Reajuste do aluguel nunca esteve tão distante do IGP-M, mostra levantamento

Referência para correção dos contratos, índice disparou – e a diferença para a alta efetiva dos aluguéis chegou ao maior nível da série do DataZap

Mariana Segala

Ilustração (Natee Meepian/Getty Images)
Ilustração (Natee Meepian/Getty Images)

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SÃO PAULO – A taxa de reajuste dos aluguéis residenciais no país nunca esteve tão descolada da sua principal referência – o IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado), calculado pela Fundação Getúlio Vargas.

Em janeiro, o indicador acumulava alta de 25,7% em 12 meses. Os contratos de aluguel, por sua vez, haviam sido reajustados em 2,7% no mesmo período, conforme apontava o Índice FipeZap de Locação Residencial. Levantamento realizado a pedido do InfoMoney mostra que o hiato entre um e outro chegou a 23,4%, o maior desde o início da série compilada pelo DataZap, em 2009.

O IGP-M é o índice de inflação normalmente adotado nos contratos como referência para atualizar o valor dos aluguéis a cada ano. Ele assumiu o posto de indicador “quase oficial” por tradição, já que não há qualquer obrigatoriedade nesse sentido.

“O IGP-M é um dos índices de inflação calculados há mais tempo, com metodologia consistente e credibilidade”, diz Danilo Igliori, economista do DataZAP. Isso explica por que ocupou esse espaço.

Ocorre que, em função da sua metodologia de cálculo, o indicador disparou no ano passado – e pegou muitos inquilinos de surpresa. Cerca de 60% dos preços que compõem o índice são os praticados no atacado e 10%, na construção civil. Só 30% refletem os preços ao consumidor. Por isso, o resultado do IGP-M nos últimos meses tem parecido tão distante do que os brasileiros observam no seu cotidiano.

O Índice FipeZap considera os valores dos anúncios de novos aluguéis e não incorpora no cálculo a correção dos contratos vigentes. Como resultado, capta rapidamente a evolução da oferta e da demanda por moradia ao longo do tempo.

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Expectativa X realidade

A distância entre a referência e a realidade do mercado de aluguéis cresceu ao longo do ano. Entre janeiro e junho, o hiato variou entre 1,4% e 2,7%. A partir do segundo semestre, disparou. Passou para cerca de 5%, depois para 9%, 15%, 22% – até chegar aos níveis de janeiro.

Em outros momentos da história, no entanto, chegou a acontecer o contrário: há pouco mais de dez anos, quando um “boom” imobiliário elevou o valor dos imóveis em praticamente todo o país, o IGP-M é que ficou para trás.

No início de 2009, enquanto o Índice FipeZap de Locação Residencial marcava altas de 16% acumuladas em 12 meses, o indicador de inflação apontava 8%. Na época, o hiato entre um e outro ficou negativo em 8% – o que significa que os aluguéis estavam subindo em um ritmo superior ao do índice de inflação. Essa situação persistiu até 2014.

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Por causa desses descolamentos recorrentes, há mais gente optando por trocar o IGP-M por outros índices de referência nos contratos de aluguel. Como o InfoMoney noticiou em dezembro, foi o que o portal imobiliário QuintoAndar fez ao adotar o IPCA como referência para reajuste dos aluguéis novos fechados por lá.

Qual é o melhor indexador para os aluguéis?

Há quem defenda que o IGP-M segue como a referência mais apropriada para reajuste dos aluguéis – caso da Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC).

“O indicador sempre refletiu a realidade da inflação dos negócios, enquanto outros índices medem a inflação de produtos e serviços controlados pelo governo”, defendeu José Roberto Graiche Júnior, presidente da AABIC, em pronunciamento recente da entidade.

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Na visão do executivo, assim como aconteceu em outros momentos – como em 2017, quando o IGP-M seguiu pela rota inversa e chegou a ficar negativo –, inquilinos e proprietários sempre têm liberdade para negociar, levando o mercado a se ajustar.

Mas nem todos pensam assim. “O IGP-M disparou por três razões: a alta do dólar, o aquecimento do mercado de commodities e desajustes pontuais em algumas indústrias, em função da pandemia de coronavírus”, diz Igliori, do DataZAP.

No curto prazo, questiona, em que medida os aluguéis realmente estariam atrelados a custos como esses? “Não faz sentido o locatário brasileiro ter um aumento maior porque a China está ampliando o consumo de commodities”, afirma o economista.

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Qual seria, então, a melhor alternativa para reajustar os contratos? Não há resposta fácil para essa pergunta. Para alguém que more no Brasil, mas tenha sua renda atrelada ao dólar – como pode ser o caso dos prestadores de serviços de empresas estrangeiras –, talvez o melhor fosse ter o aluguel corrigido segundo a dinâmica da moeda americana, por exemplo.

“Já para categorias profissionais que costumam ter os salários reajustados de acordo com o IPCA, esse índice seria o mais condizente com a sua realidade”, afirma o especialista.

No financiamento imobiliário, a variedade de índices de correção já é uma realidade. Nos contratos com a Caixa Econômica Federal, por exemplo, é possível escolher entre indexados como o IPCA ou a Taxa Referencial (TR) – recentemente, foi lançada uma nova opção com correção pela variação da poupança.

Mariana Segala

Diretora de Redação do InfoMoney