Big techs: é hora de separar o joio do trigo

Em 2023, as grandes empresas de tecnologia terão que enfrentar pressões regulatórias, sindicalização de funcionários e retenção de talentos, ao mesmo tempo em que lidam com um ambiente incerto de negócios e ceticismo do mercado dado o cenário de inflação e juros altos

Roberto Vinhaes Maria Antonia Viuge

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Big techs podem ser taxadas (Foto: Shutterstock)
Big techs podem ser taxadas (Foto: Shutterstock)

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O ano de 2022 foi difícil para as big techs. Primeiramente, vale esclarecer quais empresas estão incluídas nesse grupo: Amazon, Alphabet, Apple, Microsoft e Meta (Facebook). Seus acionistas sentiram no bolso a reversão de uma longa trajetória de alta. No ano, as ações caíram, respectivamente, 49%, 38%, 26%, 64% e 28%.

Vale ressaltar que a pandemia, por ter aumentado o tempo gasto online e por ter requerido uma dependência do e-commerce em detrimento do consumo em lojas físicas, demandou uma expansão de capacidade de muitas empresas do setor de tecnologia. Isso se traduziu em contratação de funcionários, compra de warehouses, aumento de gastos com infraestrutura e logística. Em 2022, com o fim dos lockdowns e retomada à uma normalidade, essas companhias sofreram.

Todas essas empresas registraram, em maior ou menor proporção, quedas no lucro nos nove meses entre janeiro e setembro de 2022, em relação ao mesmo período em 2021, ano no qual os ganhos da pandemia tiveram forte impacto nos resultados. Os preços das ações refletem esse quadro de declínio relativo, e também parecem incorporar um receio em relação à perspectiva de aumento da taxa de juros por parte do Fed (Federal Reserve, banco central americano).

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Além do rollback da expansão que se deu durante a pandemia e da queda das ações, essas companhias também estão preocupadas com o cenário de inflação e possível recessão nos Estados Unidos. Por isso, vêm implementando programas de cortes de custos. Esses cortes têm afetado especialmente as divisões experimentais ou as que ainda não geram lucro, mas também resultaram na demissão de milhares de funcionários.

A onda de layoffs afetou o setor de tecnologia como um todo. Segundo o site Layoffs.fyi, que monitora demissões através de publicações de mídia ou documentos empresariais, mais de mil empresas de tecnologia demitiram um total de 150 mil pessoas desde o início de 2022.

Outro tema comum foi um aumento na sindicalização de trabalhadores de tecnologia nos Estados Unidos. De acordo com uma pesquisa conduzida em 2021 pela Protocol and Morning Consult, 50% dos trabalhadores do setor têm interesse em se filiar a um sindicato. É um movimento que vai além desse setor, com Starbucks e outras grandes empresas registrando um aumento de filiação dentre seus funcionários.

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Investidores se preocupam que esse tipo de movimento pode resultar num aumento da estrutura de custos das companhias. Tendemos a achar que empresas de alta qualidade devem gerar resultados bons suficientes para mais do que compensar isso no longo prazo.

Além disso, as big techs têm encontrado um clima regulatório complexo e com dificuldades de acompanhar as rápidas mudanças de modelos de negócio e novas formas de engajar consumidores.

Dentre elas, a Microsoft parece ter sido a mais afetada enquanto busca aprovação regulatória para a compra da Activision Blizzard, empresa de gaming que busca adquirir por US$ 70 bilhões. A transação está em processo de aprovação pelos principais órgãos regulatórios dos países nos quais a companhia opera.

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O FTC (Federal Trade Commission), órgão americano, é presidido por Lina Khan desde 2021. Khan publicou, ainda enquanto estudante da Yale Law School, um estudo altamente influente na área antitruste intitulado “Amazon’s Antitrust Paradox”. Com ele, Khan aponta os furos no framework regulatório no que diz respeito a empresas de tecnologia e modelos de negócio que não existiam quando essas leis foram escritas. É vista como líder de uma nova “escola” de reguladores que buscam renovar as ferramentas de enquadramento das big techs.

A principal preocupação do FTC hoje em relação à aquisição da Activision por parte da Microsoft é que a empresa vai usar o Xbox, seu console, para tornar o principal produto da Activision, o jogo Call of Duty, exclusivo para quem tem Xbox.

Como o Call of Duty é o jogo mais popular do mundo, o FTC alega que seria uma prática anticompetitiva da Microsoft obrigar seus usuários a comprar um Xbox. A companhia já submeteu documentos ao FTC garantindo que o Call of Duty permaneceria disponível para ser jogado em todos os consoles que hoje o comportam. O julgamento está datado para agosto de 2023. A incerteza quanto ao resultado desse processo vem pesando sobre a ação da Microsoft.

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O setor de tecnologia foi um dos – senão o maior – beneficiário do pós-crise de 2008 que viu um mercado de capitais inundado de liquidez e dinheiro barato com investidores encantados com ações de empresas que cresciam em ritmo acelerado e prometiam disrupções que mudariam a forma como consumimos, nos comunicamos e nos relacionamos. Muitas dessas promessas foram cumpridas e as ações das big techs tiveram violenta expansão de múltiplos, entregaram ótimos retornos para investidores e se tornaram os players centrais do mundo dos negócios.

Agora, o cenário é diferente. Neste ano, as big techs terão que enfrentar pressões regulatórias vindas de órgãos europeus e do FTC, navegar o ambiente de sindicalização de funcionários nos Estados Unidos, reter talentos enquanto suas ações declinam, encontrar formas rentáveis de aplicar suas grandes posições de caixa. Tudo isso enquanto lidam com um ambiente incerto de negócios e ceticismo por parte do mercado preocupado com inflação e aumento da taxa de juros.

Nessa situação, pensamos que o trabalho do investidor fundamentalista de longo prazo é conseguir separar o joio do trigo. Algumas dessas empresas parecem ter tido compressões de múltiplos desproporcionais à perspectiva de geração de valor que podem entregar no futuro. Se a análise for feita com critério e profundidade, investir enquanto uma empresa está “fora de moda” pode render ótimos retornos.

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Roberto Vinhaes

Roberto Vinhaes é sócio da Nextep Investimentos. Engenheiro formado pela PUC-Rio, foi um dos fundadores da Investidor Profissional, a 1ª gestora independente de fundos do país

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Maria Antonia Viuge

Sócia e analista sênior da Nextep Investimentos. É economista formada pela UFRJ e pela Kingston University London