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Retomar o equilíbrio fiscal é prioridade em todos os programas de governo até agora apresentados na disputa pela Presidência da República nas eleições de outubro. Mas as estratégias para tentar alcançar este feito variam.
Fora da polarização entre os mais bem colocados nas pesquisas, Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), economistas que auxiliam as candidaturas da chamada terceira via divergem em vários pontos, por exemplo: incluir ou excluir investimentos públicos do cálculo da meta fiscal do governo?
Elena Landau, coordenadora do programa econômico de Simone Tebet (MDB), e Nelson Marconi, coordenador do programa de governo de Ciro Gomes (PDT), participaram da Expert 2022, evento organizado pela XP, em São Paulo, e falaram sobre como seus candidatos pretendem ajustar o quadro fiscal do país a partir do próximo ano.
Os economistas e coordenadores dos demais candidatos ao Planalto em 2022 também foram convidados para o evento, mas não compareceram.
“O Bolsonaro é o presidente que mais aprovou PECs [Propostas de Emenda à Constituição] no Brasil. Acho que foram mais de 20. Ele tinha a faca e o queijo na mão para fazer todas as reformas. Não adianta botar a culpa no Congresso. Se tem um presidente que tinha o Congresso na mão, é esse. Por que que não fez a reforma tributária? Por que que não avançou na avaliação da reforma administrativa? Por que que não avançou na avaliação de despesa obrigatória? Não fez nada”, afirmou Landau.
“Temos que recuperar a credibilidade fiscal. Não é com imposto inflacionário que a gente vai resolver o problema do equilíbrio fiscal no Brasil. (…) A gente tem que ter uma regra fiscal e um entendimento de que a questão fiscal é pressuposto. Não é objetivo em si de nenhum governo, seja democrata, social, liberal. A questão fiscal é a base de uma sustentabilidade para que a gente possa ter políticas econômicas efetivas. Políticas de mobilidade social, políticas de melhoria da economia verde, tecnologia. Toda vez que a gente estourou a questão fiscal, teve rebote. A gente só teve avanços sociais no Brasil quando a gente teve estabilidade fiscal”, completou.
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A economista diz que é preciso rever uma regra de controle de despesas e acabar com o imposto inflacionário, que consiste na receita gerada pelo governo pela emissão adicional de moeda para custear seus gastos — não é um imposto propriamente dito, mas é chamado assim porque o maior volume de dinheiro colocado em circulação faz com que a inflação aumente e, consequentemente, o poder aquisitivo da população caia.
“E tem que vincular isso tudo a alguma coisa que se perdeu: uma meta de superávit primário, uma redução da relação entre dívida e PIB [Produto Interno Bruto], porque a gente precisa também mostrar para a população porque que a gente precisa de regra fiscal”, disse Landau.
No programa de Ciro, Marconi ressaltou que a questão fiscal é “essencial para o país ter estabilidade do ponto de vista inflacionário e das contas públicas” e “essencial para o governo recuperar a capacidade de investimento”. Ele criticou o atual teto de gastos do governo e disse que ele já se mostrava muito pouco realista quando ele foi implementado.
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O teto de gastos foi estabelecido pela Emenda Constitucional 95, em 2016, com vigência de 20 anos. Ela começou a valer em 2017 e prevê um limite de aumento de gastos para o governo atrelado ao aumento da inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). Dessa forma, o orçamento disponível para gastos da União só pode ser reajustado em um ano levando em consideração a inflação do ano anterior.
“A regra fiscal tem que ser uma regra que corrija as despesas correntes pela inflação e pelo crescimento do PIB, deixando o investimento [público] fora desse cálculo”, afirmou o economista. “Nossa ideia é fazer um fundo de investimentos que tire os investimentos dessa lógica anual orçamentária. O investimento não é uma despesa que se realiza em um ano só. Ele tem que ser algo de longo prazo, quando é feito pelo governo e pelo setor privado. O do governo hoje fica a mercê de questões orçamentárias quando na verdade ele tinha que ter uma estabilidade maior.”
Segundo Marconi, o ajuste fiscal proposto por Ciro passa pela redução de uma “boa parte dos incentivos fiscais, em torno de 20%; a recriação do imposto sobre lucros e dividendos distribuídos, não os reinvestidos; o imposto sobre grandes fortunas; e cortes de despesas correntes”.
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“A gente precisa ter um orçamento base zero. Significa que eu não posso levar em conta apenas o histórico da execução orçamentária para fazer o planejamento do ano seguinte. Isso é uma prática do governo brasileiro que leva os ministérios que gastam mais a serem premiados. E os ministérios que são mais rigorosos, que controlam mais os gastos, acabam sendo punidos. A gente precisa mudar essa lógica orçamentária também”, afirmou.
No ponto dos investimentos públicos, Landau diz que discorda de Marconi. “Nós não vamos tirar investimento público de jeito nenhum do teto. Nada. Se tirar qualquer coisa algum dia na vida será gasto social. A gente tem um grupo que a gente brinca que o Ceará é a Suíça brasileira, como se só no Ceará tivesse educação de primeira infância, por conta dos investimentos que estão fora do teto. Não, temos exemplo de primeira infância, de boa educação, em Teresina, em Roraima, em Pernambuco, no estado de São Paulo, que tem superávit. O Ceará de fato é um exemplo na educação pela continuidade de política de qualidade, apesar da troca de governos”, completou.