Reunião da Opep+ trará mais otimismo para a Petrobras? Analistas (e o próprio CEO) mantêm cautela

Ação da petroleira teve alívio com forte alta do petróleo, mas ainda há muitas incertezas sobre o que pode acontecer na reunião dos grandes produtores

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Após registrar o pior trimestre da história, o petróleo teve boas notícias nos últimos dias: o contrato WTI para maio fechou em alta de 11,93%, em US$ 28,34 o barril, na New York Mercantile Exchange (Nymex), subindo 31,7% na semana. Já o Brent para junho avançou 13,93%, a US$ 34,11 o barril, na Intercontinental Exchange (ICE), com disparada semanal de 36,8%.

Tal desempenho deu um relativo respiro para as ações da Petrobras (PETR3; PETR4) que, após caírem mais de 50% nos primeiros três meses do ano em meio à derrocada do preço da commodity, tiveram na semana um forte desempenho. Os ativos PETR3 subiram 17,57% no período, enquanto os papéis PN tiveram salto de 15,34%.

O alívio começou na última quinta-feira com apenas dois tuítes de Donald Trump, presidente dos EUA. Trump falou sobre possíveis cortes maciços na produção de petróleo. Ele apontou que, após falar com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita (que teria falado com a Rússia), esperava um corte de 10 milhões de barris de produção (provavelmente referindo-se a 10 milhões de barris por dia), posteriormente elevando o número para 15 milhões de barris (também por dia).

Os sauditas e os russos não confirmaram a informação de imediato. Contudo, a Saudi Press Agency, a agência de notícias oficial da Arábia Saudita, informou que o país pediu uma reunião de emergência entre nações integrantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), a Rússia e outros produtores, de forma a estabilizar o mercado de petróleo.

Posteriormente, a Rússia afirmou estar pronta para cooperar com os Estados Unidos e a Arábia Saudita para reduzir a produção. “Segundo estimativas preliminares, creio que é possível que se trate de uma redução de 10 milhões de barris diários”, afirmou durante uma reunião com o ministro russo de Energia, Alexander Novak.

Contudo, mais uma vez, esses números divergem. De acordo com a agência Dow Jones, haverá a reunião da Opep+ nesta segunda-feira, mas com a proposta de cortar a produção coletiva do grupo em pelo menos 6 milhões de barris por dia.

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A agência também informou que os russos provavelmente não concordariam com a redução se os Estados Unidos não aceitarem participar da iniciativa. A Opep+, por esse motivo, considera a possibilidade de convidar produtores dos EUA e Canadá para a teleconferência.

Desta forma, ainda há muitas incertezas no radar, tanto sobre a magnitude do corte de produção quanto em relação às condições que serão impostas para que o acordo finalmente aconteça.

“Primeiro, precisamos ver se essa reunião será confirmada. Segundo, precisamos observar quais países serão convidados a cortar a produção e em quanto. Finalmente, devemos observar qual será o impacto final disso na curva de valores futuros do barril do petróleo Brent, que ainda está abaixo dos US$ 40”, destaca o Bradesco BBI.

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Segundo os analistas, se os cortes atingirem a magnitude de 10 milhões a 15 milhões de barris por dia, essa pode ser uma “notícia fantástica” para os mercados de petróleo, já que os mercados rapidamente se reequilibrariam. Os analistas veem a crise com o coronavírus impactando o mercado com uma queda da demanda entre 5 milhões e 10 milhões de barris por dia. Porém, ainda é preciso ter cautela dado o cenário de tamanhas incertezas.

Ceticismo da Petrobras

Quem acaba tendo um certo ceticismo sobre qual será o impacto da reunião da Opep+ nos preços de petróleo é Roberto Castello Branco, presidente da Petrobras.

Em live promovida pela XP Investimentos na última quinta-feira (2), o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco disse, mais uma vez, que espera que o preço do petróleo permaneça baixo por um tempo diante do desabamento da demanda no mundo todo.

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Desta forma, ele destacou que o foco é reduzir custos, e que isso ajuda na hora de superar crises. Conforme apontou, se uma empresa de commodities tem custo baixo, ela sobreviverá.

A estatal, vale ressaltar, reduziu recentemente sua produção em 200 mil barris por dia em águas rasas, onde o custo de extração é mais alto, para lidar com a crise do petróleo. O ponto de equilíbrio de produção da Petrobras está em US$ 21 dólares por barril no pré-sal, que é mais da metade dos volumes extraídos pela companhia enquanto que, em alguns campos específicos, o custo pode variar entre US$ 5 e US$ 7 o barril.

Castello Branco, durante a live, também apontou que a atual disputa entre sauditas e russos mostra que “a OPEP não tem poder de determinar o preço do petróleo no médio e longo prazo”. “Não existe acordo. É difícil a coordenação de interesses distintos”, disse o executivo.

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Nesse cenário, a Petrobras foca nas medidas para preservar o seu caixa. Além do corte de produção, dado que não haveria como estocar o petróleo produzido e não vendido, houve um corte de US$ 2 bilhões de gastos operacionais em 2020, sendo uma das ações poupar cerca de R$ 700 milhões em despesas com pessoal, com a postergação do pagamento, entre 10% a 30%, de empregados com função gratificada (gerentes, coordenadores, consultores e supervisores); mudança temporária de regimes de turno e de sobreaviso para regime administrativo de cerca de 3,2 mil empregados; e redução temporária da jornada de trabalho, de 8 horas para 6 horas, de 21 mil empregados. Além disso, reduziu os investimentos em US$ 3,5 bilhões.

Essas medidas, conforme apontou o Bradesco BBI, ajudam a endereçar preocupações sobre a liquidez da companhia. Contudo, tanto com a incerteza por conta da reunião da Opep quanto vendo a queda da demanda, os analistas do banco seguem com recomendação neutra para os ativos.

Recentemente, os analistas reduziram as estimativas de vendas da companhia, prevendo uma queda de 7,4% da gasolina em 2020 e uma alta marginal de até 1,5% no diesel.

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Segundo Castello Branco, durante a crise decorrente da pandemia do coronavírus, o mercado brasileiro já registrou queda de 50% a 60% na demanda por gasolina. No caso do querosene de aviação (QAV), a contração é superior a 80%.

O presidente da Petrobras, contudo, afirmou não ter dúvidas de que a demanda por combustíveis se recuperará em algum momento. “A economia estava ensaiando uma recuperação, indo no caminho certo, com as reformas estruturais previstas. Teria impacto muito positivo na economia. Existia muito otimismo. Creio que esses dias voltarão. Tão certo como o fato de que o próximo dia vai amanhecer é que a recuperação se dará. É apenas um choque, e todo o choque é temporário. Só não sabemos a duração”, destacou.

Contudo, conforme ressalta o Bradesco BBI, com a premissa atual de recuperação gradual no preço da commodity, a relação entre dívida líquida e Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) chegaria em 1,5 vez até 2026, o que deve atrasar materialmente um aumento potencial dos dividendos (visto como um dos grandes catalisadores para que a ação da Petrobras diminua o desconto de negociação em relação aos seus pares internacionais – veja mais clicando aqui).

Assim, no curto prazo, os analistas seguem cautelosos com as ações de empresas de petróleo, esperando o desenvolvimento dos principais debates sobre cortes na produção. Já num prazo mais longo, avaliam como essas reduções de produção (se acontecerem) vão mexer na curva de preços do petróleo – e como isso pode afetar os dividendos da companhia.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.