O metaverso, utopia futurista que busca unir os mundos real e virtual, saiu das páginas dos livros de ficção científica e foi parar nas mesas dos investidores e das grandes empresas. O potencial que cerca essa ideia é tão grande que fez até o Facebook trocar seu nome para “Meta”.
Neste guia, o InfoMoney explica o que é o metaverso, quando ele surgiu e por que os grandes conglomerados querem surfar nessa onda. Revela também como investir nesse novo mercado e qual a relação desse universo com as criptomoedas.
O que é metaverso
Metaverso é uma espécie de nova camada da realidade que integra os mundos real e virtual. Na prática, é um ambiente virtual imersivo construído por meio de diversas tecnologias, como Realidade Virtual, Realidade Aumentada e hologramas.
Para visualizar o conceito, pense no filme Matrix, dirigido por Lilly e Lana Wachowski. No longa, as pessoas vivem em uma realidade virtual arquitetada por uma inteligência artificial assassina que usa seus corpos para produzir energia. O metaverso é mais ou menos por aí, mas sem as máquinas vilãs – pelo menos por ora.
Nesse universo, que ainda não é real em sua totalidade, as pessoas poderiam interagir umas com as outras, trabalhar, estudar e ter uma vida social por meio de seus avatares (bonecos virtuais customizados) 3D. Ou seja, o objetivo é que pessoas não sejam apenas observadores do virtual, mas façam parte dele.
Entusiastas veem no metaverso a evolução da internet. Outros enxergam nele um risco para a privacidade, e uma “droga” viciante. A implantação dessa utopia, no entanto, ainda depende do amadurecimento de algumas tecnologias, como o próprio 5G.
Como (e quando) surgiu o metaverso
Apesar de ter virado pop recentemente, o termo metaverso é antigo. Ele foi cunhado pelo escritor Neal Stephenson em seu livro de ficção científica “Snow Crash”, publicado em 1992. A obra conta a história de “Hiro Protagonist”, personagem que na “vida real” é um entregador de pizza, mas no mundo virtual – chamado na história de metaverso – é um samurai.
Em 2011, o escritor Ernest Cline também tratou do tema em seu romance futurista “Ready Player One” (Jogador Número 1 no Brasil)”, que em 2018 ganhou as telas do cinema pelas mãos de Steven Spielberg. Na obra, os personagens vivem em um mundo distópico e, para fugir da realidade, costumam passar horas e horas no OASIS, um simulador virtual que dá a eles a possibilidade de serem o que bem entenderem.
Primeiras tentativas de metaverso
Alguns projetos tentaram criar algo semelhante a um metaverso. Um dos principais exemplos é o jogo Second Life, lançado em 2003 pela empresa Liden Lab, baseada nos Estados Unidos. O game é um ambiente virtual 3D que simula a vida real. Ao entrar, os usuários podem criar avatares e socializar uns com os outros.
O jogo atraiu milhares de gamers, mas não conseguiu unir completamente os mundos real e virtual. Um dos motivos é que o projeto não foi capaz de criar uma economia digital, na qual as pessoas pudessem ganhar dinheiro ou mesmo ter uma propriedade virtual, algo que hoje em dia é possível.
Games como Roblox, Fortnite e Minecraft também bebem do conceito do metaverso, e apresentam alguns elementos desse novo universo. Nesses jogos, as pessoas têm seus próprios personagens, participam de missões, se relacionam uns com os outros e vão a eventos. A cantora norte-americana Ariana Grande fez um show dentro do Fortnite, por exemplo.
Vale lembrar, no entanto, que a proposta do metaverso vai além dos jogos online. A ideia é que todos os aspectos da “vida real” da pessoa – lazer, trabalho, relacionamentos, estudo e outros – sejam permeados de forma imersiva pelo digital, e vice-versa.
Mudança do nome do Facebook Inc para Meta
No meio do burburinho ao redor do termo, o Facebook Inc. anunciou em outubro de 2021 que a organização passaria a se chamar Meta (as redes sociais continuam com o mesmo nome). No anúncio, o fundador e presidente da companhia, Mark Zuckerberg, disse que a mudança se deve ao novo posicionamento do grupo:
“Hoje somos vistos como uma empresa de mídia social, mas em nosso DNA somos uma empresa que constrói tecnologia para conectar pessoas, e o metaverso é a próxima fronteira, assim como a rede social foi quando começamos”.
Em carta divulgada ao público, Zuckerberg detalhou o mundo virtual que a empresa, que está na mira da autoridade antitruste nos Estados Unidos, espera construir:
“No metaverso, você será capaz de fazer quase tudo que você possa imaginar – reunir-se com amigos e família, trabalhar, aprender, brincar, fazer compras, criar – bem como ter experiências completamente novas que realmente não se encaixam em como pensamos sobre computadores ou telefones hoje”.
O “namoro” do Facebook pelo metaverso é antigo, e o interesse comercial não é novidade. Em 2014, o grupo comprou a Oculus, empresa que fabrica headsets de realidade virtual. São equipamentos necessários para acessar essa nova realidade ainda em construção.
