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Elon Musk, escolhido a Pessoa do Ano de 2021 pela revista Time nesta segunda-feira (13), fala muito. Ou melhor, “tuita”. O empresário norte-americano de origem sul-africana é famoso por suas postagens no Twitter, ora irônicas, ora promovendo seus negócios, ora comentando criptomoedas – na sexta (10), chegou a brincar dizendo que pensava em deixar seu trabalho para se tornar um influenciador digital em tempo integral.
No mercado financeiro, seus tweets que mais reverberam são os que envolvem sua própria companhia, a fabricante de carros elétricos Tesla (TSLA34) . Não raro, os comentários provocam debate sobre as ações da empresa, com impactos reais sobre as cotações dos papéis nas bolsas de valores.
Um dos casos mais recentes ocorreu no dia 6 de novembro, um sábado, quando Musk lançou uma enquete no Twitter pedindo que seus seguidores opinassem sobra a venda ou não de 10% de suas ações da empresa.
Pessoa mais rica do mundo, segundo ranking da Bloomberg, maior acionista individual da Tesla e CEO da companhia, Musk disse aos seus cerca de 63 milhões de seguidores que obedeceria o resultado da enquete, em que 58% dos votantes responderam “sim” para a venda de ações. Às vésperas do imbróglio, Kimbal Musk, irmão do empresário, havia vendido US$ 109 milhões em ações da Tesla. Na segunda-feira (8) seguinte ao episódio, as ações fecharam em queda de 4,84%.
Analistas afirmam que é normal que os preços de uma ação caiam quando um grande acionista de uma empresa anuncia que pretende vender um lote volumoso. Um monte de gente corre para vender antes e realizar lucros, desde logo provocando o recuo.
Musk de fato vendeu ações da companhia na ocasião. Não os 10% mencionados na enquete, mas 4,5 milhões de títulos por cerca de US$ 5 bilhões. Os documentos relativos à transação mostram que a venda já estava prevista muito antes da consulta feita pelo Twitter. “Ele estava prevendo desde setembro que iria vender”, observou Alan Gandelman, CEO da corretora Planner.
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Canal informal
A diferença é que, ao invés de utilizar canais tradicionais para se comunicar com o mercado, o bilionário faz isso pelo Twitter, de maneira informal, e ainda joga para a “galera” decidir. “O que não é normal é fazer isso pelo Twitter”, comentou Luiz Carvalho, sócio da Winston Capital Advisors, de Nova York. “Uma empresa [de capital aberto] não pode se comunicar com uma pessoa ou um grupo de pessoas, tem que se comunicar com todo mundo. Ele (Musk) vê o Twitter assim (como um canal para se comunicar com todo mundo)”, acrescentou.
Companhias listadas se comunicam com seus acionistas pela divulgação de “fatos relevantes” ou publicação de anúncios em veículos de grande circulação. A popularização das redes sociais, no entanto, criou um novo paradigma, e as autoridades reguladoras do mercado tentam estabelecer limites. O próprio Musk foi processado pela SEC (Securities and Exchange Commission), a comissão de valores mobiliários dos Estados Unidos, por um tweet de 2018, em que dizia estar pensando em fechar o capital da Tesla.
O empresário concordou em pagar uma multa de US$ 20 milhões e se comprometeu a submeter seus tweets sobre a Tesla ao Jurídico da companhia antes da publicação. O acordo foi ratificado pela Justiça, mas, em junho de 2021, o Wall Street Journal revelou que em pelo menos duas oportunidades identificadas pela SEC Musk não submeteu suas postagens à aprovação dos advogados da empresa.
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O acerto previa ainda que ele deixasse o comando da empresa, o que não ocorreu. O bilionário tem o costume de desafiar autoridades.
Venda de ações da Tesla
Poucos dias antes de fazer a enquete, Musk fez um tweet dizendo que venderia papéis da Tesla se o Programa Mundial de Alimentos da ONU (PMA) mostrasse, de maneira transparente, como conseguiria acabar com a fome no mundo com US$ 6 bilhões. A postagem foi uma resposta ao diretor executivo do PMA, David Beasley, segundo quem, uma “pequena” ajuda dos “ultra-ricos” poderia resolver o problema da fome. Beasley acrescentou que 2% da fortuna de Musk, ou US$ 6 bilhões, seria suficiente. As ações da Tesla tiveram forte valorização depois do bate-boca.
Personagem
Gandelman destaca que Musk “é uma figura midiática” e usa esta característica para impulsionar seus negócios e interesses. “Ele segue neste estilo porque funciona“, diz o CEO da Planner, destacando que as ações da Tesla continuam acumulando forte alta no ano – de 44% até sexta-feira (10) – apesar das polêmicas. Para Gandelman, o bilionário é para suas empresas um personagem como Mickey Mouse é para a Disney.
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De fato, depois de tweets polêmicos, Musk costuma permanecer um bom tempo nas manchetes da imprensa internacional. “O exemplo é nós estarmos conversando sobre este assunto aqui no Brasil”, ressaltou Gandelman. “Esta personificação dele acaba dando mais valor às ações, impulsiona as coisas que ele de fato faz”.
Para Alberto Amparo, analista da Suno Research, o empresário sabe como ninguém capitalizar sobre plataformas gratuitas de marketing. “Ele interage, cria empatia, é diferente daquela figura distante de um CEO engomadinho”, afirmou.
