O que a queda do euro para US$ 1 significa para o mercado de criptomoedas

A moeda europeia atingiu o menor valor em 20 anos e está próxima da paridade com o dólar

CoinDesk

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A queda do euro para US$ 1 pela primeira vez em 20 anos, fato que fez a moeda se aproximar da chamada paridade com o dólar americano, chamou a atenção dos traders de criptomoedas, que se voltaram para o impacto da taxa de câmbio nos ativos digitais e para as stablecoins vinculadas à moeda europeia.

Graças ao surgimento nos últimos anos de stablecoins ligadas a moedas fiduciárias além do dólar americano, o dinheiro oficial de outras nações têm se “infiltrado” lentamente nos mercados de ativos digitais.

E alguns observadores dizem que a última queda do euro pode injetar pressões de baixa no mercado do Bitcoin (DOT) e influenciar a demanda por moedas estáveis atreladas ao euro.

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“A turbulência cambial (como a vivida atualmente pelo euro) geralmente acaba favorecendo o dólar americano, pois os participantes do mercado cambial o veem como uma moeda ‘menos arriscada’. Isso é acentuado pelas trajetórias divergentes das taxas de juros entre os Estados Unidos e a União Europeia”, disse Noelle Acheson, chefe de insights de mercado da empresa de negociação de criptomoedas Genesis Global Trading.

“[Esse cenário] pode impactar negativamente o preço do Bitcoin em termos de dólares, que nos últimos dois anos tem sido negativamente correlacionado com o U.S. Dollar Index”.

O euro desvalorizou 10% em relação ao dólar neste ano, um movimento significativo para o principal par de moedas fiduciárias do mundo. A taxa de câmbio foi vista pela última vez sendo negociada perto de 1,02, ou 200 pips (abreviação de porcentagem em ponto) abaixo do nível de paridade de 1,00.

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O declínio parece ter sido consequência do atraso do Banco Central Europeu (BCE) em relação ao Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) no aperto da política monetária, apesar do aumento da inflação, da ameaça de uma crise energética total na UE e dos temores de recessão.

“Existem riscos evidentes de recessão hoje em dia e de redução do excesso de financiamento de margem em dólar dos mercados de valores mobiliários”, disse Gregory Klumov, CEO da plataforma de stablecoins Stasis, por e-mail. A Stasis é a emissora da Euro Stasis (EURS), a segunda maior stablecoin atrelada ao euro do mundo.

“Quando isso acontece, todos os mutuários compram dólares de volta para pagar os empréstimos que fizeram para melhorar os retornos e aumentar sua exposição a ativos de risco”, disse Klumov. “Portanto, quando os ativos são vendidos e o financiamento é devolvido, o dólar cresce. O euro não é exceção nesse caso.”

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Os especialistas do mercado de câmbio estão convencidos de que o BCE continuará a ficar para trás, permitindo que o EUR/USD caia bem abaixo de 1,00. Projetar uma decolagem de uma taxa de juros negativa recorde de -0,5% é difícil para o BCE, já que as expectativas hawkish (mais duras) recentemente viram os rendimentos dos títulos italianos entrarem em colapso em relação aos seus homólogos alemães, aumentando os riscos de fragmentação. A fragmentação significa essencialmente que, à medida que o banco central aumenta as taxas, o impacto do aperto não é sentido da mesma forma em toda a área da moeda comum da Zona do Euro.

Os mercados financeiros são movidos pelo sentimento; portanto, quando uma importante moeda nacional como o euro é pisoteada e empurrada para níveis críticos ou abaixo deles, os investidores tendem a sair de ativos arriscados e buscar refúgio em ativos seguros estabelecidos, como o dólar americano e títulos do governo. Portanto, a queda do EUR/USD abaixo de 1,00 pode estimular uma ampla demanda pelo dólar, empurrando BTC e outros ativos de risco para baixo.

Apesar de os entusiastas do Bitcoin falarem há tempos que o criptoativo é ativo de refúgio, historicamente a moeda digital se moveu em conjunto com as ações de tecnologia e na direção oposta ao Índice do Dólar (DXY). Por exemplo, o DXY, que acompanha o valor da moeda norte-americana contra uma cesta de moedas fortes, subiu quase 12% este ano. Enquanto isso, o BTC e o índice Nasdaq despencaram 55% e 27%, respectivamente.

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Não que as coisas não possam mudar. Mas esse tem sido o principal padrão

Stablecoins atreladas ao euro

As stablecoins atreladas ao euro podem perder seu brilho.

Stablecoins são tokens baseados em uma blockchain que correspondem ao poder de compra de ativos tradicionais, como moedas fiduciárias, metais ou commodities. O emissor de uma stablecoin promete que os usuários ou detentores podem resgatar o investimento a qualquer momento a uma taxa de câmbio de um para um.

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A estrutura expõe o usuário ao risco cambial. Por exemplo, suponha que um trader chamado Bob comprou há um mês a EURT, stablecoin lastreada em euro da Tether. Teoricamente, Bob pode resgatar EURT por um EUR a qualquer momento. No entanto, o EUR/USD caiu 4,2% de 1,065 para 1,02 em quatro semanas. Portanto, se Bob resgatar o EURT hoje, o resgate geraria uma perda de 4,2% em dólares, supondo que ele não ganhasse rendimento adicional emprestando o ativo nos protocolos de empréstimos descentralizados.

