ethereum deve atrair mais players em 2023

Mesmo que tenha caído quase 70% em 2022, o Ethereum passou por um ano chave em que implementou a atualização Merge (Fusão, em português), realizada em meados de setembro. Desde então, a rede abandonou o sistema de mineração similar ao do Bitcoin e passou a adotar o que se chama de staking, processo em que investidores precisam comprar ETH para participar do processo de validação da rede em troca de remuneração na criptomoeda.

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A atualização é apontada como o maior evento do setor desde a criação do Bitcoin, em 2009, e promete criar as bases para que o Ethereum atraia uma grande quantidade de players institucionais a partir de 2023. Está programada para o mês de março uma segunda atualização, chamada de Shangai, que irá liberar o saque dos ETH deixados em staking, abrindo espaço para a entrada de investidores que, até então, não tinham topado em participar do processo sem serem obrigados a deixar seu patrimônio travado.

“Você vai passar a ter liquidez, [uma quantidade maior] de agentes vai poder fazer staking. A gente, como fundo de investimento, hoje em dia não pode fazer [staking] porque se alguém pede o resgate, a gente precisa poder pagar o resgate”, contou o executivo da Hashdex.

Como consequência, a expectativa é que o Ethereum tenha cada vez mais ETH travado no staking, reduzindo a quantidade de criptomoedas em circulação de modo a reduzir a pressão vendedora e, ao mesmo tempo, criar outro caso de uso (renda passiva) para o criptoativo. Em um eventual novo momento de alta atividade do mercado, levando em conta as várias aplicações da rede Ethereum, o ETH deve conseguir capturar isso e transformar em valorização.

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“DeFi passou por uma prova muito grande, pressão em preços que forçaram liquidação de colateral, e o que a gente viu foi os protocolos funcionando exatamente como era previsto”, observou Cunha, ressaltando também que rivais do Ethereum podem ganhar espaço, a exemplo da Avalanche (AVAX), que fechou recentemente um acordo com a Amazon para oferta de serviços de blockchain.

De olho no apetite do investidor

Apesar do potencial do setor, a avaliação dos especialistas é de que o investidor deverá seguir de olho nos movimentos do cenário macro, como taxa de juros, inflação e recessão nos EUA, para avaliar o melhor momento para entrar – e, principalmente, como entrar – em criptoativos.

Satie relembra que o macro deverá se impor ao longo do ano, com o ritmo da taxa de juros no radar, avaliando o comportamento de empresas que cresceram queimando caixa e agora se vendo obrigadas a olhar de volta para uma operação mais eficiente – segundo um levantamento do CoinDesk, o setor cripto já demitiu mais de 28 mil pessoas nos últimos meses.

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Um dos segmentos de atenção é o da mineração. “Muitas empresas são listadas e a gente espera que o resultado não seja positivo, porque elas operaram de forma alavancada e, no último ano, acabaram vendendo a maior parte do seus tokens para pagar custos”, lembrou Satie.

O comportamento do mercado de títulos americano, assim como do private equity, também entra no cálculo de entrada. “São fatores a se observar para entender qual é o melhor momento que o apetite de risco acaba voltando para esses projetos”.

“Para o investidor que tem um apetite maior a risco e quer colocar um percentual do seu portfólio [em criptoativos], pode fazer isso com cautela entendo os riscos. De um lado, há corretoras centralizadas não reguladas, [mas] de outro há gestoras e outros players que oferecem fundos de investimentos e ETFs que trazem uma proteção para o investidor”.

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Para 2023, a aposta é também de mudanças regulatórias. Enquanto no Brasil já existe um marco legal aprovado, mas ainda sem regras específicas, nos EUA as agências reguladoras ainda disputam pelo poder de supervisão do setor, algo que deverá se desenrolar ao longo do ano em meio à pressão surgida após o colapso da FTX.

“Esse caso da FTX deixou clara uma certa omissão da parte deles, deixando o consumidor americano desprotegido”, completa João Marco Cunha.

Paulo Barros

Jornalista pela Universidade da Amazônia, com especialização em Comunicação Digital pela ECA-USP. Tem trabalhos publicados em veículos brasileiros, como CNN Brasil, e internacionais, como CoinDesk. No InfoMoney, é editor com foco em investimentos e criptomoedas