A pandemia pode ser o gatilho para um novo capitalismo

O capitalismo consciente recupera a essência fundamental do capitalismo de livre mercado

Rodrigo Moreira

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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A pandemia que trará marcas indeléveis em nossa geração ainda vai ser objeto de muitas discussões na academia em muitas áreas do conhecimento.

Durante os últimos meses, em diferentes conversas com líderes empresariais, o questionamento mais frequente entre eles era sem dúvida qual o principal aprendizado e o maior legado da crise no campo da gestão para as empresas.

Refleti bastante sobre esses possíveis takeaways. Naturalmente, nessas mesmas conversas, discorremos sobre a importância da flexibilidade, da resiliência e de uma gestão financeira mais focada na preservação de caixa.

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Contudo, o mais marcante legado da pandemia me parece que será a importância da harmonia e cooperação entre os diferentes stakeholders para a sustentabilidade das empresas.

Coincidentemente ou não, tive o privilégio de ler nos últimos dias o brilhante livro Capitalismo Consciente: Como Libertar o Espírito Heroico dos Negócios, de John Mackey e Raj Sisodia.

Gostaria, além de obviamente recomendar a leitura da obra, de apontar um caminho a partir do que aprendi: o capitalismo consciente recupera a essência fundamental do capitalismo de livre mercado.

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Líderes que se norteiam por seus princípios se baseiam na regra de ouro de que as trocas são orientadas para benefícios mútuos entre as partes e não por tradeoffs parecem estar mais alinhados com o zeitgeist, o espírito de nosso tempo.

O capitalismo não é um jogo de soma zero. Ele é capaz de gerar prosperidade por onde passa. Isso é um fato. O mundo prosperou de forma inédita sob a égide do capitalismo.

Muito do preconceito que se tem contra o capitalismo se baseia num “atalho” propagado por Friedman nos anos 1970, de que o objetivo primário das empresas seria essencialmente gerar lucro para os acionistas.

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Na verdade, reposicionar-se e comunicar melhor tais objetivos é fundamental. O papel verdadeiro das empresas é gerar valor para os stakeholders.

O lucro é condição para subsistência de longo prazo dos negócios. Condição para que eles possam exercer seu real papel na sociedade capitalista, mas não sua essência.

Isoladamente, o lucro está longe de espelhar a função primordial das atividades empresariais numa sociedade capitalista.

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E por que isso é importante? Por que isso ficou ainda mais evidente no contexto da pandemia?

Empresas conscientes desse papel possuem um propósito maior. Esse propósito cimenta uma cultura capaz de mobilizar seu próprio time, parceiros, clientes, fornecedores e a comunidade em geral.

Seu impacto é muito mais abrangente. Sua capacidade de entender o mercado e de estar centrada no cliente se torna mais natural e de mais fácil compreensão. Líderes e equipe estarão mais alinhados em situações de crise quando compartilham de um propósito claro.

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Com alto nível de consciência em torno deste propósito, alicerçado por valores sólidos, uma empresa se torna naturalmente resiliente e flexível.

É fundamental que as organizações resgatem sua consciência e o fundamento ético do real capitalismo. Elas devem nortear seus negócios para gerar valor para a sociedade como um todo.

O lucro sempre é condição necessária, mas será consequência natural da harmonia gerada dessa relação construtiva com os stakeholders.

Como é mencionado pelos autores na obra citada: “um empreendimento capitalista é bom porque cria valor; é ético porque se baseia na troca voluntária; é nobre porque pode dar significado a nossa existência; e é heroico porque tira as pessoas da pobreza e cria prosperidade. O capitalismo de livre-iniciativa é uma das mais poderosas ideias que o ser humano já teve.”

A regra do polegar para os gestores que querem de fato criar um business sustentável nessa lógica é o “ganha-ganha-ganha-ganha-ganha”.

Sendo enfático e até repetitivo: o segredo está em criar um senso de propósito que responde a uma série de perguntas fundamentais: Por que existimos? Por que precisamos existir? Qual contribuição queremos dar? O mundo fica melhor com nossa presença? Sentirá nossa falta se deixarmos de existir?

O propósito é a cola que mantém a empresa unida, como afirmam os autores do livro. A partir dessa cola, mobilizar todos os stakeholders em torno de um objetivo comum fica muito mais fácil.

Tenacidade e sustentabilidade passam a ser consequências. O lucro vem a reboque. Avalie se sua empresa de fato tem um propósito elevado, se ele está fundamentado em valores claros. Isso é mais importante do que as frequentemente insípidas declarações de missão e visão.

Exemplos de empresas guiadas por propósitos não faltam. Posso falar pela XP, da qual tenho orgulho de fazer parte. John Mackey, autor do livro, é co-CEO da Whole Foods. A obra cita vários exemplos de empresas americanas. Há diversas outras no Brasil também.

Faço um convite a todos os empresários e líderes a refletirem sobre o tema e promoverem uma transformação real em seus negócios.

Acredito que a verdadeira transformação de nossa sociedade parte de uma maior consciência cidadã. Evoluir de um “capitalismo de amigos” para um capitalismo consciente de livre mercado será fundamental para nosso futuro.

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Rodrigo Moreira

Sócio da Xp Inc., Mestre em Economia, Bacharel em Engenharia e head da XP Empresas. Possui 20 anos de experiência dedicados ao atendimento de empresas de grande e médio porte. Com passagens por Itau BBA, Unibanco, Pactual e Bozano, Simonsen.