O caso Binance: o que aprendemos com a suspensão de saques e resgates em reais

Clientes da Binance, exchange de criptoativos com o maior volume de mercado no Brasil e no mundo segundo algumas estimativas, não podem resgatar ou depositar valores em reais há mais de uma semana, obrigando usuários a buscarem soluções alternativas.Até onde as criptomoedas vão chegar? Qual a melhor forma de comprá-las? Nós preparamos uma aula gratuita […]

Isac Costa

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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Clientes da Binance, exchange de criptoativos com o maior volume de mercado no Brasil e no mundo segundo algumas estimativas, não podem resgatar ou depositar valores em reais há mais de uma semana, obrigando usuários a buscarem soluções alternativas.

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O caso é um exemplo do que sinalizei, ainda em abril, em conversa no programa Cripto+ do InfoMoney: usuários estão sujeitos ao impedimento de resgates em reais em função de descumprimento de regras do Banco Central por algumas exchanges e suas parceiras, como já ocorreu no Reino Unido.

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O tema deve ser analisado no contexto das interrupções de saques em empresas como Celsius, Babel, Voyager, Hoo.com e Finblox, dada a recente desvalorização dos criptoativos e a especulação de que perdas causadas pelo uso indevido dos recursos de clientes podem ser a causa da suspensão do serviço. Contudo, precisamos compreender as peculiaridades de cada caso para evitar pânico e desinformação.

O episódio traz um alerta para os investidores: é preciso conhecer os mecanismos de depósito e resgate de reais nas exchanges, pois as transações com a moeda brasileira podem ser interrompidas diante de problemas com o parceiro local ou com o Bacen.

Por que as operações com reais foram interrompidas?

Esses riscos já existem, mesmo antes da edição da lei de ativos virtuais atualmente em tramitação no Congresso Nacional, pois as normas de prevenção à lavagem de dinheiro já se aplicam aos bancos, financeiras e instituições de pagamento.

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Qualquer exchange que permita transações em reais precisa ter acesso ao sistema de pagamentos brasileiro via instituição autorizada pelo BC, mantendo contas bancárias ou de pagamento.

Para transferir reais para uma exchange, deve-se fazer uma TED ou Pix para uma conta de uma filial ou parceiro local em uma instituição regulada, para as quais o regulador exige que uma série de informações cadastrais e rotinas de supervisão e comunicação de operações suspeitas de lavagem de dinheiro às autoridades.

Caso a exchange estrangeira não colete esses dados dos seus clientes ou não queira compartilhá-los com o parceiro local, este poderá sofrer atuação do Banco Central, que lhe exigirá informações sobre a efetividade de seus controles internos e o cumprimento da legislação.

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Diante de uma fiscalização, a instituição regulada que atende à exchange tem duas opções: obter as informações e adequar suas políticas e rotinas para continuar a prestar o serviço ou interrompê-lo, caso não entre em acordo com a exchange.

Segundo informações divulgadas pela imprensa, a interrupção das operações com reais na Binance deveu-se à segunda opção, diante da recusa, pela exchange, do fornecimento de dados de seus clientes brasileiros para o cumprimento de dever regulatório de KYC (Know Your Client), resultando no fim da parceria com a Capitual, que atua no país sem autorização do BC (embora use o nome “Banco Capitual”).

Polêmica em torno da lavagem de dinheiro

O tema é delicado porque a Binance se envolveu em uma discussão recente sobre ser um polo de atração para lavagem de dinheiro, por conta de reportagem investigativa feita pela Reuters, cujo teor foi negado pela exchange.

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A Binance foi alvo de investigações e restrições à sua atuação em diversos países (Estados Unidos, Reino Unido, China, Japão, Malásia, Canadá, Cingapura e Turquia) e foi acusada de ter controles pouco efetivos de compliance, utilizado indevidamente dados de clientes e divulgado informações falsas a investidores.

Publicamente, a exchange tem afirmado que pretende cumprir a regulação existente, ao se aproximar das autoridades e divulgar a obtenção de autorizações na França, Itália e Emirados Árabes. Porém, um olhar mais detido sobre a abrangência destas autorizações e episódios como o comentado aqui sugerem que o discurso e a prática podem estar em descompasso.

Não se tem certeza sobre a real razão para o rompimento da parceria Binance-Capitual. Há rumores sobre a busca de melhores termos comerciais com outro parceiro, estratégias concorrenciais (o Capitual presta serviços para outras exchanges), discordância com relação ao cumprimento de exigências regulatórias e compartilhamento de dados ou, simplesmente, uma tentativa da exchange de frear saques em um momento de maior incerteza do mercado.

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Lições aprendidas

Na semana passada, a Binance anunciou uma nova parceria com a Latam Gateway para a retomada de transações com reais. A empresa ainda não tem autorização do Banco Central, mas pode exercer a atividade de emissão de moeda eletrônica, por já prestar esse serviço antes do dia 1º de março de 2021, quando foi editada a Resolução BCB nº 80/2021, que prevê que, até dezembro de 2022, todas as empresas devem entrar com o pedido de autorização.

Até que a Latam Gateway seja autorizada, penso que a empresa atuará em uma zona cinzenta. Mas, desde logo, as autoridades brasileiras precisarão ter certeza de que serão cumpridas as obrigações de coleta de dados dos clientes e comunicação de operações suspeitas.

Resta saber, assim, se o BC virá a fiscalizar a Latam Gateway para verificar qualquer descumprimento da regulação vigente , diante do volume de transações e saldos dos clientes, o que pode levar a novas suspensões de operações com reais. Aguardemos os próximos capítulos.

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Isac Costa

Professor do Ibmec e do Insper, sócio do Warde Advogados. Doutorando (USP), Mestre (FGV) e Bacharel (USP) em Direito. Engenheiro de Computação (ITA). Ex-Analista de Mercado de Capitais (CVM).