Em agosto de 2021, a empresa também lançou o Horizon Workrooms, uma ferramenta que dá aos usuários a possibilidade de criarem avatares e participarem de reuniões virtuais. Vale lembrar, também, que o Facebook trabalha no desenvolvimento da Diem (antiga Libra), sua própria criptomoeda – outra tecnologia necessária para o metaverso.
Empresas que apostam no metaverso
Não é só o Facebook que entrou de cabeça nessa nova onda. A Nvidia, por exemplo, anunciou em agosto o NVIDIA Omniverse, uma plataforma colaborativa de simulação. Nela, designers, artistas e outros profissionais podem trabalhar juntos na construção de metaversos.
Já a Microsoft colocou no mercado, no início de 2021, o Mesh, uma plataforma que permite a realização de reuniões com hologramas. Também criou avatares 3D para o Teams, sua ferramenta de comunicação.
Em novembro, em um aceno à utopia, a Nike criou a Nikeland, uma plataforma dentro do game Roblox. Já em dezembro, a multinacional americana adquiriu uma startup especializada em NFTs de moda.
E não são apenas empresas estrangeiras que apostam nesse mercado. O Banco do Brasil também entrou na “brincadeira”, e lançou no final de 2021 uma experiência virtual dentro do servidor do game GTA. No jogo, o gamer pode abrir na instituição bancária uma conta para seu personagem – é possível até trabalhar como abastecedor de caixa.
Futuro da internet
Muitos entusiastas enxergam no metaverso um componente-chave da web 3.0. Esse termo é usado para se referir a uma internet mais imersiva, descentralizada e aberta.
No momento, pode-se dizer que o mundo está na web 2.0, cuja principal característica é ser um ambiente de iteração mediado por redes sociais.
Já a web 1.0, que ocorreu entre 1999 e 2004, é aquela “primitiva”, marcada por páginas estáticas. Foi por meio dela que as pessoas passaram a ter contato com o ambiente online.
O mercado bilionário do metaverso
A Bloomberg Intelligence estima que esse mercado deve chegar a US$ 800 bilhões (R$ 4,5 trilhões) em 2024, puxado principalmente pelos games de metaverso e por eventos realizados nessa nova camada de realidade.
A gestora Grayscale é um pouco mais otimista na previsão, e diz que o metaverso é um mercado com potencial para gerar US$ 1 trilhão (R$ 5,5 trilhões) em receita anual.
“O metaverso é um universo digital que vai além da internet que conhecemos hoje. Essa visão para o estado futuro da web tem o potencial de transformar nossas interações sociais, negociações comerciais e a economia da Internet em geral”, citou a empresa em relatório divulgado em novembro de 2021.
Quais tecnologias estão envolvidas
Para dar vida ao metaverso, uma série de tecnologias precisam ser empregadas.
Realidade Virtual
A “VR”, sigla em inglês para Realidade Virtual, se refere a um ambiente tridimensional construído por meio de softwares. Para ter acesso a essa simulação da realidade, os usuários precisam de computadores, óculos de realidade virtual, fones de ouvido e outros equipamentos. Há consoles e games que usam essa tecnologia.
Realidade Aumentada
Diferente da VR, que leva o usuário para dentro do mundo virtual, a AR (sigla em inglês para Realidade Aumentada) faz o oposto, e insere dados virtuais no mundo real. Há vários games para smartphones que usam a tecnologia, como o Pokémon Go. Há também óculos de AR que mostram em suas lentes informações sobre o ambiente.
Blockchain e criptos
A blockchain (banco de dados público e descentralizado), as criptomoedas e os NFTs (sigla em inglês para tokens não fungíveis) também dão suporte para o metaverso. Por meio delas, é possível movimentar valores e realizar o registro de propriedades virtuais.
Qual a relação do metaverso com o mercado de criptos
A ideia é que o metaverso tenha uma economia virtual própria, e que as pessoas possam trabalhar, adquirir casas, comprar roupas, ir a festas, fazer reuniões e ter de fato uma vida online. A blockchain e as tecnologias que “rodam” nela – criptos, NFTs e outros – são essenciais para essa nova realidade.
A blockchain, por exemplo, pode ser a base da economia do metaverso. Essa tecnologia, que nasceu com o Bitcoin (BTC) no final de 2008, permite a criação de registros imutáveis sem a necessidade de uma terceira parte, e é uma ferramenta e tanto para governança.
Já as criptomoedas seriam os meios de troca dessas plataformas. Há inclusive alguns projetos em andamento que utilizam cripto, como os games Decentraland (MANA), Sandbox (SAND) e Axie Infinity (AXS).
Os NFTs, por fim, servem para registrar e negociar propriedades e itens virtuais. Os tokens não fungíveis são certificados digitais que qualquer um pode ver e confirmar a autenticidade, mas ninguém pode alterar.
A economia cripto do metaverso
Já existe uma economia do metaverso construída em blockchain, com produtos e serviços. Veja alguns dos exemplos citados em relatório da Grayscale.
Música – Cantores e djs já estão realizando eventos em ambientes digitais, e recebendo por isso. O show feito pela cantora Ariana Grande é um exemplo.