A enquete sobre a venda das ações, por exemplo, teve como pano de fundo um projeto que tramita no Congresso norte-americano para taxar os super-ricos e financiar o pacote de infraestrutura lançado pelo presidente Joe Biden. A taxação atingiria cerca de 700 bilionários e poderia levantar US$ 557 bilhões nos próximos dez anos.
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Musk já havia se pronunciado contra o projeto e, ao fazer a enquete, citou novamente o assunto. “Muito tem se falado ultimamente que ganhos não realizados são uma forma de evitar impostos, então eu proponho vender 10% de minhas ações da Tesla”, escreveu no Twitter. Como no Brasil, nos Estados Unidos o lucro com ações, ou ganhos de capital, é tributado quando alguém vende papéis ou outros bens. O Imposto de Renda é cobrado sobre a diferença entre o valor da compra e o da venda.
Ocorre que muita gente rica não vende suas ações, então o governo norte-americano quer taxar o chamado “lucro não realizado”, ou seja, a diferença entre o valor da compra e o da cotação da ação em determinado momento, mesmo que ela não seja vendida. Bilionários conseguem usufruir de ganhos ao dar ações em garantia de empréstimos, tendo dinheiro na mão sem pagar impostos.
Musk fala – e faz
Segundo os analistas, a grande diferença entre Musk e outros palpiteiros por aí é que ele não só fala, mas entrega. A avaliação é que o desempenho de seus negócios faz com que o mercado releve comportamentos que seriam inadmissíveis em outros empresários.
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“É natural que estas declarações [como a da enquete] tenham impacto negativo no preço das ações, mas por ele ser a persona que é, isso tem menos impacto. Se fosse outra pessoa, talvez as ações caíssem mais do que as da Tesla”, disse Gustavo Maders, especialista de alocação da Ável Investimentos. “Ele é folclórico e o folclore ajuda [o negócio] a andar; mas ele entrega, pois o folclore sozinho não adianta”, acrescentou Gandelman.
Carvalho destaca que Musk tem uma longa tradição em negócios inovadores e transformou em sucesso operações que há alguns anos eram vistas com ceticismo, como a Tesla e a Space X. A empresa de viagens espaciais de Musk transporta cargas e passageiros para a Estação Especial Internacional, com foguetes recuperáveis, e está bem à frente das iniciativas de outros bilionários como Jeff Bezos, da Amazon, e Richard Branson, da Virgin.
A Tesla, por sua vez, anunciou resultados surpreendentes no terceiro trimestre de 2021. A empresa teve um lucro recorde de US$ 1,62 bilhão, um aumento de 389% sobre o mesmo período de 2020. Entregou mais de 240 mil veículos em três meses, mesmo com o atraso na entrega de componentes tecnológicos chineses, o que indica que a produção anual deve chegar perto de 1 milhão de unidades até o fim de 2021. Para se ter uma ideia, a produção de todas as montadoras no Brasil ficou em pouco mais de 2 milhões de unidades em 2020, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
A Tesla hoje tem uma capitalização de mercado acima de US$ 1 trilhão. Neste quesito, deixou outras montadoras para trás. Passou a gigante Toyota em julho de 2020, embora seu volume de produção seja bem menor. “O Elon Musk pode ser esquisito, mas ele não é um especulador que não gera valor nenhum para a sociedade”, declarou Carvalho.
Nesse sentido, segundo os analistas, dado tal sucesso não dá para falar em “risco Musk” quando ele diz alguma coisa que afeta os mercados. “Volatilidade não é risco”, observou Amparo sobre as ações da Tesla. Afinal, antes de caírem após a fatídica enquete, os papéis da empresa acumulavam valorização de quase 70% no ano. Ou seja, o recuo ocorreu em comparação com patamares bastante elevados. “Investidores sérios, grandes fundos, entendem isso”, declarou Gandelman.
Empresa ótima, ações arriscadas
Os especialistas afirmam que a empresa tem que ser analisada separadamente de sua ações. A companhia é considerada ótima, apresenta taxas de crescimento espetaculares e seus produtos viraram sonho de consumo. Afinal, saiu na frente das outras montadoras na oferta de carros elétricos, mercado que tende a crescer muito nos próximos anos com a redução do uso de combustíveis fósseis.
No entanto, as expectativas de crescimento que justificam cotação tão alta são igualmente enormes. De acordo com Carvalho, a empresa teria que atingir uma produção anual de 8 milhões de veículos em 2030. “A empresa eu acho espetacular”, afirmou. “Já a ação é arriscada em função desta expectativa de crescimento”.
Amparo destaca que o próprio Musk questionou no passado o alto valor das ações da Tesla. “Quem estudou o valuation da empresa não tem como justificar este preço”, observou. Para ele, “há um monte de especuladores em cima da Tesla” e pessoas que compram ações sem fazer uma análise profunda, “porque o vizinho comprou”.
Gandelman, por sua vez, avalia que a força da marca e a vantagem que ela tem no segmento de veículos elétricos pode sim justificar mais valorização. “Os pedidos existem. É factível, está aí”, declarou. Mader acrescenta que os papéis da empresa gozam de muita liquidez, e o comportamento de Musk, como na última semana, acaba dando a eles ainda mais liquidez.
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