Portanto, os detentores de stablecoins atreladas ao euro podem optar por resgates, dada a perspectiva de baixa para a moeda comum.

“No geral, 1.0 é um nível psicológico importante”, disse Dessislava Aubert, analista sênior de pesquisa da Kaiko, com sede em Paris, ao CoinDesk por e-mail. “Se quebrar, provavelmente estimulará alguma volatilidade cambial no curto prazo, se espalhando para outras classes de ativos, incluindo criptomoedas, e desencadeará a venda de ativos lastreados em euros”.

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Laurent Kssis, diretor administrativo e chefe na Europa da gestora de criptoativos Hashdex, disse que o mercado de stablecoins atreladas ao euro pode ser testado por sua robustez e ficar sob pressão.

Os investidores já estão abandonando os ativos denominados e lastreados em euros, de acordo com Gregory Klumov, CEO da plataforma de tokenização Stasis. “Em uma situação em que ocorre uma saída de capital de ativos, ações e títulos em euros, pode-se observar que as ações em euros estão caindo mais do que os índices americanos nas últimas semanas. E, claro, as stablecoins de euro estão caindo mais em relação às suas contrapartes em dólar”, disse Klumov.

“Como o dólar continua sendo a referência número 1 para determinar os preços no reino das criptomoedas, mesmo para usuários europeus, uma stablecoin atrelada ao euro é percebida como um ativo arriscado (embora o EURS não seja um ativo arriscado por acaso). Há saídas de euro acontecendo agora e os investidores vão transformar tudo em dólares em tal situação”, acrescentou Klumov.

Uma questão é se potenciais resgates e volatilidade nas stablecoins atreladas ao euro teriam um efeito de contágio semelhante ao do ecossistema Terra no mercado de criptomoedas mais amplo. A resposta provavelmente é não, porque segmento é bastante pequeno.

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O mercado de stablecoins atreladas ao euro valia US$ 440 milhões no momento da publicação deste ano. Isso é apenas 0,29% do valor de mercado de US$ 151 bilhões das stablecoins de dólar, de acordo com dados do agregador CoinGecko. A capitalização de todo o mercado cripto é de cerca de US$ 950 bilhões.

A maior stablecoin atrelada de euro até o momento era a EURT, com valor de mercado de US$ 210 milhões. A Euro Stasis, ou EURS, a segunda na lista, tinha uma capitalização de US$ 126 milhões. A stablecoin algorítmica TerraUSD (UST) tinha um valor de mercado de US$ 18 bilhões antes de entrar em colapso em meados de maio, arrastando o setor cripto para baixo.

“As stablecoins apoiadas pelo euro ainda são uma parcela tão pequena do mercado geral que qualquer resgate que a atual fraqueza do euro possa desencadear não afetaria materialmente o valor do mercado geral”, disse Acheson.

Até o momento, o EURT foi negociado com um pequeno desconto, logo abaixo do 1 euro na exchange Bitstamp, tendo caído para 0,96 euros em 20 de junho. O pareamento quebrou após o colapso da UST em maio. Enquanto isso, o EURT foi negociado com um leve prêmio na corretora cripto FTX.

Jogo de soma zero

O mercado de câmbio é um jogo de soma zero. Quando dizemos que o euro provavelmente perderá terreno em relação ao dólar, isso também significa que a moeda norte-americana deve subir e que há incentivo para manter os ativos atrelados a ela.

Portanto, embora a queda do EUR/USD possa prejudicar o apelo das stablecoins ligadas ao euro, pode também estimular a demanda por aquelas associadas ao dólar. Com o Fed elevando as taxas agressivamente para conter a inflação, os traders já têm uma razão sólida para manter as moedas digitais estáveis com paridade no dólar.

Além disso, espera-se amplamente que o BCE saia da política de taxas de juros negativas este ano, o que pode eventualmente ser um bom presságio para o euro e para os os ativos lastreados na moeda. A Circle, emissora da segunda maior stablecoin atrelada ao dólar, a USD Coin (USDC), lançou recentemente uma nova stablecoin lastreada em euro chamada EUROC, talvez na esperança de que os aumentos das taxas do BCE se traduzam em demanda por ativos lastreados em euro.

Operadores de taxas de juros esperam que o BCE aumente os custos de empréstimos de referência em 140 pontos base (1,4 ponto percentual) até o final do ano. A taxa de juro de referência do banco central situa-se atualmente em -0,5%.

“As taxas de juros crescentes beneficiarão produtos de rendimento, como as stablecoins”, disse Bill Cannon, chefe de gerenciamento de portfólio de produtos da gestora cripto Valkyrie. “Semelhante à estratégia tradicional de câmbio, a utilidade depende do uso do produto, e é nosso entendimento que as oportunidades são limitadas nos produtos ligados a stablecoins pareadas em euro neste momento. Mas, assim como tudo no mercado de criptomoedas, isso pode mudar rapidamente.”

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