Publicidade – Proprietários de imóveis construíram outdoors, e passaram a vender esses espaços para jogadores que querem fazer algum tipo de anúncio.
Cassino – Existem cassinos em plataformas de metaverso, onde os gamers podem apostar em jogos de azar e levar – ou perder – algumas criptomoedas.
Arte – Artistas virtuais também comercializam suas obras de arte registradas em NFTs nesses ambientes digitais. Casas físicas de renome, como Sotheby’s, se renderam a esse tipo de negócio.
Como investir no Metaverso
Há diversas formas de investir no metaverso.
Criptomoedas – Uma das maneiras de participar dessa utopia futurista é comprando as criptomoedas associadas a ela. Decentreland (MANA), Sandbox (SAND) e Enjin Coin (ENJ) são algumas delas. Essas moedas digitais podem ser adquiridas por meio de exchanges. Geralmente há taxas de saques e transferências.
Fundos de investimentos – É possível também aplicar em fundos voltados ao metaverso. Em dezembro de 2021, a gestora brasileira Vitreo lançou o produto “Vitreo Metaverso”, que investe apenas em ações ligadas ao setor. O aporte mínimo é R$ 1.000. A empresa cobra 0,9% ao ano de taxa de administração e 10% de taxa de performance sobre o que exceder o índice S&P500 Total Return.
Terrenos virtuais – Outra forma de investir é adquirir terras virtuais no metaverso em plataformas e vendê-las no futuro. Em novembro, um terreno virtual de 566 metros quadrados de um game do metaverso foi vendido por US$ 2,4 milhões em criptomoedas.
Quais são as criptomoedas impulsionadas pelo metaverso
Há diversas criptomoedas associadas à utopia. Algumas delas são as seguintes:
Descentraland (MANA)
É um ambiente virtual construído na blockchain do Ethereum (ETH). A MANA é a criptomoeda nativa da plataforma. O projeto tem atraído marcas e empresários interessados em criar negócios digitais. É um dos principais representantes do metaverso.
Enjin Coin (ENJ)
Essa plataforma disponibiliza ferramentas para criação de produtos em blockchain e NFTs sem taxas. O ENJ é seu token nativo. Em 2021, o projeto criou um fundo de US$ 100 milhões para apoiar iniciativas do metaverso, como jogos que mesclam as realidades física e virtual.
Sandbox (SAND)
Nasceu como um rival do Minecraft, mas depois passou por uma reformulação e mergulhou no universo da blockchain e das criptomoedas. É um ambiente virtual onde as pessoas podem jogar, construir casas e ter uma vida virtual.
Gala (GALA)
É um ecossistema de jogos play-to-earn (jogue para ganhar) para blockchains. O GALA é seu token nativo. O primeiro título lançado pela plataforma foi o Town Star, um simulador de ambiente rural. Outros games são Echoes of Empire, Mirandus, Spider Tanks e Fortified.
Axie Infinity (AXS)
É um jogo em blockchain que ajudou a popularizar o conceito de play-to-earn. Funciona de forma semelhante ao Pokémon. Os players criam personagens e batalham com monstros ou outros jogadores. O AXS é o token de governança do jogo, e dá para os detentores poderes de decisão dentro do ecossistema.
MyNeighborAlice (ALICE)
É um game em blockchain em que os jogadores podem construir ilhas virtuais, bem como coletar e construir itens. O ALICE é seu token nativo. Com o ativo, os usuários podem comprar objetos virtuais do ecossistema, fazer staking (emprestar as criptomoedas para a rede em troca de lucro) ou participar de decisões do jogo.
Críticas ao metaverso
Um futuro meio real e meio virtual não agrada a todo mundo. Centralização, privacidade e vício são alguns dos receios levantados por especialistas.
Centralização – O conceito do metaverso ainda está em construção, mas a ideia por trás da utopia, em especial aquela defendida por entusiastas do mercado de criptomoeda, é que ele seja descentralizado e aberto a todos. No entanto, a entrada de empresas como Facebook e Microsoft na jogada sugerem que as big techs vão fazer de tudo para controlar de alguma forma parte desse mercado.
Privacidade – Por causa da possível centralização do metaverso, a questão da privacidade também veio à tona. Se empresas como Facebook, Google e outras já detêm um mundaréu de dados dos usuários de seus produtos e serviços, imagine quando as pessoas passarem a viver 24 horas por dia conectadas.
Vício – Outro ponto que tem gerado críticas é o fato de o metaverso ser um tipo de tecnologia que vicia e faz as pessoas se desconectarem da realidade. No filme Jogador Nº1, o personagem James Donovan Halliday (Mark Rylance), criador do metaverso OASIS, disse no final do longa que se deu conta que criou uma realidade virtual porque tinha medo de se relacionar com as pessoas:
“Eu criei o OASIS porque nunca me senti à vontade no mundo real. Eu não sabia como me conectar às pessoas lá. Eu tive medo durante toda minha vida. Até o dia que soube que ela (vida) estava no fim. Foi quando eu dei conta de que por mais aterrorizante e dolorosa que a vida possa ser, é também o único lugar para se fazer uma refeição decente”.